IX. Um Entendimento e Uma Declaração

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Ilithia ficou feliz de sair finalmente da tenda e ignorou os poucos olhares curiosos dos recrutas, partindo num caminho conhecido para longe das barracas, andando mais do que costumava andar no último acampamento, três anos atrás, até alcançar a margem de um rio. Olhou ao redor, certificando-se de que estava mesmo sozinha. Os recrutas costumavam tomar banho nele a qualquer hora vaga do dia ou da noite, mas mais perto do acampamento, ela e Athena sempre se afastavam mais para garantirem a segurança de suas identidades.

A mulher parou na margem do rio e se ajoelhou, estendendo as mãos para lavá-las dos restos de ferragem ainda da oficina e levando um pouco de água para molhar o rosto. O coração estava um pouco acelerado, não podia ter imaginado que apenas rever Cáel e escutar a voz dele pudesse lhe causar aquele efeito. Ele estava muito mais bonito do que lembrava e até a voz dele soava mais grave aos seus ouvidos.

Com um suspiro demorado, ela fechou os olhos e apoiou as mãos e o queixo num dos joelhos, lembrando-se do motivo principal pelo qual não podiam ficar juntos: ele ainda era um príncipe e ela uma ferreira, além do mais, já devia estar casado com a tal lady que era sua noiva há muito tempo. Passou a mão nos cabelos, a lembrança vaga do dia do casamento de Athena ressurgindo na memória.

– Porcaria... – Ilithia suspirou demoradamente, abrindo os olhos e encarando o próprio reflexo na água, agora com os cabelos bem maiores e ainda assim parecendo mais masculina com as roupas e o rosto sujo.

– Você não devia estar em casa cuidando do marido e dos filhos a essa altura?

A voz nova lhe causou tamanha surpresa que a primeira coisa que ela fez foi se levantar e virar na direção da pessoa, o coração quase pulando da garganta, dando um pulo para trás para se defender de qualquer possível inimigo, até ouvir o resto da frase.

Ilithia quase escorregou nas pedras do rio ao pular nele, sentindo a água um pouco fria molhando suas botas e começando a invadir o tecido para lhe alcançar as pernas. Ela respirou fundo várias vezes, os olhos arregalados se acostumando com a imagem conhecida. Cáel estava parado a alguns passos de distância, os braços cruzados diante do corpo e a expressão mais séria do que ela se lembrava das conversas que tinham durante o acampamento.

– Deus, quer me matar do coração? – ela levantou a mão até o peito, respirando fundo de novo para tentar acalmar as batidas descompassadas, não tanto pelo susto, mas agora pela presença do outro. – Do que está falando?

– Então era mesmo mentira. – um sorriso levemente convencido surgiu no canto dos lábios dele enquanto dava mais dois passos na direção da margem do rio. Ilithia arregalou levemente os olhos, lembrando exatamente o que tinha dito a ele na noite de três anos atrás, sobre seu guardião lhe arranjar um futuro marido. Ela deu um passo para trás, como se quisesse manter a distância dele, entrando mais no rio.

– Bom... você acreditou. – Ilithia tentou usar um tom descontraído, mas o sorriso foi forçado.

– Claro que não acreditei. – Cáel respondeu, mais calmamente, descruzando os braços. – Mas naquela época você parecia tão firme em me negar, que eu não tive escolha senão aceitar o que tinha dito.

– O que isso importa agora? – a morena deu de ombros, desviando rapidamente o olhar para a água, voltando então a encará-lo mais confiante. – Você estava noivo, não era? Imagino que já deva ter casado com ela e levado-a para o castelo. Ou agora é rei de outro reino... isso se encaixaria na sua imagem. Talvez já até tenha um herdeiro.

– Eu não estou casado, Ilithia. – ele deu mais um passo na direção dela, entrando no rio, e a morena engoliu em seco com a resposta direta, sentindo como se um peso tivesse sido tirado do peito. – Eu tentei te explicar três anos atrás que era uma noiva arranjada, desde antes mesmo que eu nascesse.

A Tough War [Concluída]Onde histórias criam vida. Descubra agora