Parte XV - Recomeçar

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Ter terminado a minha relação com Yamucha naquela primavera fora libertador. Sentia-me como se tivesse estado a nadar numa piscina profunda e que, cansada da monotonia do padrão azul aos quadrados, após voltas sem sentido, finalmente tinha atingido a tona da água, respirando ar fresco e doce. Não me afundei em tristezas, recordações desnecessárias e momentos depressivos. Se tivesse acontecido no inverno, talvez os dias de chuva tivessem cobrado um preço mais elevado. Mas naqueles dias mornos nunca me sentira melhor.

E depois tinha comigo a lembrança daquele dia no corredor, eu e Vegeta. Começava a tremer, ficava com a garganta seca, um calor estúpido viajava da barriga até à cara, ficava toda vermelha e não sabia o que fazer com as mãos. Esquecia de pronto o episódio, a bem da minha sanidade mental.

Yamucha tentara a reconciliação, claro. Havia-o feito de todas as vezes que me enganara com os seus namoricos de ocasião. Mas, desta vez, não havia volta. Nunca o cheguei a receber, não queria amolecer e cair no mesmo erro de sempre. Começava a gostar demasiado do ambiente refrescante fora da piscina.

Numa ocasião tinha aparecido com um ramo gigantesco de rosas vermelhas, assim me contara a minha mãe. Vinha contrito, vestido de um imaculado branco, garboso como um príncipe, acrescentara a querida da minha mãe. Até Puar vinha bonito, com um lacinho branco no pescoço. Ignorei as observações da senhora Brief, mandei-a dizer a Yamucha que retirasse com o ramo de rosas, que estava tudo definitivamente terminado entre nós.

O acontecimento no corredor também pesava na minha decisão, sabia-o. Era um segredo nosso, meu e de Vegeta. Nunca o revelaria e o saiya-jin certamente também não o faria. Depois desse dia, nunca mais lhe tinha posto a vista em cima. Enclausurara-se novamente na nave, treinando como um louco.

Pedira ao meu pai que me deixasse integrar a equipa que tratava dos protótipos que a Capsule Corporation estava a desenvolver. O Dr. Brief aceitou a proposta com naturalidade. Pensou que o fazia para afogar a mágoa de ter acabado o namoro com Yamucha. Certamente que a senhora Brief se intrometera no assunto e convencera o meu pai dessa verdade. Deixei-o acreditar nisso. O que eu queria mesmo era ocupar os meus dias e fazer algo de produtivo. Em parte, talvez a minha mãe tivesse razão, precisava de um pretexto para não andar a pensar sempre no mesmo. Não em Yamucha, mas em Vegeta e no cheiro do suor dele...

Quando o verão chegou, mudei de penteado. Estava farta da nuvem de caracóis azuis, achei até que me fazia mais gorda. Estiquei o cabelo e admirei-me por estar tão comprido. Pedi alguns dias ao meu pai, fui para uma estância de férias na costa. Encontrei caras conhecidas, soube que a Pinkie estava sozinha, o que queria dizer que Yamucha também estaria sozinho. Ainda bem...

Evitei a ilha de Mutenroshi, poderia ter encontros desagradáveis. Falei com Kuririn uma vez, pelo telefone. Vinha com uma conversa estranha, mas eu estava tão absorvida na minha nova vida de liberdade, que não percebi o que me queria ele e nem procurei desfazer a dúvida. Recusei um par de convites para um churrasco na ilha, uns mergulhos na ilha, um jogo de cartas na ilha. Tinha outros interesses.

Namorisquei alguns rapazes na estância de férias. Dancei muito, cantei e bebi. Quando voltei a West City tinha acrescentado uma dezena de contactos ao meu comunicador portátil. Era muito requisitada e as noites desse verão foram animadas. Mas também vazias. Invariavelmente, desejava regressar a casa, para ficar mais perto do orgulhoso saiya-jin que nunca mais tivera aquela fome que o levava até à cozinha à minha procura.

Regressei ao trabalho após essas férias maravilhosas, o meu pai estava contente com os resultados. No final de julho estivemos numa convenção de cientistas que durou três dias. Conheci os colegas mais velhos do meu pai, fui integrada no grupo restrito dos génios. Algo que, mais cedo, ou mais tarde, iria acontecer, pensava afetadamente. Ouvi, por vezes, o nome de um anterior colega, de quem nada se sabia havia demasiado tempo, mas não me importei com a preocupação deles. Mais tarde haveria de saber o nome do Dr. Gero de cor. Numa ocasião, ao folhear uma revista, encontrei uma reportagem sobre antigas glórias do mundo da tecnologia. Havia uma foto desse Dr. Gero. O meu pai espreitou por cima do meu ombro, notei apreensão no seu:

- Hum...

- Este é que é o tal Dr. Gero de que falaram ontem, papa? – Perguntei.

- Hai, filha. É ele.

- Por que é que se preocupam tanto com ele?

- É um bom amigo e um dos cientistas mais inovadores e inteligentes do mundo. Não falhava uma convenção, gostava de trocar ideias. E nós, de as trocarmos com ele. Ficávamos mais ricos, aprendíamos tanto.

- Mas, entretanto, desapareceu.

- Temo que se tenha metido noutro sarilho, como aquele em que se meteu há tantos anos atrás.

- Já tinha estado metido em sarilhos antes?

- Sim, quando trabalhou para aquele exército.

- Que exército, papa?

- Creio que se chamava Red Ribbon.

Fechei a revista, voltei-me para o meu pai.

- Red Ribbon? – Gritei. Agarrei-o pelos ombros. – Tens a certeza de que se chamava Red Ribbon?

- Bulma, não digas esse nome tão alto. Há quem não goste de ouvir falar desse exército.

- Claro que não. Era um exército do mal, que ameaçou conquistar a Terra. Foi Son-kun quem travou Red, o comandante do exército.

O meu pai ficou surpreendido com a revelação.

- Honto?

- Hai, papa. – Acenei com a cabeça para reforçar as minhas palavras. – A certa altura, até eu fui perseguida pelo Red Ribbon. Lutei contra eles, cheguei a conhecer um tal de General Blue. Goku meteu-se na luta, procurava pelas bolas de dragão nessa altura, eles também as procuravam. Ele acabou por eliminar os generais do exército um por um, até o desmantelar completamente. Era apenas um rapazinho, mas foi ele quem destruiu o exército Red Ribbon. E dizes que esse Dr. Gero trabalhava para eles?

- Construía as máquinas, os robots, aperfeiçoava armamento. De certo modo, foi inimigo de Son-kun, pelo que contas.

Fiz uma careta.

- E meu inimigo também.

- Pela lógica...

Cruzei os braços e declarei:

- Bem, sendo assim, apesar de ser um colega teu e muito estimado pelos outros cientistas, nunca mais quero ouvir falar desse Dr. Gero. Se trabalhou para o exército Red Ribbon era um mau sujeito. Espero que, ao estar desaparecido, não continue com as suas ideias pérfidas. Espero até que tenha morrido. Lamento ser tão direta, papa.

- Tens direito à tua opinião.

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