34. Lya Malta

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A semana passou bem rápida. Minha convivência com Gabriel se resumiu a apenas as caronas que ele dava para mim e Bia.

Ele estava muito ocupado treinando com o time de futebol e eu estava procurando um novo emprego. Que difícil tem esses dias!

Andei por toda a cidade, meus pés já estão no limite de tanta dor. A busca por um emprego tem sido desgastante. A maioria dos empregos é de horário integral e como eu faço faculdade na parte da manhã é impossível para mim.

A única opção que se enquadra na minha situação é ser garçonete em uma boate no centro da cidade. Bom, a boate é meio estranha e as mulheres que trabalham lá usam umas roupas extremamente curtas mas, o gerente parece ter gostado de mim.

Não é o melhor lugar do mundo para se trabalhar mas estou sem opções afinal, o seguro desemprego não irá durar a vida toda. O pior de tudo é o horário de trabalho, entrarei as sete da noite e só sairei às três da manhã. Não tenho com quem deixar a Bia e esse horário de trabalho pode acabar atrapalhando meu desempenho na faculdade. Mas, se não conseguir outro emprego, fazer o que?

Sexta-feira, finalzinho da tarde. Estou morta de cansaço. Chego na escola de Bia para buscá-la e a professora me pede para ir até sua sala para conversar comigo. Deixo minha irmã no pátio da escola e sigo para a sala.

-- Obrigada por me dispor um pouco do seu tempo Lya. Gostaria de lhe dizer que a Beatriz é uma ótima aluna e seu desempenho melhorou muito nos últimos dias.

-- Fico feliz em saber disso.

--Bom, eu não sei se você está ciente mas, no último sábado do  trimestre, acontecerá a tarde de jogos entre pais e filhos para comemorarmos a semana da educação física. Já tivemos outros eventos parecidos com esse e a Beatriz nunca participou e...

-- Desta vez ela quer participar.- concluo a frase antes da professora.

-- Sim. Não me leve a mal Lya mas, infelizmente a nossa escola não tem estrutura para recebermos alunos com deficiência e tem sido uma luta diária com ela. Fazemos de tudo para que ela se sinta bem. Tenho notado que a expectativa dela está muito alta sobre essa atividade. Ela sempre tem dito que vai ser uma atleta. Estamos fazendo o possível para adaptar a maioria das atividades mas, ainda somos falhos nesta questão. Só queria deixar você ciente sobre esta situação, já que  acredito que seja você a acompanhá-la nesta atividade.

-- Realmente Bia tem estado mais motivada. Apesar de ser apenas uma criança, ela já passou por muita coisa e ela sabe que existem muitos lugares que não estão preparados para receber pessoas com necessidades especiais. Acredite em mim, se eu tivesse condições, com certeza eu a colocaria em uma escola particular onde a estrutura é melhor. Bia é uma garota sonhadora e eu a incentivo como posso. Muitas vezes sou super protetora mas é porque eu receio por ela. Obrigada pelo seu trabalho com ela. Eu sei que o sistema educacional do nosso país ainda é muito falho. Bia tem uma necessidade física mas, existem muitas crianças que tem outros tipos de necessidades. O sistema precisa se atualizar, aprender a trabalhar com as diversidades para acolher todos os tipos de alunos. Eu irei conversar com minha irmã e com certeza nós iremos participar. Obrigada.

Me despeço da professora e vou até Bia que olhava distraída para um gato brincando com uma borboleta.

-- Quando é que a mocinha ia me falar sobre as atividades de pais e filhos?- a pego de surpresa.

-- Eu não ia falar. Eu vou chamar o Gabriel para participar comigo.- ela disse decidida.

-- O quê?

-- Não vou participar com você Lya! Você é uma péssima atleta, vai me fazer passar vergonha.

-- Eu não posso acreditar que estou ouvindo isso! Você nem sabe se o Gabriel vai poder vir. Ele anda muito ocupado ultimamente. Estamos na época de jogos.

-- Nesse dia não terá jogo e ele vai comigo.

-- Quando ele for lá em casa nós perguntamos. Se ele não puder, eu não quero que você fique insistindo.

-- Está bem. Por que ele não veio nos buscar hoje?- pergunta triste.

-- Ele tem um jantar importante com a família dele. Nem sei se vamos vê-lo esse fim de semana.

-- Que pena. Vou sentir falta dele. Na casa dele tem piscina, nós podemos ir lá?

-- Claro que não!

-- Por que não? Você é a namorada dele, tem que ir na casa dele.

-- Nós só vamos na casa de alguém quando somos convidados. E nem pense em pedir ele para ir lá. Já tivemos esta conversa antes.

-- Anem viu. Eu só queria nadar um pouco! Todo mundo fala que é a melhor coisa da vida!

-- Um dia eu te levo em um clube. Agora vamos para casa porque eu preciso descansar.

-- Podemos comer pastel?

-- Podemos comer mas, você precisa escolher. Se comermos pastel hoje não vamos poder tomar sorvete amanhã. O que você escolhe?

Eu sei que é chato fazer uma criança escolher mas, infelizmente meu dinheiro está pouco e não podemos gastar muito. Ela me olha com os olhinhos indecisos e eu quase digo para ela que vamos comprar os dois. Não posso fazer isso...

-- Vamos comer pastel hoje!- ela diz decidida.

-- Me desculpa por fazer você escolher. Eu prometo que as coisas vão melhorar um dia. Eu serei uma grande advogada e teremos uma vida muito boa.

-- Oba!E eu terei cento e um cachorros pintados com bolinhas igual no filme!- seus olhos brilham.

-- Não exagera Bia. Vamos lá comer esse pastel.

Seguimos até a lanchonete e ela vai me contando sobre a escola. Minha mente divaga em ouvir suas histórias e pensar em como o Gabriel deve estar. Hoje pela manhã ele estava muito nervoso. Espero que dê tudo certo e ele consiga ter uma boa conversa com os pais. Decido fazer algo que nunca fiz. Pego o meu celular e digito uma mensagem para ele:

" Vai dar tudo certo. Eu estarei sempre com você."

A Redenção de GabrielOnde histórias criam vida. Descubra agora