Capítulo LI - Sua história de amor foi o meu pior terror

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Milena

— Mais um pouco de chá? — Eu aceito com um acenar de cabeça, mordendo uma bolacha salgada ao passo que engulo o choro a cada troca de olhar que damos.

Uma das partes mais dolorosas de estar compartilhando esse momento com ele é imaginar os tantos que poderíamos ter tido antes e simplesmente não existiram pelas decisões que tomaram no passado.
Não faz muito tempo que compartilhamos sua sala de estar, entretanto sei que as palavras que trocamos até agora dão para contar nos dedos. Ele me serviu de cházinho e bolachas que aceitei por educação, mas que acabei curtindo no final.

Deixo minha xícara em cima da mesa de centro e decido que preciso acabar logo com esse silêncio que não é nem de longe agradável. Sei que ele também está se sentindo pouco confortável, afinal, é a primeira conversa que teremos como filha e genitor.

— Olha Vítor — eu começo a falar me ajeitando na poltrona aconchegante —, não vim pedir desculpas por ter te insultado, para ser sincera, não me arrependo de metade das coisas que disse.

Ele assente, deixando a peça delicada de porcelana ao lado da minha ali na mesa e me encara compressivo.

— Não esperava por algo diferente Milena. E agradeço que tenha repensado sua decisão de ter esse encontro comigo.

— É mais por mim do que por ti, e não se trata de egoísmo, estou apenas sendo real com você. Pois é o propósito da conversa, não?

— Claro, serei o mais sincero possível.

— É tudo que preciso. Quero ouvir a seu lado da história nem que nele a minha mãe seja a vilã.

— Tudo bem querida — baixo o olhar e nego com a cabeça, quando torno a encará-lo, ele entende que falar como se fossêmos íntimos é demasiado errado.

— Vítor, sem entusiasmo por favor — respiro fundo e continuo. — E sem apelidos também.

— Ok — e nesse instante noto uma vez mais o quão tudo isso é muito estranho e desconfortável. — É suficiente que queira ouvir o que tenho a falar. Desde o dia que descobri sua existência, desde que tenho conhecimento que tenho uma filha tão linda, se tornou um desejo conversar abertamente com você.

E tudo o que mais quero lhe dizer e que jamais desejava saber o que é ter um pai, a ter Daniel como a imagem primária formada do que era um homem.
Entretanto, tudo o que pergunto é:

— Então o que houve? Por que esperou que te encontrasse? Ou melhor, qual foi a necessidade de me rodear até no meu ambiente de trabalho? Isso é meio sinistro.

O mais velho me olha com espanto quando estreita levemente os olhos e discorda do que eu digo.

— Não rondei você no seu ambiente de trabalho — ele afirma com toda certeza. Não acredito, cruzo os braços e espero que continue. — Sequer fazia idéia que era minha filha até duas semas atrás, e sequer desconfiava disso até dois meses atrás. Fui recomendado a loja onde você trabalhava e foi uma surpresa para mim também.

— Você não sabia?

Ele faz que não.

— Na época não, quando me mudei de volta para a cidade há seis meses atrás, me encontrei com Érica em um supermercado, mas foi rápida demais para que eu pudesse ter um diálogo decente com ela. Aquele reencontro despertou sentimentos adormecidos pela sua mãe e uma curiosidade imensa de saber o que lhe tinha acontecido depois que fui informado sobre a morte do meu irmão.

Eu estremeço e me contorço. Ainda não estou familiarizada em falar da morte dele.
Não escondo meu desconforto, mas tento não fazer dele um motivo para parar por aqui.

Quando As Nossas Vozes Ecoam [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora