Capítulo 22

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Capítulo 22

A cicatriz começava  perto do dedo indicador e terminava perto do pulso, ela era como uma linha transversal e tinha um alto relevo.
Olhar para ela irritava Gael. Maldita hora que permitiu que Ivan fizesse o odioso pacto de sangue, marcando-os para sempre.
Gael desejou arrancar a mão e atirá-la longe dele. O ódio por Ivan o corroía por dentro.
A obsseção do empresário prejudicou a sua família, o fez perder o emprego e o tirou Victor.
Não que Gael sentisse algum tipo de afeto pelo loiro, mas o seu orgulho estava ferido por perdê-lo para Ivan. Se fosse para qualquer outro Gael não se importaria. Seria até bom, por que não precisaria sentir remorsos por abandoná-lo depois da tragédia.
Todavia, perdê-lo para Ivan foi como ser vencido num jogo que estava acostumado a ganhar. Isso o deixava humilhado.
Aos poucos, Gael ia se erguendo profissionalmente. A sua agência de publicidade estava nascendo. Ele e Felipe contrataram um advogado para cuidar dos assuntos legais, o local que seria a sede já estava em reforma, mas para a empresa funcionar, Gael precisava racionar gastos pessoais e familiares e isso atingia a quem ele mais amava, a sua irmã Luíza.
A jovem se preocupava com o irmão e percebeu que precisava de um emprego. Pediu a uma amiga da faculdade que a arranjasse uma vaga na cafeteria  do pai dela, que ficava no shopping de alto nível, na Barra da Tijuca.
Como as despesas da sua faculdade eram altas, Luíza decidiu trancar a matrícula, o que não agradou em nada Gael e Fernanda.
_ Você está louca?! Eu te proibo de fazer isso!_ gritava Fernanda apontando o dedo para Luíza.
_ Você não pode me proibir. Eu sou maior de idade.
_ Mas, isso é loucura, Luíza!
Naquele momento, Gael entrou na sala vestindo somente uma cueca boxer preta.
_ O que é loucura?
_ Gael, você precisa pôr  um pouco de juízo na cabeça da sua irmã. Você acredita que ela trancou a faculdade e vai começar a trabalhar de vendedora numa cafeteria?!
Gael olhou para irmã com espanto e desaprovação.
_ Eu vou mesmo. Você fala como se trabalhar fosse algo vergonhoso.
_ Você não é mulher para trabalhar em cafeterias. Você estudou nas melhores escolas, fala inglês e espanhol com fluência, estava estudando numa universidade conceituda para ser uma administradora e agora vai trabalhar na vai servir cafezinho? Tenha dó de mim, Luíza! O que eu fiz para merecer ver uma filha ter esse declínio?
_ Sem exagero ,mãe.  Acorda para a realidade. O papai nos deixou na merda. Perdemos tudo: o nosso apartamento, os nossos carros, a grana, enfim deixou tudo para o filhinho favorito dele. Viver de aparências não paga as contas.
_ Eu não aprovo você tomar essa atitude.
Fernanda se sentiu aliviada ao ouvir Gael.
_ Luíza, você não deveria ter trancado a matrícula da faculdade. Você é idiota? É o seu futuro profissional! Você vai lá agora consertar essa merda.
_ Não vou.
_ Vai sim.
_ Não. Eu já disse que não! Gael, você está desempregado e tem que se preocupar com as despesas da casa, comigo e com a mamãe não é justo que tenha que pagar a minha faculdade.
_ Isso sou eu quem decido. Eu não estou merda...pelo menos não tanto. A minha agência começará a funcionar em breve e...
_ A sua agência é uma pequena e nova empresa no mercado. Vocês estão no início e os lucros não virão de imediato.
_ O que você quer fazer da sua vida? Ser uma vendedorazinha para sempre?
_ Eu não serei uma vendedorazinha para sempre. Eu vou estudar para o vestibular pela internet. Há muitos matérias disponíveis gratuitamente. Vou prestar vestibular para uma faculdade pública.
_ Isso é demais pra mim. Eu não aceito isso. Maldito Raúl! Desgraçado! Como pode fazer isso conosco?!
Fernanda atirou o cinzeiro de vidro contra a parede assustando a todos.
_ A culpa de tudo isso é sua, Gael!
_ Não diga besteiras, mãe. O meu irmão não tem culpa de nada. O dinheiro do meu trabalho pode ajudar nas despesas.
_ A culpa é dele sim. Você foi burro, Gael! Uma anta! Tinha o Ivan nas suas mãos. Poderia ter ficado com ele e agora todos nós estaríamos bem, morando numa mansão ou apartamento de luxo, a sua agência não seria chinfrim e sim uma grande empresa. Começaria de cima.
"Mas não, você preferiu um rostinho bonitinho de um adolescente pé rapado, que o mesmo te deu um pé na bunda e pegou o milionário que você tanto rejeitou. Você é um otário! Eu tenho dois filhos burros!"
Gael não conseguia reagir.
_ Já chega, mãe! Pare de nos ofender e faça algo útil, como trabalhar por exemplo. Aceite que o seu golpe do baú deu errado.
_ Cale a boca, sua atrevida!
Fernanda ergueu a mão para bater em Luíza, mas a jovem segura a mão da mãe.
_ Nem se atreva a me bater! Eu não estou errada em nada. O Gael está fazendo tudo por nós, está passando por um momento difícil e você está sendo injusta!
Gael saiu da sala e se trancou no quarto. Queria ficar só. Sentou na ponta da cama e ficou olhando para o espelho, mas não prestava atenção na sua imagem. Só pensava na raiva que sentia.
Furioso, abriu o guarda roupa e pegou uma caixa de madeira. Ao abri -la, retirou as cartas de amor que recebia de Ivan na adolescência, olhando-as com ódio. Sentou na escrivaninha, ligando a impressora e enviou para ela algumas imagens que estavam na memória do seu celular. Eram prints das inúmeras mensagens que Ivan mandava se declarando para ele.
Gael pôs os papéis impressos e as cartas num envelope de papel pardo e guardou na gaveta da escrivaninha.

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