Amor

18 16 0
                                    

  O tempo é a resposta. A resposta é o tempo. No momento em que me encontrava, com Eleonor pronta para enfrentar uma anomalia, Alex lutando com Ramon e Serena e eu caminhando até nossa perseguidora, eu ainda não fazia ideia do que estava por trás de tudo aquilo. Do que estava por trás de cada um deles. Fosse Alexander ou Serena, ou Merry e Ramon. Mas, ironicamente eu viria a conhecer tais respostas no futuro. Isto porque a resposta não estava naquele tempo.

  Talvez se eu soubesse a verdade, tudo teria sido diferente. Mas é assim que a realidade funciona, nós gostando ou não, afinal...

Se tivéssemos a resposta, não haveria "destino".

Pois a resposta é o tempo, e o tempo é a resposta.

  Amigos de infância era uma expressão que descrevia muito bem a relação de Merry Armstrong e Ramon Lambery. Os dois eram de famílias extremamente diferentes, no entanto, foi isso que os uniu.

  A mãe da menina foi assassinada pelo seu próprio pai quando ainda tinha dez anos, e devido a isso ele foi preso de imediato, pois não era o seu primeiro envolvimento com o crime. Desamparada, Merry foi acolhida pelo policial que a acudira, Simon Lambery, o qual já foi um ex-combatente do exército. Foi na casa dos Lambery que a garota conheceu o pequeno Ramon.

  Mesmo após dois meses morando com a nova família, Merry não falava uma única palavra se quer. Passava inúmeras noites em claro, lembrando de sua mãe e pensando na causa de tudo aquilo. Mas não importava o quanto chorasse, ela ainda não encontrava um motivo para sua vida ser tão infeliz.

  Foi em uma destas noites, onde Simon fazia sua ronda pela cidade e sua esposa já estava a dormir, que ela enfim conversou com Ramon. O menino era extremamente enérgico, e vivia dizendo que queria ser como seu pai, um sonhador que buscava por uma justiça mesmo que utópica.

- Por que está chorando? - perguntou o menino, com uma face preocupada, uma expressão que a garota aprendera a associar com o sentimento de pena.

  Esta dúvida obvia que parecia ressoar na cabeça das pessoas ao seu redor parecia não ter fim, até porque, a sua única resposta para ela era o verdadeiro e mentiroso silêncio. Talvez tenha sido pelo simples desejo de desabafar, mas ela resolveu responder-lhe.

- Porque minha mãe morreu e meu pai é muito mau.

Ramon sentou-se ao seu lado, escondidos debaixo da mesa da cozinha.

- Então, porque ainda chora?

- Huh? Como assim?

- "Sua tristeza um dia vai passar, e suas lembranças eternizar" é o que meu pai sempre diz - disse o garoto com uma risada - mas, você chorar não vai mudar o mundo.

- E o que vai mudar o mundo então...? - indagou Merry, escondendo o rosto entre as pernas e enxugando as lágrimas.

- Ser feliz - respondeu o menino.

Merry sorriu

  Desde aquele dia, os dois tornaram-se amigos inseparáveis. Passavam o tempo todo juntos e viviam como uma verdadeira família feliz. Com o amadurecer, Merry começou a se dar conta dos sentimentos que tinha por Ramon, mas como na infância, sua voz era incapaz de sair, incapaz de alcança-lo.

  Ramon era tudo para a garota. Seu melhor e único amigo. Seu confidente. O único que sempre a defendera na escola, devido ao bullying que sofria por seu pai ser um criminoso. Era a pessoa mais importante no mundo. Contudo, também por isso ela tinha medo de perdê-lo, tinha medo de ser odiada, tinha medo de não ser amada.

Merry tinha medo de ficar sozinha.

  O tempo e o coração não correm no mesmo ritmo, e logo, o jovem já estava uma garota de sua turma, Rebeca. Recíproco ou não, o amor de Merry jamais morreu, mas ainda assim ela pouco a pouco começou a ficar sozinha. A garota foi para a faculdade, arranjou um emprego e se mudou. Isto porque o jovem estava de casamento marcado, e a esperança, por último veio a morrer. O laço que os unia havia sido cortado. Mas uma palavra reatou tal vínculo.

Incógnitas

  Ambos foram parar no futuro apocalíptico no dia que tudo mudou. Mais perdida do que nunca, a jovem vai atrás de Ramon. Sua última razão de viver. Mas o que a esperava, era algo brutal. E mesmo que ela já tivesse desejado algo assim, jamais pensou que aconteceria, ainda mais de tal maneira.

  Rebeca transformou-se em uma anomalia, e o noivo a reconheceu pela aliança em seu dedo. Ramon tinha esperança de que a mulher que amava ainda vive-se naquele invólucro monstruoso. Mas ele estava errado.

Não havia sentimento algum.

  Tudo aconteceu na casa dos Lambery, por isso Ramon pôde usar das armas de seu pai para se defender-se. O homem fugia, sendo ferido a cada instante, perseguido por Rebeca. A arma em sua mão era incapaz de disparar naquela pessoa. Por fim, acabou encurralado na garagem, e antes que pudesse morrer forma tão terrível, Merry apareceu. Com um revólver pego da casa, a mulher baleou incontáveis vezes a anomalia e salvou aquele que amava.

Merry estava de volta com Ramon, não estava mais sozinha.

Mas ele não era o mesmo.

  Eleonor saiu em disparada para distrair a fera, enquanto eu observava e tremia a arma em minha mão. Merry enfim estava a nossa frente, e logo quando vi seu rosto pude captar a sua hesitação. Serena estava pronta para partir em sua direção, seu plano provavelmente era atacá-la diretamente para eu poder atirar. Mas eu não conseguiria fazer aquilo, e sabia disso.

- Espere...! - falei a menina, colocando um braço a sua frente para detê-la, e ela me encarou confusa.

Voltei a fitar Merry, que tremia tanto quanto eu.

- Por que está fazendo isso? - perguntei.

A mulher apenas desviava os olhos.

- As coisas não precisam ser resolvidas assim - eu disse gesticulando com as mãos, e ao assustar-se com a minha arma ela ergueu a dela.

- Eu... só não quero ficar sozinha... - murmurou Merry, começando derramar lágrimas sobre a arma de ferro frio e solitário.

Mesmo ela dizendo aquilo, eu não pude lhe entender, muito menos te ajudar.

  O som de tiros voltou a ecoar, e pela passagem surgiu Ramon, com raios passando a suas costas. O homem continuava a atirar do outro lado, sem dúvida alguma, em Alexander.

- O QUE ESTÁ FAZENDO?! - gritou Ramon, com sangue escorrendo em seu rosto e em seu braço.

  O homem corria em nossa direção e atirava para trás. Alexander também apareceu e continuava a persegui-lo.

  Merry, em prantos, olhou para o seu amado que corria perigo. E junto a sensação de solidão que voltava a sucumbi-la, Ramon ordenou.

- OQUE ESTÁ ESPERANDO?! ATIRE!!

  Olhei para seus olhos carentes, e vi o vazio de seu coração. E com um murmúrio quase inaudível ela se desculpou e puxou o gatilho.

No entanto, a morte que me rondava tinha um outro alvo para levar.

  A menina que passara a chamar de amiga surgiu a minha frente como um cometa negro, e antes que eu pudesse reagir, o som horroroso do tiro nos congelou no tempo e o sangue da irmãzinha jorrou diante de mim acompanhado pelo grito desesperado de Alexander que rompeu meu coração.

- SERENAAAAAAAA!!!

Incógnitas - Anomalias do TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora