Parte XIII - O caminho até ao coração

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Sentei-me à mesa da cozinha. Tinha feito uma caminhada de manhã, comera qualquer coisa leve e fora conviver um pouco para o ginásio. A conversa estivera animada e ficara mais do que previra. Dera gargalhadas como há muito não o fazia, trocara números de telefone, brincara com os novos frequentadores da ala masculina do ginásio. Quando chegara a casa, estava esfomeada.

Preparei um lanche digno de uma rainha. Saladas diversas, tostas, queijo e compotas, os maravilhosos cupcakes da minha mãe, café e sumo natural de fruta. Barrava pão com doce quando ouvi a porta da cozinha deslizar e fechar-se logo a seguir. A minha mãe tinha daquelas coisas, parecia que adivinhava sempre que eu preparava um lanche composto. Aparecia, elogiava o que eu tinha feito, sentava-se e fazia-me companhia. Aborrecera-me quando era mais nova e tinha menos paciência, agora achava piada ao sexto sentido que a transportava à cozinha sempre que eu resolvia lá entrar.

Os passos detiveram-se diante da mesa.

Não era uma divisão da casa que eu frequentasse amiúde. Quem fazia os cozinhados era, geralmente, a minha mãe, ajudada na maior parte das vezes por uma cozinheira, pois a especialidade da senhora Brief era mais a doçaria. Eu só entrava na cozinha quando fosse mesmo necessário, impelida pela fome ou por outra força superior. Sabia cozinhar, claro, mas aborrecia-me fazer disso uma rotina. Geralmente, pedia que me trouxessem algo para petiscar no quarto. As refeições principais eram tomadas no grande salão da casa, com a cerimónia que o meu pai desejava. Não exigia grandes formalidades, pedia apenas que nos sentássemos à mesa, para estarmos juntos, pelo menos, uma vez por dia. Isto, claro, se não tivesse algum projeto em mãos. Nessas alturas, não o víamos durante semanas a fio. Ou se eu não estivesse envolvida numa qualquer aventura, em que era eu que ficava desaparecida outras tantas semanas.

Quando era mais jovem, as aventuras eram mais frequentes. Agora, com a idade e depois de Namek, a seguir à visita inesperada de Freeza, não me apetecia mais aventuras.

Assustei-me quando me apercebi que era Vegeta quem estava especado diante da mesa onde se exibia o farto lanche. Saltei com um grito, larguei faca e tosta, desequilibrei-me e caí estatelada no chão, a cadeira caindo atrás de mim com um baque que ecoou pela cozinha afora. Ele mirava-me com uma insistência que me assustou. Engoli em seco e perguntei:

- O que é que queres daqui... Vegeta?

Senti um arrepio de medo gelar-me quando ele estreitou os olhos e cruzou os braços. Deixou de me fixar com aqueles olhos negros intensos, confessando com certa relutância:

- Tenho fome.

Acho que levei alguns segundos a processar a informação, como se as palavras tivessem entrado pelos ouvidos e, em vez de irem diretamente ao cérebro para serem descodificadas, tivessem dado uma longa volta pelos dedos dos pés e só depois tivessem alcançado a cabeça. Sentada no chão, perguntei:

- Tens fome?

- Hai, tenho fome.

- Mas a nave tem comida... A despensa está cheia para uma viagem intergaláctica. E acho que a despensa foi reforçada, há cerca de um mês. Pelo menos, foi o que a minha mãe me disse.

- Já acabou.

- Já comeste tudo?

Percebi que as perguntas estavam a irritá-lo. Levantei-me do chão, ajeitei a saia e puxei uma cadeira.

- Eh... Senta-te – convidei. – Vou preparar-te alguma coisa.

- Estou a ver comida em cima da mesa.

- Mas isso é só um lanche – expliquei. – Tu deves comer bem, como Son-kun. Precisas de uma refeição mais substancial.

Não respondeu. Sentou-se, cruzando os braços.

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