Parte XVI - O sinuoso caminho da conquista

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Sentada na cama, com uma toalha enrolada na cabeça para absorver a água dos cabelos molhados, vestindo uma simples t-shirt e uns calções curtos, entretinha-me a pintar as unhas dos pés. Nesse dia, tinha trazido do centro comercial uma coleção infindável de vernizes de cores diversas e estava a experimentá-los.

Usava uns headphones enormes e escutava uma música barulhenta que me isolava do mundo exterior. Cantarolava o refrão, abanava a cabeça ao ritmo da guitarra elétrica. Acalmava-me um pouco quando passava o pincel pela unha, para não borrar a pintura. Tinha um pé de cada cor. Escolhi o vermelho sangue do pé esquerdo, enviava a mensagem certa: perigo e cobiça. Agarrei num frasco com um tom mais suave de vermelho. Passei acetona pelas unhas do pé direito.

Olhei para cima, ao aperceber-me de uma mudança subtil no ambiente, a impressão esquisita de não estar sozinha. Descobri Vegeta a mirar-me, na pose costumeira de braços cruzados e de pernas ligeiramente afastadas. A porta do quarto estava, contudo, fechada. Entrara e postara-se ali e esperara que eu desse por ele. Há quanto tempo estaria ali, a penetrar na minha intimidade, perguntei-me entre o momento que o encontrei e o momento em que me assustei.

Saltei na cama, os headphones caíram-me no colo.

O meu quarto era um local sagrado. Não convidava ninguém para vir até ao meu quarto. O meu castelo, orgulhosamente inconquistado.

- Ah!!! – Gritei zangada. – Baka! O que fazes aqui?

Era a primeira vez que o insultava, mas Vegeta relevou. Continuava a olhar para mim daquela maneira peculiar e altiva, em que exigia obediência.

Inspirei ruidosamente, a detestar como ele conseguia penetrar através da minha ira e desfazê-la aos poucos, como quem desmonta um jogo de peças.

- Quero fazer-te uma pergunta.

- Não vês que estou ocupada?

Mas ele ignorou-me e prosseguiu com a sua dúvida:

- Aquilo que aconteceu no corredor, no outro dia...

Corei, as peças derramando-se todas em meu redor, num mar infinito. Completamente desmontada. Não fazia ideia que ele também pensava nisso... Tal como eu o fazia, quase a todas as horas do dia, enquanto lavava os dentes, penteava o cabelo, aparafusava uma máquina, via uma revista ou pintava as unhas dos pés.

- S-sim? – Gaguejei, baixando os olhos, enfiando o pincel do verniz no frasco.

Senti uma grande vergonha. Como fora possível ter cedido tão facilmente, como uma menina carente e desesperada por atenção? Como fora possível ter-me entregado tão incondicionalmente? Poderia pensar-se, à partida, que Yamucha tivera alguma coisa que ver com isso – seria uma forma de o ferir. Mas não... Ou talvez um bocadinho. Nunca haveria de me arrepender do que fizera, porém. Também o tinha feito por causa de mim, mais do que dois terços, já que um terço pertenceria a Yamucha. Nesse momento de tentação tinha vendido a alma ao demónio. Entrara no Inferno e depois de ter provado o fruto proibido, abnegaria qualquer outro. Acorrentara-me ao lado errado do mundo.

- Já o tinhas feito com Kakaroto?

A pergunta apanhou-me de chofre, como um murro no estômago. Enfrentei-o.

- Não – respondi indignada.

Notei como os ombros dele baixaram ligeiramente, sinal que aliviava a tensão que carregava. Torceu a boca num meio esgar e soprou:

- Ah, bom...

O silêncio, naquela ocasião, seria puro veneno e adiantei:

- Son-kun é um grande amigo, nada mais que isso. Quando nos conhecemos, já eu era adolescente e ele não passava de uma criança. Como tinha vivido sozinho nas montanhas, parecia até ter menos idade do que realmente tinha.

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