Capítulo 20

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SHADE

"Estou de volta no meu antigo quarto em Bondi Beach, há um garotinho sentado no chão e encostado na porta do cômodo enorme, escutando os gritos no andar de baixo. Ele está de pijama, tampando os ouvidos com as mãos para tentar abafar o som da discussão sobre traição e poder.

Eu quero te buscar e começar a correr, para longe daqui, pequeno eu.

Queria mudar então, eu fui embora e deixei tudo para trás. Eu fugi.

Fecho os olhos com força por causa da briga que agora parece mais alta, logo não é apenas mais uma discussão. O som de algo sendo arremessado na parede e de xingamentos mostram violência.

Eu queria mudar porque eu não era o mesmo.

Ao abrir os olhos novamente, estou em uma floresta cheia de árvores altas, o ar gélido que bate na minha pele nua deixa claro que o mar está por perto. Levanto do chão e sigo por entre as árvores, procurando um caminho para sair dali. Preciso sair.

Shade...uma voz chama minha atenção e quando dou por mim estou no chão, mãos úmidas nos meus tornozelos me puxam para baixo. Eu não vou sair.

–Por que você fez isso?! –quem me puxa para baixo é um homem velho com um distintivo de policial, ele estava ferido, ferido demais, com sua vida deixando o corpo aos poucos. – Miranda nunca perdoará você por ter me tirado dela. Como pôde? Por que fez isso, garoto?

Minhas mãos, antes limpas, agora estão cobertas de sangue. De sangue inocente, completamente sem culpa. Posso sentir o dourado dos olhos de Rocxy lentamente se transforma no azul gélido sem piedade por ter tirado uma vida inocente.

Só posso lamentar.

Eu vejo o fogo em seus olhos.

Quando consigo, corro o máximo que posso, assustado com a cena gravada na minha memória.

Eu tive sangue em minhas mãos.

É quando tropeço, pareço cair em um precipício que deveria me jogar direto para a água salgada e violenta do mar.

Eu passei por cima do corpo de um bom homem.

Mas ao fim da queda não bato na água, e sim com tudo no concreto de uma rua deserta. Não estou mais nu, e há um bar cercado de motocicletas logo a frente. Não é o bar da Luna.

Quando decido entrar, está lotado até a tampa de vampiros, nenhum que eu conheça. Existe um homem sem rosto no canto do estabelecimento e suas presas estão bem visíveis, sujas de sangue, e ele não tira os olhos do balcão. É onde Alissa está sentada, rindo com outra pessoa que eu não faço ideia de quem seja. O homem sem rosto avança sobre ela e eu tento impedir, mas sou jogado para longe como se não pudesse tocar nela. Não posso fazer nada.

Quando olho para frente, ela já está correndo pela rua, com o pescoço sangrando e gritando de medo. Eu não posso ajudá-la.

O som de correntes e um chicote tira minha atenção para o meu pai que tem uma cinta nas mãos e está olhando fixamente para mim, transtornado.

–Vai ser assim? –ele diz, me fazendo tremer diante da visão dos meus maiores medos. Mas não sou o alvo dele, é um ser de cabelos azuis que implora por misericórdia.

–Não pode fazer isso com a gente! –ela suplica tentando escapar de suas correntes. –Não somos seus bonecos!

Talvez você seja mais forte do que eu era.

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