Parte XXIII - Construindo alternativas

32 5 9
                                    


Há cinco dias que o meu filho partiu na sua segunda viagem à dimensão temporal alternativa. Parece descabido que conte os dias até ao seu regresso, quando ele viaja numa máquina do tempo. Poderia simplesmente programar regressar no mesmo dia em que tinha partido, com a diferença de algumas horas. Poderia até regressar antes mesmo de partir... teoricamente. Poderia ser, se a máquina fosse perfeita, mas não a fiz assim. O projeto era demasiado complexo, até para o Dr. Brief, mas eu insisti mesmo sabendo que poderia falhar no intento. Prossegui obstinada com a ideia, mesmo conhecendo todas as limitações que enfrentava.

Lembro-me do primeiro dia em que imaginei a máquina do tempo. Estava a ter um pesadelo de fogo. Gritava por Son-kun no meio das chamas. Conseguia entrever a sua silhueta, por detrás de grossos rolos de fumo negro. Vegeta também lá estava, longe, como se observasse a cena desinteressado. Nunca chamei por ele, porém. Odiava-o, nesse meu sonho. Despertara alagada em suor. Percebera a seguir porque tinha acordado, as sirenes soavam o alarme. Os humanos artificiais aproximavam-se. Agarrara em Trunks – nesses dias dormia no mesmo quarto que eu – e refugiámo-nos num abrigo subterrâneo que tinha preparado na Capsule Corporation para quando a cidade fosse novamente atacada.

Lembro-me da mão dele agarrada à minha. Esperava serenamente, ocultando o terror que o assaltava naqueles momentos. Esperávamos calados, escutando o som estridente das sirenes que se entranhava pelas paredes e penetrava nos nossos ouvidos.

Lembro-me de ter fechado os olhos, de sentir uma enorme desesperança, uma onda gelada a afogar o calor dos infernos que eu sentira durante o pesadelo.

Lembro-me de ter desabafado, entredentes:

- Quem me dera voltar com o tempo para trás. Quem me dera voltar ao dia em que Goku ainda estava vivo e curá-lo.

Tinha lido no dia anterior que já haviam descoberto a cura para o perigoso vírus que provocava uma falência cardíaca grave e que levava à morte. O medicamento seria fabricado e posto à venda dentro de um a dois anos, após que estava concluída a investigação científica que conduzira a tão brilhante resultado.

- 'Kaasan...

A voz dele provocou-me um arrepio.

- Trunks, o que foi?

- Estás a esmagar-me a mão.

- Ah... desculpa.

- As sirenes já se calaram. Já podemos sair. Não há perigo... Deve ter sido um falso alarme.

- Hai.

Tranquei a porta do abrigo. Matutava no pesadelo, na aflição de mais um alarme, no meu desabafo. A minha mente borbulhava com milhentas ideias dispersas, que rodopiavam como folhas secas num remoinho de vento. Fiquei muito tempo parada, a tentar assentar os pensamentos, um por um, empilhando-os e catalogando-os, a tentar focar-me num ponto que me conduzisse a uma saída luminosa. Continuava a querer escapar-me do sonho mau e escuro. Estava agarrada à maçaneta da porta do abrigo e Trunks esperava por mim. A paciência do meu filho confundia-me, pois conseguia ser precisamente o contrário, exigente e mais parecido nesse aspeto com o seu pai. Pedi-lhe para vir comigo.

Quando acendi as luzes do enorme compartimento, reparei que algumas lâmpadas estavam fundidas. Era natural, o lugar não era usado havia bastante tempo. Trunks observou, espantado:

- Há muito tempo que não vínhamos até ao laboratório do avô!

- É verdade, Trunks.

Não entrei logo. O laboratório guardava muitas memórias, felizes e despreocupadas, o que me amedrontou. Não iria ser fácil enfrentar os fantasmas do passado, mesmo que fossem agradáveis e que me devolvessem, no final de contas, a tranquilidade que os dias presentes não me davam.

Ecos do Futuro Memórias de OntemOnde histórias criam vida. Descubra agora