Folheava uma revista velha. Já a tinha visto uma centena de vezes, mas não havia muito mais por onde escolher, naqueles tempos difíceis. Era uma revista científica, com artigos antigos e ultrapassados, mas era melhor que nada. Ter em mãos uma daquelas revistas recheadas de futilidades, a última moda e os mexericos da alta sociedade, era um luxo. Achava, até, que nem sequer existiam naquele mundo de sobreviventes.
Porque via a revista maquinalmente, consolava-me com o rádio, que transmitia um programa de música calma. Era raro haver momentos de descontração, quando o tempo de emissão era permanentemente preenchido com reportagens sobre os humanos artificiais e os seus ataques. Havia dias em que não suportava existir naquela realidade sombria. Sentia-me sozinha, as memórias dos dias antigos a falharem na sua missão de me fazerem companhia. Estava quase a alcançar o tempo presente, também.
Voltei uma página da revista. Mas continuei a recordar-me.
Gohan recuperara rapidamente dos seus ferimentos e recomeçara a treinar Trunks um mês depois do recontro com os humanos artificiais que lhe haviam roubado o braço esquerdo. Apesar de detestar a situação, deixara o meu filho ir. Já não fingia, porém, que desconhecia o que se passava entre eles – a cumplicidade, os treinos, a amizade sobretudo e a admiração. Mas no final de cada dia, Trunks regressava calado. Lia-lhe impaciência e frustração no rosto. Sabia que ainda não tinha alcançado o que queria tão desesperadamente ser: um super saiya-jin.
Por um lado, tinha medo que ele alcançasse esse nível de poder e que julgasse, tal como acontecera com o pai, que era invencível. Havia essa possibilidade, pois Trunks acabara por herdar algumas facetas de Vegeta. Temia que ele enfrentasse sozinho os humanos artificiais, convencido que os poderia vencer. Algo que, afinal, acabaria por ocorrer, mas lá chegarei...
Percebia, por outro lado, que ser um super saiya-jin não era algo fácil de alcançar. Vegeta trabalhara arduamente para o conseguir, Goku dominara a técnica num ambiente de enorme pressão. Quando Gohan estava no final da sua convalescença, perguntara-lhe como fora no caso dele. Sentava-se na cama, comendo alegremente a sopa às colheradas, ultrapassando sem grande drama a perda do braço esquerdo. Ganhara também uma cicatriz que lhe cortara a cara, do mesmo lado, desde a testa até à face, passando pelo olho. Trunks não estava connosco e eu aproveitara para ter a conversa que não podia ter com o meu filho por perto. Gohan tinha-me respondido que era super saiya-jin desde os dezassete anos. Disse-me também que o caminho até esse estágio não era fácil, nem direto. Implicava ainda uma grande experiência para não se deixar dominar pela raiva brutal que lhes inflava o sangue todo, como se fervesse nas veias.
- Quase que se perde a razão quando somos um super saiya-jin. O desejo de destruir e de matar é demasiado forte. Consome-nos como uma fome que nenhum alimento é suficiente para saciar. Acho que deve ser normal que assim seja, pois para se alcançar o nível dos super saiya-jin é preciso sentir raiva.
- Parece que me falas de um oozaru, Gohan.
- Hai, é o poder dos oozaru, aumentado um milhão de vezes, mas mais fácil de controlar. Não é tão irracional. Não nos sentimos tanto um... animal, Bulma-san.
- Lembras-te quando te transformavas em oozaru, Gohan-kun?
- Não.
Sentara-me na cama, ao lado dele.
- E achas que Trunks vai conseguir chegar a ser um super saiya-jin? Ele só tem treze anos e não tem qualquer experiência de combate. É diferente de ti, Gohan. Tu já passaste por tanta coisa... O treino de Piccolo, a invasão da Terra pelos saiya-jin, Namek.
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Ecos do Futuro Memórias de Ontem
FanfictionQuando a Terra é ameaçada pela inesperada visita do terrível Freeza, que aterroriza todo o Universo e que se julgava ter perdido a vida após um combate titânico contra Son Goku no planeta Namek, os guerreiros reúnem-se nas montanhas para o receber e...