Capítulo - XXV || Bônus_Brenda

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As últimas quarenta e oito horas foram uma tempestade sem prévia para mim. Almejava por um fim de semana tranquilo. Onde o passaria com alguns amigos e o meu ex-namorado num quiosque próximo da praia, tomando algum coisa doce e relaxante.

Mas não foi isso que aconteceu.

Meu pai havia dado as caras depois das diversas ligações que eu e meu irmão vínhamos regeitando faz algum tempo. Não tínhamos intenção nenhuma de ter algum contato com ele após tudo o que fez a nossa mãe passar. Depois de tudo que nos fez passar.
E, embora tudo que tivemos de reconstruir sozinhos após sua partida avassaladora, nossa mãe implorou que Maximiliano e eu aceitassémos ter esse encontro, mesmo que nem ela quisesse tanto que isso acontecesse. Racionalmente mamãe tinha seus motivos, ela tinha todas as razões para ter feito esse pedido.

Uma mãe sempre sabe do que os seus filhos precisam. E a gente precisava daquilo mesmo que antes não soubesse.

Pois, se dependesse de nós ele jamais teria nos visto. E seria um grande erro por acaso.
Depois que William Donovan nos deixou por completo há nove anos atrás assim que o divórcio deles saiu, a mágoa veio em troca do amor que devíamos sentir pelo homem a quem chamávamos de pai.

Esse sentimento se transformou em decepção, logo após em raiva, então veio a dor e com o tempo foi sarrando, se dessipando quanto mais tempo passávamos ao lado de Amélia Cramolisck, a fonte de nossa inspiração e admiração.

Ela já não era apenas a terra que nos alimenta. Nossa mãe se tornara o nosso suporte também. E naquele sábado ela pedia sabiamente que fôssemos ao encontro de William e limpâssemos por completo os nossos corações.

E como eu disse, um mãe sempre sabe o que acontece com seus filhos, e ela sabia que nós necessitávamos daquele momento. Eu não guardava mágoa ou rancor por aquele senhor cujo qual me deu o meu primeiro sobrenome, mas necessitava de deixar claro que suas desculpas não fariam diferença.

Porque sendo franca, eu não nutria nenhum sentimento por ele.

Eu o perdoei de coração. E saí daquele restaurante certa de que tomei a melhor decisão da minha vida. Não precisava criar laços com alguém que por perto me trairia dor. Deixar as coisas acertadas me deixou com a sensação de liberdade, como se fosse isso que faltava para que enfim eu pudesse ser cem por cento o melhor de mim mesma.

No sábado a noite estava com Elioth numa balada, e com o entendimento de que a minha falta de compreensão na época em que o mesmo teve de sair do país por algum tempo se devia a algo mais pessoal, a gente teve uma conversa tranquila e acabamos nos acertando de verdade. Decididos recomeçar, sem a porra da brincadeira de ex-namorados que andamos fazendo nas últimas semanas.

Estava de fronte ao guarda-roupa procurando a combinação perfeita para a noite de hoje. Geralmente celebro quando estou feliz, e hoje, minha nossa, precisava de fazê-lo mesmo que fosse apenas segunda-feira.
Quando ouvi a porta do quarto abrir, eu presumi ser a garota fujona do final de semana. Vulgo, Milena.

Peguei dois vestidos diferentes. Um azul-marrinho colado de alcinha que batia bem acima dos joelhos e o outro preto menos curto, tomara que caia, com uma racha na lateral e manchas douradas salpicadas na região do decote.

Me voltei para a moça se desfazendo do moletom que eu bem sabia à quem pertencia e ergui as peças em sua direção.

— Qual deles acha melhor? — Ela sorri, senta na sua cama em um pulo fazendo o colchão pular junto.

— O azul é muito a sua onda, tente ele. — Diz sem rodeios e aprecio muito o seu sorrio de felicidade. Aquele traste sabe como deixá-la sorridente. — Vai sair?

— Vou, estou me dando bem com o meu ex-namorado à um passo de namorado. — eu deixo que a toalha de algodão caia do meu corpo e começo a testar o vestido em mim. Ele é um dos poucos que nunca usei, logo merece ser provado em ocasiões especiais. E acho que gosto de como condiz muito com o meu tom de pele. — Como foi o fim de semana? Mudou alguma coisa?

— Mudou sim — ela fala se debruçando sobre a cama, muito tranquila. — Já não sinto tanto desejo de o matar, o que é um bom sinal.

Eu rio.

— E os beijos?

Lena rola na cama de modo que possa me encarar melhor, o rosto apoiado sobre as mãos e um sorriso bonito desenhado nos lábios.

— Estou o educando no momento. — Ela fala divertida e mexe os lábios dizendo"sem beijos por agora" sem produzir som, conforme o sorriso se alarga. — Não sei nem o que é isso que nós estamos criando. Mas minha mãe gostou dele e o seu avô de mim.

— Estão indo no caminho certo, só fica de olho nas pedrinhas durante o percurso, tudo bem?

Ela faz "certo" com o polegar e volta a se sentar.

— Que negócio é esse de ex? — Volto a rir me admirando ao espelho, meu cachos estão húmidos e bastante volumosos iguais aos que minha mãe tinha antes de fazer um corte nos dela.
Lena ainda está encarando meu reflexo ansiosa pela resposta.

— Estamos indo comemorar por mim. —Sua expressão agora é de "poderia ser mais clara?" — Esse sábado deixei claro para o meu pai, que não preciso de um pai.

Soa tão natural que eu própria rio disso. Pego num salto azul mais clarinho e me sento na beirada da minha cama. As mãos flexíveis tentam colocar os sapatos em meus pés e os olhos atentos em Milena vindo até mim, os lábios comprimidos sem feições aparentemente legíveis.

— E você está bem? — É a primeira coisa que parece conseguir dizer. Eu faço que sim, colocando o outro salto.

— Eu vou ficar — digo tão no automático que até eu me surpreendo. Mas não tanto. Penso que não é tão fácil assim se desvencilhar de algo que em alguma época, por mais distante que seja, tenha sido importante para mim.

— Quero dizer, me sinto bem pela decisão que tomei. Ele nos deixou e foi a Deus sabe onde. Não acho ruim que eu tenha decido ficar bem junto daqueles que também sofreram tanto por causa dele. — Eu confesso, parando um pouco o processo de calçar os sapatos. — Minha mãe sofreu muito antes e depois da ida dele como você sabe. Meu irmão não foi tão diferente. Eu tê-lo perdoado foi algo até que penoso, mas não faria muito sentido ter ele por perto ou deixá-lo na angústia de pensar que poderia ter esse oportunidade outra vez.

Milena assente, deslisa a mão até encontrar a minha e faz com que se apertem os nossos dedos.

— E você?

— Foi ruim para mim também. Tive de cuidar da minha mãe ansiosa quando ninguém estava por perto e do meu irmão deprimido até que outros responsáveis viessem. Foi difícil e complicado. — E eu olho para o teto branco, soltando um ar cansado antes de encolher os ombros. — Eu poderia estar o odiando nesse momento, mas nem isso ele merece mais de mim. Senti tudo isso quando ele não estava. E não me sinto mal por neste momento não estar sentindo nada por aquele homem. Me entende?

Ela faz que sim, me aninhando em seus abraços pequenos.

— Entendo, e me alegro que isso não tenha acabado com o que há de melhor em você.

Eu também fico feliz por isso. Só entendo o quanto cresci quando não fico triste pelos mesmo motivos, mas contorno a situação e sigo em frente. E estranhamente sinto que ficaria muito mais feliz se um dia Milena entendesse isso também, porque por mais que ela tente negar, possui dores bem maiores do que a mesma permite transparecer.

O quanto, eu não sou capaz de dizer a não ser que um dia ela mesma decida contar.

Quando As Nossas Vozes Ecoam [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora