Uma conversa casual

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Depois de uma noite mal dormida, Olívia levantou sem disposição até para fazer café ou sentar ao sol. O dia ainda não havia amanhecido, mas ela não estava mais com sono – não queria voltar a dormir e ter os pesadelos que teve durante a noite. Serviu um copo de suco feito no dia anterior e ia voltando para o quarto, quando Naitan apareceu no corredor.

– Você não está se sentindo bem? – Perguntou ele. – Quer que eu te faça algo?

– Eu estou tão cansada de tudo isto...

Naitan era o que melhor entendia estes sentimentos conflituosos de todos. Desde os primeiros dias, Olívia percebeu que ela podia se abrir com ele, pois além de ser compreensível, de não compactuar com a ideia que os tangens tinham sobre deveres e obrigações, ele não gostava de julgar as atitudes dos outros.

– Vamos ver o sol nascer! – Disse ele, querendo animar Olívia.

Ela não estava mais com sono, mas não tinha muita vontade de ir a lugar nenhum por pura preguiça. Ele insistiu e ela acabou indo por não saber o que fazer. Na frente da casa, ele pegou um banco pesado de madeira maciça, que ficava na varanda e colocou no meio da grama e os dois ficaram ali sentados juntos esperando o sol.

– Como você conseguiu ficar forte assim? – perguntou Olívia.

– Eu já nasci forte e depois trabalhei no campo durante um tempo. Com trabalhos braçais bem pesados... Tive dois professores que me inspiraram: um que me fazia ler e outro que me fazia cuidar do corpo.

– E se você pudesse ter escolhido uma escola, para qual você teria ido?

– Eu gosto do Mestre do Sublime. Mas acho que teria optado pela escola da Mestra do Pensamento.

Mestra... O Mestre do Pensamento é uma tangen? – Reparou Olívia.

– É sim... Uma tangen inteligente. Mas na Escola do Pensamento trabalham outros Mestres até melhores, eu acho! – Enfatizou ele. – São de linhas que vocês humanos chamam de filosofia e psicologia. Assuntos ligados aos pensamentos. Um deles parece ler os pensamentos de quem está próximo.

– E ele consegue ler?

– Não. Não assim diretamente. Ele ensina a ler gestos e falas. Dizem que poucos conseguem manter uma mentira diante dos que estudam com ele.

– É uma habilidade bastante útil. Mas pode ser desagradável e perigoso saber o que os outros estão pensando... – Constatou Olívia.

– Você já parou para pensar que ver estas crianças que você está vendo e saber o que elas te contam pode também ser perigoso?

– Acho que não tem perigo nisso...

– E se por acaso você cruzar com um bandido e a criança dele te contar segredos... Crimes?

– Não sei o que eu faria... Talvez ficasse quieta.

– Duvido você conseguir ficar quieta! Ia gritar "pega ladrão, pega ladrão...". E depois ia pensar "não devia ter gritado". – Disse ele, como quem conhecia muito bem Olívia. Ele riu da piada, mas ela não.

– Você também me acha burra e irresponsável? – Perguntou ela meio decepcionada.

– Não, Liv... Você é inteligente e responsável. Só que está na hora de pensar mais além sobre esta habilidade. Se alguns tangens e anjos ficarem sabendo, você pode correr perigo.

O sol começava a nascer naquele local da Terra. Os pássaros começavam a cantar, anunciando um dia de sol forte e calor. Os primeiros raios iluminaram o pomar e fizeram as frutas e a relva úmida, ainda do sereno da noite, brilharem. Os dois ficaram ali vendo aquele espetáculo gratuito da natureza.

Olívia Tangen - Volume I: O Jogo dos MestresOnde histórias criam vida. Descubra agora