A Redenção de Gabriel

23. Gabriel Miller

-- Olá! Eu sou o Gabriel. Você deve ser a Bia.- me abaixo para vê-la melhor.

-- Ah! Você é o jogador! Minha turma foi a um jogo seu no mês passado. Eu gritei seu nome quando você fez aquele gol de bicicleta. Você me ouviu? Ninguém me deixou chegar perto de você. Mas agora você é namorado da minha irmã e eu vou contar pra todo mundo da minha escola. Eu posso...

-- Ei Bia, você vai assustar o Gabriel desse jeito. Vamos entrar, já está tarde. Dona Maria, muito obrigada por tudo que tem feito por nós. Me desculpe por ter me atrasado tanto hoje. A senhora cuida tão bem da Bia que eu nem sei como agradecer.

-- Eu amo vocês Lya e quero ver vocês duas bem! Você merece ser feliz! Já estava mais do que na hora de arranjar um namorado.- ela se vira para mim.- Rapaz, eu conto com você, cuide bem da Lya, ela é uma garota de ouro.

-- Pode deixar dona Maria.- digo e passo o braço pelos ombros de Lya e vejo o quanto ela está tensa.

Ela empurra a cadeira da irmã até a casa ao lado. Entramos no local e vejo que é uma casa muito simples. Os cômodos são pequenos e quase não há móveis, acredito que seja para ajudar na locomoção de Bia. Observo cada canto que meus olhos alcançam.

-- Eu sei que minha casa é pequena mas não precisa fazer essa cara de assustado.- Lya me tira do meu transe.

-- Desculpe. Só estava observando.

-- Aposto que o closet da sua mãe é maior que essa casa.- ela tem razão mas eu não vou admitir.- Eu vou colocar a Bia para dormir e volto para fazer algo para você comer.

-- Eu não quero dormir! Eu quero conversar com o Gabriel! - Bia diz fazendo bico.

-- Beatriz, já está tarde! Nós três temos que levantar cedo amanhã, portanto já para a cama!

-- Você é uma chata Lya! Eu quero contar para ele que um dia eu vou ser uma atleta igual a ele. Você estraga tudo.- ela cruza os braços e faz cara de choro. Vejo o quanto Lya está cansada.

-- Ei Bia, vamos ter muito tempo para conversarmos. Se quiser eu posso colocar você na cama, que tal?

-- Oba! Meu quarto fica ali, vem comigo!- diz a garota empolgada.

A sigo pela casa e entramos em seu quarto. Assim como toda a casa ele é bem pequeno, há somente uma cama e um guarda roupas. Bia se aproxima da cama e quando vejo que ela vai se deitar eu lhe ofereço ajuda.

-- Não se preocupe Gabriel. Já faz algum tempo que eu consigo sair da cadeira sozinha. Meus braços são bem fortes. Só não conta para a Lya, ela gosta de me ajudar.

-- Tudo bem, esse será um segredo nosso. Pronta para dormir?- ajeito seu cobertor.

-- Estou sim. Olha, eu sei que a minha irmã é muito chata mas, por favor, não termina com ela. Vai ser bom ter você na nossa família.- ela diz baixinho.

-- Sua irmã não é chata Bia. Ela está passando por muitos problemas. Eu preciso que você seja legal com ela, ok? Eu não irei me afastar de vocês mas eu preciso que você me ajude. Nada de reclamar ou brigar com a Lya. Estamos entendidos?

-- Sim. Eu acho que posso fazer isso.- ela parece pensar.

-- Ótimo! Agora fecha esses olhinhos e durma. Bons sonhos!- deixo um beijo em sua testa.

-- Eu vou poder ir com você nos seus jogos?- ela pergunta meio sonolenta.

-- Se você se comportar eu te levo em todos que forem possíveis.

-- Oba!

Assim que ela dorme eu sigo para a sala onde encontro Lya sentada a mesa com um prato de macarronada. Seus cabelos estão molhados e ela está de roupa trocada. Deve ter tomado um banho. Assim que me aproximo, vejo que seus olhos estão vermelhos.

-- Me desculpe. Fiz apenas uma macarronada. É bem simples e sei que você está com fome.- ela diz sem me olhar nos olhos.

-- Para mim está ótimo. Cansei de comer scargot todos os dias.- digo e a vejo sorrir um pouco.

-- Idiota! Separei umas roupas que eram do meu pai para você tomar um banho. Desculpa te fazer passar por isso tudo.- ela está sem graça.

-- Não se preocupe. Namorados são para isso mesmo.

-- Ai droga! Eu vou consertar isso. Eu precisei mentir se não elas me encheriam de perguntas... Amanhã mesmo eu conserto essa bagunça...

-- Relaxa. Eu sempre soube que você queria namorar comigo. Eu sou irresistível.- ela revira os olhos.- Essa macarronada está maravilhosa. Não sabia que você cozinhava tão bem.

-- Tive que aprender a cozinhar muito cedo, com o tempo fui me aperfeiçoando.

-- Está divino. Acho que vou comer aqui todas as noites.- pisco para ela.- Onde estão seus pais?

-- Meus pais faleceram num acidente de carro há um tempo atrás. Eles voltavam de um jantar de comemoração do aniversário de casamento. A Beatriz estava no banco de trás. Um carro cheio de jovens alcoolizados baterem neles e causaram o acidente. Meus pais morreram na hora e a Bia está presa nessa cadeira de rodas. Desde então somos nós duas contra o mundo...

-- Sinto muito por isso. Você é uma garota muito especial, Lya. Você não precisa ser forte o tempo todo. O que você passou hoje, não foi nada fácil. Eu estou aqui com você e não irei sair do seu lado enquanto você não estiver bem.

Ficamos um tempo nos olhando. Até que ela me abraça e continua chorar. Saber de sua história me fez adimirá-la ainda mais. Tão jovem e tão responsável. Trabalha, estuda, administra uma casa sozinha e ainda cuida de uma irmã paraplégica. E agora ela está passando por um momento extremamente difícil.

Enquanto ela enfrenta tudo isso com dignidade e confiança eu encho a cara com o dinheiro dos meus pais e durmo com mulheres que nem sei o nome. Agora eu entendo o porque dela me odiar tanto no início.

Termino de comer e vou para o banheiro tomar um banho. Estou suado e com as roupas do futebol. Assim que pego em meu celular vejo as quarenta e sete ligações perdidas da Carla. Eu jamais a deixaria na mão mas foi algo urgente. Eu sei que ela irá entender. Não podia deixar Lya sozinha num momento como este.

Digito uma mensagem rápida dizendo que tive um imprevisto e que amanhã conversamos. Eu sei que ela entenderá.

Assim que saio do banho, Lya vem ao meu encontro.

-- Você se importa de dormir no mesmo quarto que eu? É que só temos dois quartos na casa... Se não quiser eu durmo no sofá...

-- Eu vou ficar ao seu lado o tempo que você precisar.- digo ao dar um beijo em sua testa.

Ela fica vermelha e me agradece por tudo. Me conduz até o quarto. Ele é bem simples. Tem uma cama de casal, um guarda roupa e uma cômoda. Como eu estou cansado, já me dirijo para a cama e me deito.

-- Pode ficar a vontade viu.- diz Lya me encarando.

-- Vem logo gata. Deita aqui que o pai está cansado.- bato no espaço da cama ao meu lado.

Ela pensa por alguns segundos e logo depois se deita ao meu lado.
Aos poucos ela vai deitando a cabeça em meu peito, eu passo a mão pelo seus cabelos e ela volta a chorar. Seu choro é carregado de dor e tristeza. Ah, como eu queria tomar toda essa dor para mim...