Capítulo 23

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- Ahhhh! - ouço um grito e rapidamente abro os meus olhos, mas me arrependo logo em seguida.

Tudo ao meu redor estava em pleno caos!

Cada segundo que se passava, era algo que explodia, como se tudo ao meu redor fosse instável.

O ambiente estava quente como o fogo, havia rachaduras, fendas na terra, o céu vermelho e um cheiro podre de carne queimada. Logo, meu estômago começou a querer soltar tudo o que comi recentemente para fora.

Meus olhos começaram arder e, consequentemente, a soltarem lágrima, numa tentativa do meu corpo de limpar as minhas vistas. Minha boca mais seca que o próprio deserto, porém, minha pele fria como a de um cadáver, completamente incoerente com o ambiente quente como o inferno.

Eu ouvia as pessoas gritando de medo, desespero, mas eu não via ninguém. Tudo ao meu redor tremia, um terremoto constante, tive até dificuldade para me equilibrar.

- Ahhhh! - o grito novamente atinge os meus ouvidos, me obrigando a olhar para trás. E, assim que me viro, vejo Vivian em trabalho de parto, sozinha, abandonada, encostada em uma árvore com os galhos queimados.

- Vivian! - por instinto, corro até ela - Vivian, o que aconteceu!? O mundo está acabando? Cadê o Alejandro? - apoio sua cabeça em meu colo e aperto sua mão, num gesto para tentar, se é possível num ambiente como esse, acalmá-la.

- Ahhhh! - ela me responde com um grito de dor e eu me forço a não entrar em desespero - E-ele... ele. Eu não queria que nada disso acontecesse - ela começa a chorar.

- Mas...

- Eu tentei ao máximo, mas não foi o bastante. Me perdoe, por favor... Ahhh! - ela para de falar e solta novamente outro grito por causa das contrações.

- Vivian. Está tudo bem... Eu estou com você - me senti na obrigação de ajudá-la. Eu queria poder fazer algo, diminuir sua dor. E, por um momento, foi como se o silêncio predominasse em um ambiente de guerra, restando apenas eu e Vivian.

No entanto, o silêncio foi cortado pelo choro de uma criança.

- Meu bebê... - Vivian diz em um sussurro. Eu seguro a criança e acabo me perdendo nos olhos cor de âmbar da pequena garotinha - Minha filha... - ouço a voz da mãe da criança e me desperto, e me apresso em entregar a recém nascida para os braços da mãe - Amora - ela sorri e me encara, depois volta para a sua filha - Em homenagem à uma garota que mudou a minha vida.

Vivian diz, fecha os olhos e sua respiração começa a desacelerar.

- Não! Vivian! Vivian! - a balanço para acordá-la, porém, nada acontece - Vivian! - começo a chorar, e, em minha companhia, a bebê também - Calma... eu tô aqui com você - pego a criança e a aperto em meus braços, como se ela fosse sumir a qualquer momento de meu aperto.

Eu me senti incapaz, diante de um corpo sem vida de uma mulher e uma bebê em meu colo.

O silêncio que me dava a impressão de estar apenas nós três, foi-se embora, e o barulho da guerra retornou.

- VIVIAN! - olho para trás e me deparo com Alejandro - Vivian! - ele agacha e pega a amada em seus braços, sem ligar para mim e muito menos para a filha em meus braços.

Ele a olhava com os olhos cheios de paixão e dor. No entanto, durou segundos, pois depois, a olhou com raiva, não só para ela, para tudo. Seus olhos viraram chamas, com sede de vingança. Enquanto que eu, fiquei sem saber o que fazer, com medo de sua reação.

- Você - ele se "lembra" que eu estou aqui e direciona seu olhar para mim e, depois, para a criança. Nesse momento, eu soube que precisava correr - A culpa é sua! - me levanta e começo a correr, entretanto, não dou nem cinco passos e já sou pega pelos tornozelos, me fazendo perder o equilíbrio no chão desregulado e cair. Tento proteger ao máximo a bebé, no entanto, sou muito fraca.

- Me solta! - começo a me debater, tentando me soltar, porém, em vão. Ele tinha o triplo do meu tamanho e o quádruplo da minha força - Ela é só um bebê!

- Você não tem o direito de tirar a minha filha de mim!

- O que vai fazer com ela!? - ele toma a criança de mim e alça voou.

- Ela terá o que merece - seu tom me causou arrepios.

- NÃO! - ele sobrevoa por cima de uma fenda e solta a criança - Seu monstro! - corro e tento agarrar as pernas da criança. Porém, não dá tempo, quando chego na borda do buraco sem fundo, já é tarde demais - O que você fez!? - derramo em lágrimas.

Todavia, eu não sabia o que as minhas lágrimas eram capazes de fazer. Três simples gostas caíram na terra, a fazendo ceder mais e o buraco aumentar de tamanho. Por sorte, acho, consigo sair da zona de perigo.

Olho com ódio para Alejandro que, na verdade, sei muito bem que é Álvaro. Queria poder fazer o mesmo com ele. Jogá-lo, condená-lo á solidão eterna.

- Qual o seu problema!? Ela era só uma criança. E sua filha, ainda por cima! - berro para ele.

- Aquilo não era minha filha. Eu não posso ter filhos.

- Mas...

- Mais nada! - ele para a centímetros de distância de mim.

- Você vai se arrepender do que fez! - ele gargalha alto.

- Olhe para você e olhe para mim. Eu sou um ser celestial! E você, uma mera humana.

- Eu sou muito mais do que você pensa! - eu realmente estava fora de mim.

- Prove - ele mostra os dentes afiados.

Todavia, antes d'eu fazer qualquer coisa, todas as rachaduras ao nosso redor começaram a esbanjar luz.

- O que é isso? - o ambiente, antes vermelho, agora branco. Pude ver a expressão de horror na cara de Alejandro/Álvaro.

- Não... - ele praticamente sussurra, apenas para si mesmo.

- O-o quê? - meu coração se acelera de pavor. Se ele está assustado, eu estou o triplo.

- Não! - ele grita enfurecido e voa em direção ao céu - Eu sou o único! - eu fico paralisada pelo medo, sem saber o que fazer, sem saber para onde ir.

A terra debaixo de meus pés começa a ceder e eu entro em pânico.

Olho para todos os lados, em busca de algum lugar para me abrigar. Entretanto, me vejo sozinha, no vazio, em uma espécie de mar de leite. Tento gritar, mas nenhum som sai de minha boca, como se eu tivesse debaixo d'água.

E então, a calmaria veio. Eu, não sei como, me senti mais calma, me senti segura, de alguma forma. Como se eu não pudesse ser ferida. Uma doce voz preenche o lugar, me fazendo fechar os olhos e me acalmar mais ainda.

- Amora... - era a voz da minha mãe.

Abro os meus olhos e me deparo com a imagem de minha mãe. Mas era como se eu fosse a criança, a bebê, em seus braços.

- Amora Lima. Minha filha. Eu te amo - me venço pelo cansaço e adormeço, com a frase presa na garganta.

Eu também te amo. 

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