O céu é um lugar da terra (Livro 1) - João Marcelo Santos

Capítulo 3

Lucas e Gabriel estavam namorando. Namorando de verdade. Como assim?

Lucas passou as três primeiras aulas do dia completamente distraído, olhando pra Gabriel, e ele olhando pra Lucas. Ele não sabia exatamente o que pensar. 24 horas atrás, ele e Gabriel eram apenas melhores amigos de infância, que se conheciam desde muito novos e cresceram juntos. Suas mães se conheciam, eles desde sempre iam na casa um do outro, eram inseparáveis. Daí eles foram pra uma boate, beberam bastante — catuaba, vodka e cachaça, respectivamente — e acabaram ficando. De repente, os dois estavam do lado de fora confessando sentimentos secretos um pelo outro, e agora, na manhã seguinte, eles estavam... namorando!

Lucas nunca namorara na vida. Nem tivera aqueles namoros de criança, aonde você fica segurando na mão da menina e dá selinhos escondidos nela — coisas que Gabriel fazia, por exemplo. Ele não. Ele demorou anos pra perder o BV, só perdendo no ano passado, já com 16 anos. E ele era virgem. Sempre sonhara no dia em que finalmente ia arranjar um namorado, e tinha a esperança de que ele seria seu príncipe encantando, de que o namoro seria perfeito e esse seria o dia mais feliz de sua vida.

Bem...era, tecnicamente, o dia mais feliz da vida de Lucas, sim. Ele estava namorando o seu melhor amigo. O seu melhor amigo gatíssimo, diga-se de passagem. Um dos motivos que o fizera reprimir os sentimentos por ele durante tantos anos foram suas inseguranças. Lucas não era feio, ele sabia disso. Mas ele também não era o típico garoto bonito da escola. Ele era bem magro, branquelo e tinha cabelos bem pretos, o que o tornava, de certa forma, padrão. Mas seus dentes sempre foram tortos, e ele agora usava aparelho, e ele sempre se sentia muito estranho por ter os dentes daquele jeito. Seu nariz era meio gordo, e sua sobrancelha era falha. De certa forma, ele se sentia o patinho feio perto de Gabriel. Ninguém nunca gostara dele antes, pelo menos não que ele soubesse. Ninguém nunca pedira pra ficar com ele. Até Gabriel havia ficado com duas de suas amigas, e ele não.

Gabriel havia namorado Natália no primeiro ano e havia ficado com Lisa na festa de ano novo de 2019, há pouquíssimo tempo. Já ele? Nenhuma amiga quisera ficar com ele. Na verdade, ele nunca foi uma pessoa de muitos amigos. A real é que a única amizade de infância que durou até ali fora a de Gabriel. E ele nunca foi uma pessoa popular, diferente do amigo. Ele ficara genuinamente surpreso ao começar a fazer parte de um grupo no ensino médio.

Mas a real é que mesmo nesse grupo ele se sentia meio de fora. Ele não sabia explicar. Era como se até entre seus amigos ele estivesse excluído, diferente de Gabriel, que era sempre o centro das atenções, sempre era o mais querido do grupo. Tudo isso só evidenciava uma diferença entre os dois que era gritante — e, por mais louco que fosse o destino, eles agora estavam juntos.

Ele não sabia se isso ia durar. Gabriel tinha tido 3 namoros sérios e quatro namoricos de infância, e nenhum deles durara. Mas eram namoros com garotas, não com garotos. Talvez ele fosse ser diferente. Afinal, Gabriel disse que gostava desde desde muito tempo, e fora ele quem propusera o relacionamento. Isso só poderia significar que ele gostava realmente dele.

Droga. As aulas estavam passando demorado demais, os professores explicavam a matéria e ele sequer conseguia prestar atenção. Ele só conseguia olhar para o cabelo bagunçado de Gabriel, suas sardas no rosto e seus cílios grandes. Ele estava ainda mais lindo naquele dia.

Na hora do intervalo, eles desceram e foram comprar seus lanches, e na fila, Natália cutucou ele.

—Ei, olha a aidenta ali sentada do lado do Carlos. — Ela cochichou, apontando discretamente.

—Deixa de ser ruim, Natália. — Mas ele não resistiu e deu uma olhada. A menina era bonita, mas não era nada demais.

—É tão estranho, como será que ela se protege? Tipo, sexo pra ela é tipo...colocar a doença em outra pessoa, né?