O castelo de Ahsverus era uma gigantesca construção que volitava acima do continente de Nordara. Seus muros feitos de placas de ferro arrebitadas por parafusos do tamanho do braço de um homem e o portão frontal composto por engrenagens complicadíssimas em um sistema de cabos, fios e correntes barulhentas. Quando necessário, tombava para frente e se transformava em uma rampa, de modo que os kiy, a Guarda Palaciana, pudessem sair com seus grifos mecânicos.
Os grifos eram inspirados nas criaturas lendárias, metade leão, metade águia, que haviam ajudado Shoah e seus seguidores a se livrarem dos Titãs antes da fundação do Quinto Império. Extintos nesta batalha eram homenageados desde então em um complicado ritual que colocava parte da alma dos guardiões em suas máquinas, garantindo-lhe uma parcela de consciência e lealdade.
A fortaleza acabara de chegar às montanhas de Hellyah, uma cordilheira localizada ao norte do Império que fazia a divisa entre três regiões importantes, o Baronato de Shoah, o reino bárbaro de Eisland e o reino submerso de Nareen Torc Triath. Ao invés de continuar sua viagem em direção ao baronato, estacionou acima das montanhas por um tempo.
Uma corneta soou na mais alta das torres de vigia, o portão frontal rangeu e tremeu. Suas correntes balançaram e as rodas dentadas que o moviam giraram. Quando o portão chegava à metade de sua abertura total, um grifo entrou manobrando perigosamente entre a borda e o teto da entrada. As penas metálicas de suas asas faiscaram na parede, o cabo de bronze que formava sua cauda chicoteou no ar e ele derrapou no pátio até parar.
Quem conduzia o autômato era um homem pálido e alto. Por baixo do chapéu tricorne era possível ver cabelos pretos e lisos que iam até o meio das costas. Tinha o rosto emoldurado por uma barba rala e olhos cor de prata sem pupilas. Vestido em negro, uma camisa reforçada em couro, um sobretudo com ombreiras de ferro e calças escuras por dentro dos coturnos. Atrás dele e segurando sua cintura para não cair havia uma mulher de pele morena e cabelos castanhos, roupas brancas e um casaco de pele de urso.
Um soldado pegou as rédeas do grifo e os passageiros desmontaram, a mulher precisou de ajuda, pois não conseguia se equilibrar direito. Sem falar nada ambos seguiram por um corredor bem iluminado que os levou para dentro do castelo. Então o homem que conduzia o grifo finalmente disse.
– Por aqui, senhora Hawthorn. Creio que a Imperatriz Vykthoria não tenha muito tempo.
Conforme avançavam no corredor, a mulher via vários guardas andando apressadamente de um lado para o outro, como numa emergência. Sua preocupação aumentou, Mary não estava acostumada a realizar partos tão importantes.
– As contrações começaram há tempos, mas a criança não quer nascer. Parece resistir a tudo que fazemos. – continuou o homem que controlava o grifo, as pessoas lhe davam passagem enquanto andava e olhavam para a mulher com um misto de preocupação e desconfiança.
— Vocês tentaram magia? — Mary Hawthorn ouviu em silêncio até chegarem ao quarto da Imperatriz. Não se sentia confiante para ajudar, mas ser chamada pelo Império era algo tão honrado que ela jamais poderia negar.
— Os sacerdotes jamais permitiriam que um mago ou clérigo estrangeiro tocassem na família imperial, mesmo que isso pudesse salvar sua vida — Pelo tom de voz de Svann, o homem de preto, ele concordava com a tradição, mas esta postura era esperada de um kiy, afinal eles protegiam o modo de vida dos bnei shoah e a realeza desde a fundação do império.
Antes de abrir a porta, Mary fez outra pergunta:
– Svann, onde está meu marido?
— Amparando o Imperador, como a senhora sabe, quando o filho está para nascer, o antigo imperador começa a definhar até a morte. — uma sombra cobriu o rosto de Svann, esta maldição fora imposta anos atrás por Tehom, um Titã que lutara contra Shoah e amaldiçoara sua linhagem pouco antes de morrer. Por mais que o soldados soubesse que isto iria acontecer de tempos em tempos, ninguém estava preparado para encarar a morte de seu líder daquela forma.
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O Baronato de Shoah - A Canção do Silêncio - Edição Wattys 2018
FantasiaO Baronato de Shoah - A Cançao do Silêncio, venceu o Wattys em 2018 na categoria "Construtores de mundo"; está de volta ao Wattpad após uma pesada crise de antisedade que eu tive em 2018/19. Peço desculpas aos leitores por ter retirado a obra do ar...