Capítulo 2

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ALISSA

Respirar.

Eu posso respirar.

Depois de meses trancada na escuridão dentro e fora de mim, enfim sinto que posso respirar.

Ainda existe um grito agoniado preso na minha garganta e ela ainda quer tomar o controle, mas preciso acreditar que o pior já passou. Se eu não acreditar, não vou conseguir sair daqui. Mas esse é o último lugar onde devo ficar.

A sensação de estar do lado de fora não tem preço. O mundo continua bem aqui, diante dos meus olhos. Mesmo que tenha acabado pra mim várias vezes, está aqui.

A brisa é como música para os meus ouvidos, juntando-se ao sol que luta para brilhar entre as nuvens no fim da tarde, e faz fagulhas deliciosas se espalharem pela extensão da minha pele.

Não deveria, mas tudo em mim vai contra a natureza da minha, suposta, 'espécie'. Contra o monstro que devia ter me tornado. Eu não sou ela, e não pretendo me deixar vencer, por mais doloroso que seja.

Até meu último segundo, serei eu.

Uma pequena mala emprestada me espera ao lado das duas das únicas pessoas a quem consigo dirigir a palavra neste lugar, e mesmo que eu não veja a hora de sumir daqui, parece que tem chumbo nas solas dos meus sapatos enquanto caminho até eles.

–Nunca vou esquecer o que fizeram por mim. Nunca. – digo com sinceridade, tentando exibir uma voz firme – Nem sei como agradecer.

Michael e Evy são mais duas das várias criaturas sanguinárias do Clã, mas quando penso neles só consigo vê-los como meus anjos da guarda, enviados sei lá por quem. Se não tivessem cuidado de mim, estaria morta agora.

Ou pior, condenada a passar o resto da eternidade -da forma mais literal possível- no meu maior pesadelo.

–Montiel, você só precisa prometer que nunca mais vai colocar os pés nesse lugar. Já é mais que suficiente pra nós. – Michael abre seu sorriso gentil, que eu realmente nunca vou tirar da minha cabeça.

–O mais longe que puder. –Evy completa –Você merece ser feliz, Ali.

Assinto, mas o bolo na minha garganta me impede de responder qualquer coisa coerente. Me aproximo e a abraço apertado, murmurando mais um agradecimento.

–Desculpa por ele, mas foi o único acordo que consegui com o Fletcher. –Michael inclina a cabeça para um brutamontes mal encarado, que me espera ao lado do carro.

Braços largos cobertos por uma jaqueta grossa de couro, tatuagens visíveis em suas mãos e pescoço, com uma barba e cabelos volumosos no mesmo tom claro. E a principal característica: os olhos maldosos e impiedosos que todos aqui compartilham.

–Só quer confirmar que você foi mesmo, não vai fazer nada com você. – explica diante do meu olhar inseguro –Sabe como é, só confia nos caras dele.

Considerando que estou escapando disso, jamais me atreveria a reclamar

–Tudo pra sair daqui.

–Boa sorte, Ali! –o loiro finaliza, me dando coragem pra pegar a mala e seguir rumo ao carro.

–Quem sabe a gente se vê por aí um dia! – Evy diz por último, me fazendo virar para trás por breves segundos.

Seu rosto esboça um sorriso gentil, mas ela é a única que consegue, sua atitude tranquila é quase assustadora. Enquanto volto minha atenção para frente, juro por tudo que vejo um vulto a alguns metros. Está me observando com seus olhos gélidos, capazes de gelar minha espinha e travar minha respiração.

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