Foi a primeira vez na história do Cenóbio de Ahator que aspirantes sobreviveram à Casa dos Caçadores. A Canção do Silêncio se tornou a principal notícia do mês, e todos queriam saber o destino daqueles jovens corajosos. Os Yezirah, líderes da Kabalah, decretaram dois dias de luto por Nikolaj.
Sehn foi um dos primeiros a se recuperar da fatídica noite. Tal como Diren, sofrera poucas escoriações e suas dores eram muito mais psicológicas. A perda de Nikolaj o desmotivara e a loucura em que Edgar se encontrava o fazia sofrer. O único apoio que recebera naquele período viera do pai, e o jovem não tinha forças para visitar os companheiros, que, segundo relatos, eram os mais feridos. Desde que fora trazido de volta para o Cenóbio, não vira Nadja e Kadriatus.
Sabia que Diren estava bem. O amigo já estava nas primeiras aulas do segundo ano, conhecidas como "Projeto de Guerra". Era seu momento derradeiro, quando escolheria e forjaria suas armas pessoais. Sehn também fora chamado, porém não conseguia elaborar um projeto vendo seus companheiros naquele estado lastimável.
Tinha medo do que encontraria em breve. A enfermaria estava no fim do corredor e cada passo em direção a ela o fazia querer voltar. Parou em frente à porta e deu um suspiro. Lembrou que o apoio do pai o ajudara a se recuperar, então, resolveu fazer o mesmo pelos amigos.
Assim que entrou, viu uma cama separada das demais. Coberta por um dossel branco, tinha um criado-mudo ao seu lado e um armário grande. Sehn estranhou aquela mobília, mas ao ver o dossel se abrir e Nadja aparecer, entendeu o que se passava. A amiga não o viu e foi mexer no armário.
A enfermaria era toda branca, com tons de bege em detalhes na parede e no teto. Iluminada por candelabros com lâmpadas, tinha um aspecto sonolento que transmitia paz aos doentes. Havia uma fina camada de Névoa ao redor da luz, que evaporava rápido e soltava um cheiro adocicado no ambiente. Nos corredores entre as camas passavam humanoides de prata, enfermeiros criados para ajudar nos cuidados com os enfermos.
Nadja usava o avental comum dos pacientes. Sehn notou que suas costas estavam cheias de curativos, eram os lugares onde Tesla a havia esfaqueado. Apesar disso, ela não demonstrava dor. Os cabelos loiros estavam assentados e a pele já ganhara uma cor saudável. Ela estava bem, apesar de tudo. Sehn ficou aliviado com isso.
– Como vocês estão? – ao se aproximar, Sehn viu Nadja fechar rapidamente o dossel. No armário ele notou vários objetos metálicos, inclusive um difusor. Não entendeu para que Nadja precisava daquelas tranqueiras. Havia rodas dentadas de tamanhos diversos, pistões, uma placa metálica e frascos contendo Névoa. Um pequeno motor, mais de quatro metros de cabos de prata, ouro, cobre e bronze.
– Vamos sobreviver – disparou Nadja. Havia tristeza em sua voz, ela segurou o braço do amigo e se afastou em direção aos corredores. – Não sei se é melhor você saber disso agora, mas Kadriatus está paraplégico. A quarta e a quinta vértebra foram rompidas com o golpe de Tesla.
– Ele já sabe? – Sehn ficou olhando para a cama.
– Já. Está com vergonha de falar com vocês, a família dele veio semana passada, mas ele não me contou o que conversaram. Só sei que o pai dele, Svann, saiu furioso. Kadriatus não sabe, mas ouvi uma coisa terrível no corredor. Acho que foi algum irmão dele quem disse.
– O quê?
– "Como um Drachenfels pôde se deixar ferir por um ggoyim?". – A mãe de Kadriatus não veio, só os irmãos. Nunca vi gente tão estranha.
– Não sabia que a família dele era tão grande – Sehn nunca conversara o suficiente com o companheiro para saber mais dele. Parando para pensar, nunca tinha conversado muito com qualquer um deles além de Edgar.
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O Baronato de Shoah - A Canção do Silêncio - Edição Wattys 2018
FantasiO Baronato de Shoah - A Cançao do Silêncio, venceu o Wattys em 2018 na categoria "Construtores de mundo"; está de volta ao Wattpad após uma pesada crise de antisedade que eu tive em 2018/19. Peço desculpas aos leitores por ter retirado a obra do ar...