Transição - A mestiça e o transmorfo

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   “Ora', disse o Dodô, 'a melhor maneira de explicar é fazer”- Alice no País das Maravilhas.

Acordei sentindo um gosto excessivamente doce na língua, gosto esse que me deixava enjoada. Senti a bile subindo e antes de vomitar, alguém colocou um balde na minha frente. Agradeci, com um dedão para cima. Não sei se eles sabem o que isso significa, mas não estou bem o suficiente para pensar nesse assunto.

— Eariel, pode pegar aquele lenço ali no canto?- ouvi a voz de Lux.- Obrigada.

  Lux colocou o lenço em minhas mãos e eu pude limpar meus lábios. Finalmente eu abri os olhos, mesmo com as pálpebras pesadas como chumbo e logo senti o sol extremamente claro que escapava pela cortina do meu quarto no Reino da Floresta Gritante. Lux estava sentada a minha frente com um olhar preocupado e Eariel ao seu lado com uma feição meio envergonhada. Sem sinais de Ryker.

— Por quanto tempo eu fiquei desacordada?- minha voz saiu rouca e esganiçada.

— Dois dias e meio, precisamos usar a metade do terceiro dia para remover o hibisco do seu sistema imunológico.- ouvi uma voz desconhecida responder.

  Olhei para o outro lado e vi uma senhora baixinha, uns 1, 45 por ai. Ela tinha adoráveis cabelos grisalhos até a altura do pescoço, olhos verdes escuro e pele cor leite. Não vou arriscar a idade dela, já que aqui ninguém parece ter o que realmente tem. Porém, deixei sua aparência gentil de ser uma prioridade e me concentrei em um ponto que ela disse:

— Espera, hibisco? Mas por quê?

— Você não sabe, querida?- a doutora me olhou como se um chifre houvesse nascido na minha testa.

— Saber sobre o quê?

— Bem, hibisco é uma das plantas mais tóxicas para os maribianos, já que ela anula os poderes de alguém. E se usada de forma contínua, e em grandes porções, ela pode até matar um maribiano.- ela analisa uma ficha que ela segurava.- Pelo que os exames mostram, você tem se envenenado com hibisco por algum tempo.

  Hibisco. O chá que acalmava minha mente, o chá que minha mãe sempre me lembrava de tomar diariamente. Eu me lembro do dia que eu fiquei sem tomar o chá, fiquei de castigo pelo resto da semana e ainda com ela me dizendo que eu ficaria doente se não tomasse ele. Naquele dia, na escola, eu revivi Harold, o nosso hamster de estimação. Mas ele não foi ressuscitado do jeito fofinho que nós conhecíamos, na verdade, a ressurreição do Harold era mais assustadora do que fofa. De algum modo, a professora se convenceu de que eu havia injetado produtos químicos no Harold que o deixaram... Peculiar, e chamou meus pais.

  Minha mãe me envenenava todos os dias durante 13 anos! Pior, ela me fazia auto envenenar. Que tipo de mãe faz isso com a própria filha?! Daí eu lembrei que ela sequer era minha mãe de verdade! Mas será que se ela não estivesse mentindo todo esse tempo para mim eu ainda continuaria vivendo com ela? Será que eu ficaria mesmo morando com ela e meu pai sendo que eu saberia sobre tudo a respeito da minha mãe verdadeira? Será que eu me prenderia novamente essa mentira de vida perfeita apenas para vê-los feliz? Será que...

— Mas, todo esse processo de envenenamento foi bom para você, por assim dizer.- a doutora falou, cortando um talvez futuro começo de pensamentos baseados em "será".

— "Bom"? Defina "bom", doutora. Ela quase incendiou os corredores da biblioteca subterrânea e por pouco não matou o Ryker afogado, tudo isso por causa de um envenenamento constante! Então, me perdoe, mas isso não me parece nada bom para ela.- Lux falou de forma irritada.

  Demorei um segundo para raciocinar, mas quando me liguei eu percebi que:

— Espera, cadê o Ryker?

O Chamado do LuarOnde histórias criam vida. Descubra agora