Capítulo 27

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—Eu não acredito que ela falou isso pra você! — Exclamou a mãe de Gabriel, horrorizada.

—Pois é. — Ele suspirou, encostando a cabeça na mesa — Ela saiu arrastando o Lucas e tudo. Acho que é o fim pra nós dois.

—Não fale assim, meu querido. Você não sabe o futuro, talvez seja apenas uma provação que vocês tenham que passar. — Disse ela, acariciando sua cabeça — Nossa, mas em pleno 2019 ainda tem gente que pensa assim?

—Eu não esperava que fosse ser tão difícil pra ele. — Ele apoiou o rosto na mão, suspirando — Pra você foi tão difícil assim?

Ela bebericou o café que segurava, se sentando também.

—Quando eu me descobri, eu já tinha tido você. Você era muito bebê ainda. Eu deixava você com a mamãe e ia pras festas, sabe, pra aproveitar o resto da minha adolescência. E nisso acabei ficando com algumas meninas, e acabei descobrindo que gostava da fruta. — Ela sorriu, com o olhar vidrado em outro canto, como se estivesse lembrando do tempo passado — Foi uma época muito boa, mas com muita confusão. Na minha época, não era tão fácil como é hoje. As pessoas tinham muito mais preconceito. Quando eu contei pra minha mãe, ela não aceitou tão bem no início, mas acabou aceitando com o tempo. Meus irmãos levaram isso de boa. Ela sempre criou a gente com bastante liberdade para fazermos o que queríamos, pois o pai dela, o seu bisavô, era um homem muito autoritário e não deixava ela fazer muita coisa coisa. Ela sempre criou a gente com muita liberdade, e não queria me impedir de ser feliz. Na época, eu estava terminando o colegial, e não contei pra ninguém na época. Na faculdade, algumas pessoas sabiam, mas a maioria não. Eu não tinha muita coragem de contar pras pessoas, tinha medo que elas pudessem me excluir.

—Então...até hoje você não é assumida pra todo mundo?

Ela bebericou mais um pouco do café.

—Muita gente não sabe. Não é um assunto muito público, tanto que você mesmo não sabia. Sua avó pediu para que nenhum dos filhos dela comentassem isso com nossos filhos, pois isso poderia de alguma forma influenciá-los, segundo ela. O que é besteira, porque eu nunca te disse nada e mesmo assim você é.

—Pois é. Quando as pessoas vão entender que ninguém influencia ninguém a ser nada? — Ele bufou.

—Eu sempre fui meio privilegiada. Como deixei esse assunto privado na minha vida, não era todo mundo que sabia, então não me perturbavam tanto. Mas teve uma vez que eu sofri a pior homofobia na minha vida.

Gabriel ergueu a cabeça, curioso.

—Como foi isso?

—Você era pequeno. — Ela suspirou — Eu estava num restaurante com uma paquera minha da época, e estávamos de mãos dadas...nada mais que isso. Então uma senhora que estava do meu lado começou a nos insultar de todos os nomes possíveis, e o filho dela, que era adulto, ameaçou nos bater...

—Que horror! — Ele exclamou, boquiaberto.

—Nós nos levantamos e fomos até os proprietários do local para expulsar eles, mas quando voltamos eles já tinham ido embora. Mas naquele momento eu senti na pele o preconceito. — Ela o encarou com o olhar triste, porém com um breve sorriso — Eu queria tanto que você não tivesse que passar por isso... é muito triste ver uma pessoa sofrer por ser quem é. Eu te entendo completamente.

—Eu queria que a mãe do Lucas fosse compreensiva como a senhora. Mas, segundo ela, você é uma inconsequente que me criou com liberdade demais, e que tolera todas as merdas que eu faço.

—Ela é uma doida, isso sim. — Ela revirou os olhos, tirando um cigarro do seu maço, o acendendo logo em seguida — Ela sempre me repreendeu por deixar você ir pra casa dos seus amiguinhos, como se eu estivesse errada em deixar você brincar. Ela sempre foi autoritária com o pobre do Lucas, mas eu nunca me intrometi. Uma vez eu disse, "Mulher, você é muito severa com seu filho, deixe ele ser mais livre", mas ela me deu um fora tão grande que eu nunca mais toquei no assunto.

O céu é um lugar da terra (Livro 1) - João Marcelo SantosOnde histórias criam vida. Descubra agora