Amigos

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  "Nós não somos simples variáveis de uma equação algébrica, não somos meras incógnitas. Somos pessoas dotadas de uma peculiaridade, a qual nos isola do "tempo" avançando ou regredindo de forma brusca" esta era a simples, e um tanto poética, explicação de Alexander quanto a palavra INCÓGNITA, o que nós éramos.

  Depois de acordar naquela casa suspeita, sendo acordada aos berros por uma menininha ciumenta, e ter uma recepção nada cordial, os irmãos me conduziram porta a fora logo após a explicação da palavra "incógnita". E antes que eu pudesse lhes lançar mais perguntas quanto a situação atual, eu estava de frente para uma linda praia.

  A casa em questão localizava-se a beira do mar, o que indicava que eu já estava na cidade vizinha. "Eles me carregaram tanto assim? Espera, quem me carregou aliás?!" Pensei, mas devido as circunstâncias não protestei.

  O sol já havia se posto, e as estrelas faziam o seu show de luzes sobre o mar que cintilava com as ondas. Devo admitir que aquele foi o único momento em que me arrependi de minhas vestes, pois o vento estava congelante, como uma brisa do Polo Norte. Após me livrar do encanto daquela bela paisagem, reparei que ao meu lado estava os dois irmãos, ainda abraçados, observando a lua se erguer no horizonte.

  Serena e Alexander.

  Um era uma menininha de marias-chiquinhas, a qual usava um lindo vestido negro, mas apesar da fofura era uma desbocada que queria me ver morta.... e o outro, era um jovem sorridente, mas que me soava debochado, o qual parecia me esconder muitas coisas, e isso me irritava. Quando resolvi cortar o clima dos dois autointitulados "irmãos", o chamado Alex se pronunciou:

- É uma bela vista, não é?

- É-é... - respondi hesitantemente.

- Já havia visto algo assim antes? - Alex não tirava os olhos do mar, não estava observando a lua e nem as estrelas, apenas o mar.

  Queria cortar o assunto, mas acreditei que havia um motivo para aquelas perguntas.

- Não. Nunca vim a praia, achava sem graça.

  Na verdade eu sempre quis ir, mas minha família nunca teve dinheiro para esbanjar com viagens. E como meu pai vivia trabalhando, nem poderia vir comigo e minha mãe...

- Nós também não. Nunca pudemos - disse Alexander, de forma relutante - Ou melhor, já nem sabemos.

- Como assim? - indaguei, e os dois viraram-se para mim - Oque quer dizer?

  O habitual sorriso daquele garoto irritante se modificou, não parecia um escárnio naquela hora, apenas um pesar de algo doloroso.

- Seja lá o que foi. Algo aconteceu em 20 de Outubro de 2013, e foi o resultante de nossa viagem no tempo. Da mesma forma, que gerou as anomalias e mortes dos seres humanos - explicou Alexander, desviando os olhos volta e meia.

  Para ser sincera, senti um tremendo alívio com aquelas palavras, pois tive a certeza de que não estava no caminho errado. Todas, ou quase, as minhas deduções estavam corretas. Pelo menos as minhas arriscadas investigações não haviam sido em vão.

- Disso eu já sabia - respondi rigidamente, já impaciente quanta a pressuposta revelação - Mas onde quer chegar?

- No entanto, por algum motivo, nossas memórias também foram afetadas - falou o jovem, enquanto voltava os olhos para o mar, como se houvesse dito algo bem comum.

- Suas memórias? Como assim?! - perguntei, exclamando com os braços.

- Nossas memórias estão embaralhadas... nós não nos lembramos de nossa vida antes da viagem no tempo - disse Alexander, e todos ficamos em silêncio por um minuto, até que ele prosseguiu - E é por isso que precisamos de sua ajuda.

  Eu ainda não havia digerido a ideia de que eles haviam tido uma amnésia, mas mesmo assim os dois me fizeram uma proposta a qual eu só podia tomar como vantajosa.

- Minha ajuda? - repeti, ainda perdida com a conversa - Como posso ajudá-los? E tem mais! Por que eu os ajudaria? Vocês me derrubaram e me trouxeram aqui sem nem me consultar!

- Mas que garota chata... - murmurou Serena, com o rosto colado ao peito de Alex, me observando com olhos afiados.

- Não será bem uma ajuda, e sim uma união - explicou-se o jovem, voltando a abrir o seu sorriso escancarado - Estou te propondo que forme uma equipe conosco!

- Como eu já disse, por que eu faria isso?!

- Ora, porque nossos objetivos são os mesmos. Buscamos por uma forma de voltarmos no tempo - falou Alex, se abaixando e aproximando seu rosto do meu.

  Não tenho certeza, mas acho que a irmãzinha deu um beliscão por isso no garoto, pois logo depois ele soltou um grito de dor.

- Mesmo que você diga isso... - murmurei, sentindo a realidade esmagar os meus sonhos.

  Sim, mesmo se nós nos juntássemos, isto não melhorava e muito menos mudava o fato de que estávamos em um futuro apocalíptico, onde tudo foi destruído, muitos morreram, e monstros disformes nos espreitam. Como mudaríamos este cenário? Como voltaríamos no tempo?

- O que vamos fazer para voltar tudo ao normal? - indaguei, desacreditada de que isso fosse possível, ao mesmo tempo que sentia uma pontada vinda de minha promessa para um pai ferido com a morte de sua filha.

- Você ainda não entendeu? - disse Alexander, ao mesmo tempo que Serena se afastou, com o seu sorriso debochado - Nós somos os únicos capazes de reverter o tempo e, juntos nossa investigação se tornará mais ampla e mais divertida. É por isso que pedimos pela sua parceria!

  Aquelas palavras me fizeram viajar no tempo. "Porque se fizermos isso juntas será mais divertido" foi isso que Sônia me disse no dia em que nos conhecemos...

  Gostaria de poder ouvir sua voz mais uma vez...

  Sônia. Mãe. Pai...

- Tudo bem - eu respondi, sem saber se estava sendo afetada pelas minhas emoções ou pelo frio severo da noite e, Alex se pôs a gargalhar e jurei ter visto Serena dar um pequeno sorriso.

- Então seja bem-vinda - falou Alex, animador como sempre - Juntos, eu, Serena e Leslie mudaremos o mundo!

- Não - eu neguei.

- Huh?

- Podem me chamar de Lily.

  Era assim que a minha amiga me chamava...

  "É assim que os meus amigos me chamam"

Incógnitas - Anomalias do TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora