Capítulo 62

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Capítulo 62

Ivan segurou o queixo de Víctor, erguendo a sua cabeça e enxugou as suas lágrimas. A boca do moreno buscou a do loiro com a intenção de beijá-la, mas Victor desviou abaixando a cabeça novamente.
Ivan entendeu que Víctor ainda não estava pronto e para expressar o seu respeito, beijou-lhe a testa e seus narizes se tocaram. Ambos sorriam.
Delicadamente, Ivan segurou a mão defeituosa de Victor e a beijou, levou-a até o seu rosto e fechou os olhos sentindo a sua maciez.
_ Eu senti tanto a sua falta, meu Solzinho.
_ Se isso fosse verdade, você não teria sumido.
_ Foi necessário.
_ A Maria me disse que você ficaria em Nova York por um ano. Fiquei espantado em te ver aqui.
_ A saudade não me permitiu ficar.
Víctor o abraçou novamente, repousando a sua cabeça no ombro do marido. Ivan aproveitou para afagar os seus cabelos.
_ Almoça comigo? Temos muito que conversar.
_ Eu tenho que pedir permissão para o Renato ou a Helena. Mas, eu almoço contigo com uma condição.
Ivan franzio o cenho com a mão no queixo.
_ Não vai me obrigar a comer jiló, não é? Isso seria uma tortura desnecessária!
_ Como você é exagerado, Ivan. Jiló é uma delícia! Você que é fresco.
_ Víctor e os seus gostos peculiares.
_ Bobo! Eu não vou te obrigar a comer jiló. A minha condição é que eu escolha o restaurante.
_ Fazer o quê, né? _ Ivan disse encolhendo os ombros e inclinando a cabeça para o lado.
Renato não só autorizou que Víctor fosse almoçar, como também o cedeu a tarde de folga para que tivesse mais tempo para conversarem.
Para o espanto de Ivan, o lugar escolhido para almoçarem foi uma pensão popular no terminal rodoviário de Niterói. Um lugar aparentemente limpo, mas bem longe do requinte que Ivan estava acostumado a frenquentar.
Ele estranhou o local, as cadeiras e mesas de plástico branco, parede de azulejos antigos e um balcão de mármore velho e rachado com uma estufa em cima, onde tinha alguns salgados. As pessoas em volta eram do tipo que Ivan só convivia como seus empregados. Gente da classe C, em sua grande maioria trabalhadores usando uniformes, assim como Víctor.
Ivan olhava com estranhamento para o PF na sua mesa composto por arroz, feijão, bife batata fritas e salada de alfaces e tomates.O prato de Victor tinha os mesmos alimentos, mas acrescentou um ovo frito, que Ivan recusou.
O loiro sorria com a boca fechada e os olhos semi fechados, mastigando.
Ivan sentia vontade de não comer, mas não queria contrariar Víctor.
Cortou o bife com muita mal vontade e o espetou com o garfo junto com uma batata feita e levou a boca.
_ Hum! Não é nenhuma maravilha da gastronomia, mas até que não está ruim.
Víctor deu uma gargalhada.
_Cara, eu nunca na minha vida imaginei que um dia testemunharia um burguês comendo numa pensão junto com os proletariados. O grande empresário no ramo da construção civil, Ivan Matarazzo comendo um PF! O espírito do Karl Marx deve está batendo palmas pra mim lá do além.
_ O que eu não faço por você?
Ivan se agradava em ver Victor sorrindo.
_ Qual será o próximo castigo? Me fazer andar de busão?
_ Até que não é uma má ideia. Imagine, você todo cheirosinho entrando num ônibus lotado, cheio de gente cheirando a suor?
_ Que bicha malvada!
Victor gargalhava como não fazia há tempos. Sentia-se leve por sorrir, curtindo o momento somente dos dois, esquecendo de todos os problemas da vida.
_ Como você está? Tem feito terapia e fisioterapia?
Víctor abaixou a cabeça, ficando entristecido.
_ Se não quiser falar, tudo bem. Eu não quero que fique triste.
_ Você se importa se eu não falar sobre mim? Não hoje.
_ De jeito nenhum.
Ivan começou a contar sobre a vida em Nova York, ocultando as coisas ruins para não estragar a conversa. Falou sobre os amigos que fez, os lugares que visitou e sobre o curso. Víctor ouvia empolgado, se imaginando em Nova York com Ivan.
Fez muitas perguntas sobre os Estados Unidos. Disse a Ivan que gostaria de ser poliglota como ele e que estudava espanhol há quatro meses e estava gostando muito. Como tinha dificuldades de concentração, Andréia achou mais apropriado contratar um professor particular para que o filho não se sentisse constrangido diante de outras pessoas, o que ocorreria se Víctor optasse por um curso.
Disse que o professor tinha uma boa didática e era muito paciente. Informou que almejava aprender francês, italiano e alemão futuramente, o que deixou Ivan muito orgulhoso.
_ Víctor, eu preciso te pedir um favor.
Victor ficou curioso para saber o que ele poderia fazer por Ivan.
_ Na verdade, são dois favores. Desde que cheguei de Nova York eu não me sinto bem na minha casa. Sabe lá tem muito dos meus pais...como se tivesse a energia negativa deles sabe? E além disso, a casa é muito exagerada, grande demais pra mim. Resolvi mudar de cidade.
Víctor ficou entristecido, achando que Ivan iria para longe dele novamente.
_ Quero morar aqui em Niterói.
Os olhos do loiro brilhavam de alegria e a felicidade se estampou no seu rosto em forma de sorriso.
_ Sério?!
_ Sim! Eu quero um lugar um pouco mais modesto. Nada de extravagâncias. Algo confortável, acolhedor...que tenha mais a minha cara, que seja de frente para o mar. Eu entrei em contato com uma corretora e ela me apresentou duas lindas casas: uma em Itacoatiara e outra em São Francisco.
'O problema é que estou em dúvida entre as duas e gostaria da opinião de alguém de confiança e de bom gosto. Logo, pensei em você. '
_ Que honra! Obrigado pela confiança em mim. Mas, você tem certeza que quer deixar a Barra da Tijuca para viver num bairro de classe média?
_ Eu quero está em contato com a natureza. Ouvir o barulho do mar, ver o pôr do sol de um jeito mais lindo. Ficar observando pela minha janela um navio navegando enquanto tomo o meu café.
As palavras de Ivan seduziam o loiro, que se formava na sua mente a imagem narrada pelo moreno.
_ Você me ajuda?
Víctor fez um sinal positivo com a cabeça, mastigando.
_ Sobre o outro favor, eu sei que está decepcionado comigo e tem toda razão pra isso. Sei que deseja pedir o divórcio, mas eu gostaria de te pedir para adiar isso. Eu sei que eu não tenho esse direito de te prender a mim, mas é por uma boa causa. Eu quero ter um filho.
Víctor o olhou assustado.
_ Sabe, eu nunca tive um amor familiar. Só com você vivi isso e joguei tudo fora. Mas, eu quero dar a uma criança rejeitada o amor que eu não tive. Quero cuidar, amar e proteger uma criança. Eu sinto que posso ser um bom pai.
_ Disso eu não divido. Apesar de tudo, eu fui feliz ao seu lado. Sei que quando você quer, é uma pessoa amorosa e gentil.
_ Para eu poder adotar, como sou casado contigo, preciso que entre com o pedido de adoção comigo. Para um casal fica mais fácil.
_ Você quer que eu minta para o serviço social?
_ Sim. Mas, será por uma boa causa. Pense que há por aí alguma criança abandonada precisando da nossa ajuda.
Victor recordou do sonho que teve à noite passada.
_ Você não precisa se preocupar com nada referente a criança. Eu me responsabilizo por tudo. Eu só preciso do seu nome.
_ Tudo bem.
_ Você é um anjo. Como eu pude te perder?
Víctor abaixou a cabeça.
_ Mas, a assistente social vai na casa saber se vivemos juntos e como vivemos.
_ Eu sei. No dia da visita, você vai para a minha casa e finge que mora lá. Aí, se você não quiser fingir, pode pegar as suas coisas e se mudar pra lá de verdade. _ Ivan disse com um sorriso malicioso e Víctor sorriu de volta.

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