A minutos atrás Aiyana havia saído de casa após confirmar que seus dons estavam quietos em seus baús. Os baús internos eram a forma que ela havia achado em um momento de meditação como guardar cada dom.
A minutos atrás ela caminhava pela vila tranquilamente. Conversando com as pessoas, dando alguns sábios conselhos, ajudando em algo em casa.
A minutos atrás ela caminhava só, até que sentiu alguém chegando perto dela. Tal pessoa caminhava devagar, como se estivesse com medo ou na intenção que ela não percebesse. Mas depois do evento na biblioteca, todos os sentidos de Aiyana tinham se aguçado.
Agora ela se via diante um homem, aparentemente bonito, ajoelhado em sua frente.
- Moço, o que você está fazendo?
Ao ver aquele homem ali, em seus pés, coisas impuras rodaram sua mente e um calor incomum atingiu seu íntimo. Mas um calor conhecido percorreu seu corpo. Um calor mágico, como brasas, um fogo forte.
– Sinto muito, me chamo Cillín. - e nesse momento ele estendeu a mão para tocar a dela.
E ela muito curiosa para saber se a pele dele também era quente como seus olhos, ela apertou.
E nesse momento, enquanto suas peles e seus corpos estavam unidos por suas mãos, ela sentiu que ela esperava por ele a muitos e muitos anos atrás.
O seu dom do fogo mexeu. Ela sentiu seu sangue correndo mais rápido e seu corpo todo ficou elétrico. A vontade iminente de deixar seu dom sair e fazer festa era tão grande, tão forte que quase aconteceu. Ela deixou a tampa do baú deslizar e as leves chamas acenderam em seus dedos.
Cillín não tirou sua mão quando as chamas acenderam, e na mão dele também apareceu chamas. Uma chama alaranjada, e que não é tão quente, mas sim morna, aconchegante, como um colo de mãe.
Ela recolheu a mão e olhou ao redor para ver se alguém teria presenciado aquela leve demonstração de dons.
– Cillín, lhe conheço de algum lugar? - ela tinha a sensação firme e segura que conhecia, de muitos anos, e de pouco tempo atrás.
– Sinto que lhe conheço há anos - ele coloca as mãos no bolso da calça - mas lhe vi recentemente na biblioteca da minha casa.
Ela piscou, inclinou a cabeça para esquerda, piscou de novo.
– Espera, você é o príncipe Cillín?- ela disse ainda com a cabeça inclinada e uma sobrancelha erguida.
– Sim, sou eu.
No exato momento que ele confirmou ser o príncipe, ela se ajoelhou, e em sua mente ela se julgava por não ter conhecido uma pessoa tão importante do reino. "Você é tão burra Aiyana, ficou olhando para o rosto bonito e o corpo definido que esqueceu de lembrar que ele é o príncipe do reino que você mora."
– Me desculpe alteza, não lhe reconheci- ela disse em uma voz meio amedrontada e arrependida.
Cillín não sabia o que fazer. Ficou sem reação, parado ali olhando. E Aiyana continuava ajoelhada em sua frente e a imaginação traidora começou a criar cenas um tanto quentes com ela naquela posição.
Em resposta ao pensamento de Cillín, um pouco do seu dom queimou sua mão como se pedisse para que tirasse ela daquela posição e ele atendeu.
– Pelos deuses Aiyana - ele colocou as mãos no ombro dela a puxando para cima - Eu quem devo me ajoelhar para você, Aiyana Ventlina.
Aiyana ficou em pé e olhou novamente nos olhos do homem em sua frente.
Ela percorreu os olhos por todo o corpo dele. Olhou cada pedaço de pele exposta dele. Olhou as mãos grandes e grossas, olhou as coxas definidas por baixo das calças, olhou seu maxilar firme, seu cabelo liso e escuro. Olhou ele por completo.
– De onde você me conhece, Cillín?
O vento sacudiu seus cabelos e alguns galhos de árvores secas que estavam ali perto.
– Como disse, fui enviado até você.- ele olhou fixamente nos olhos dela - Uma voz entrou em meus sonhos e me disse mil coisas e que eu deveria encontrá-la.
A cabeça de Aiyana começou a mexer. Alguma peça estava encaixando. Novamente ela teve a sensação de formigamento, a sensação de mudança.
A voz também aparecia para ela. Aparecia às vezes quando ela menos esperava.
A voz mudou ela em questão de minutos, enquanto, também apareceu para ele. Como isso poderia ser possível? Como a voz poderia mudar não só ela mas outra pessoa e também desencadeou dons nele.
O mesmo dom dela. O fogo. A brasa. O calor. Mas ele parecia manusear seu dom com maestria. Como se estivesse com ele durante os anos de sua vida.
– Qual a sua idade? - ela perguntou para fazer os cálculos se seria possível ele ter dominado o dom antes dela. Mas foi com ela que tal coisa foi desencadeada.
– Vinte e dois .- ele respondeu seriamente.
Vinte e dois. Os números balançavam em sua cabeça e ela ainda tinha dúvidas de como ele parecia tão confortável com o dom.
Ela tinha 5 dons. Ele tinha somente um.
– Você poderia me dizer como conseguiu dominar esse dom?
Ele olhou para ela como se fosse um bicho que jamais tivesse andado na terra.
– Eu estudei, e tentei durante todo tempo em que lhe procurava. - ele soltou o braço dos bolsos - E a propósito, você é bem difícil de ser encontrada.
Ela levantou os lábios levemente, em um sorriso mal feito.
– Então era você que colocou um desenho meu na Quilina? - ela levantou uma das sobrancelhas e o tom de sua voz saiu como um desafio.
– Quilina? - ele ficou em dúvida do nome que não conhecia.
– Sim, lá onde todos passam e vêem tudo que é colocado. Onde uma imagem minha está.
– Ah sim, foi eu.
– Certo. - ela se balançou nos calcanhares - Iremos ficar aqui parados ou eu posso ir para casa e viver uma vida após conhecer uma pessoa que é tão conhecida no reino por sua beleza e humildade?
Ele tentou, tentou não sorrir, mas foi em vão. Cillín soltou uma gargalhada alta, com direito a colocar a mão na barriga e dobrar seu corpo para trás.
Ela continuou olhando para ele. Uma de suas sobrancelhas estava arqueada e em seus lábios um sorriso tentava sair, mas ela continuava tentando se manter séria.
– Posso lhe acompanhar até sua casa?- disse ele cessando a risada.
– Sim.
Eles começaram a caminhar. Ela olhava para a terra em sua sandália e ele se forçava a continuar olhando para frente.
Enquanto olhava para terra, a mente dela dava cambalhotas em possíveis assuntos.
Ela franziu as sobrancelhas enquanto um pensamento fluía em sua mente.
Se um dominador do fogo apareceu, e esse era um de seus dons, seria possível haver outros com seu dom? Seria possível isso? Onde eles estariam? A voz teria encontrado eles?
A mente de Aiyana questionava isso. Questionava a possibilidade de existir outros com dons.
Um abençoado pela deusa do fogo, Cillín, o príncipe do Reino.
Deveria ter outros. São quatro elementos. Quatro deuses. Quatro dons.
Terra. Brasa. Água. Vento. E Aiyana, que tem todos eles, e mais dois que jamais houve notícias. Dom da luz e da escuridão.
Onde eles estavam? Como iriam encontrá-la? Ou ele devia encontrar eles? Algo em sua alma brilhou, com a possibilidade de haver outros. Outras pessoas que estão doloridas e brilhantes com esse dom.
Como eles são? Brilham? São tão lindos quanto Cillín?
– Cillín, você disse que a voz lhe informou sobre seu dom, lhe disse sobre mim. - ele olhou para ela, que ainda olhava para a terra enquanto caminhava. - Como aconteceu?
Ele continuou olhando para ela, suspirou, e por fim contou como foi. Desde o momento em que a viu entrando no castelo até ali, quando eles estavam juntos.
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A Abençoada
FantasyIndicado ao Wattys 2021. Uma maldição foi jogada por toda terra há 250 anos atrás. Um mundo que era florido, com alimento para todos, água abundante foi resumido a dunas de areia, alimentos mínimos, pequenos córregos de água doce. As brigas, guerra...