Capítulo 6

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Katrina

Eu não estava no meu juízo perfeito. A partir do momento em que cogitei a ideia de receber o que quer que fosse daquela herança e imaginar como conseguir isso, eu sabia que não estava mais raciocinando com clareza.

Mas de qualquer forma, estávamos ali pensando em como burlar as regras daquele testamento idiota.

— Mas você tem certeza do que quer? — Erica perguntou, sentada na minha cama.

Parei de andar e olhei para ela. Eu tinha certeza que minha cara era de uma mulher totalmente perdida no que estava fazendo e dizendo.

Eu me sentia assim.

— Não tenho certeza de nada, Ca.

— Mas você contou para o tio sobre a condição de ser casada? Você sabe que não tem chances de receber essa herança sem se casar em menos de um ano.

— Não contei, Ca. Eu não sabia como fazer isso.

Parecia muita burrada, mas não era uma coisa simples de ser contada. Ainda mais quando ele me incentivou a aceitar a herança. Voltei a andar em círculos no meio do quarto.

— Certo. E como você pensa em conseguir receber o que tem, com este pequeno detalhe?

— Eu estava pensando em contar com a sua ajuda. — Parei de frente para ela, abrindo um sorriso cheio de intenções.

— Contar comigo? E como eu poderia ajudar? — ela perguntou fazendo uma cara dramática, levando a mão no peito e tudo.

— Você é a pessoa que eu conheço que tem as melhores ideias. Tenho certeza que vai me ajudar.

— Kat, seu problema não precisa de uma solução, e sim de arranjar um noivo.

Joguei-me na cama ao seu lado, de barriga para cima, enquanto encarava o teto.

Eu tinha um testamento em meu nome, mas que poderia receber apenas estando casada. Isso não era muito coisa de filme? Eu me sentia como a protagonista de um, sem muita saída.

Minha opção mais válida era desistir disso, como eu nunca havia precisado nada de uma mãe ausente, não seria agora que eu precisaria. Mas a curiosidade batia mais forte à minha porta. A vontade de me aprofundar nisso, as falas do meu pai no dia anterior. Tudo isso servira para me deixar acordada durante a maior parte da noite.

Eu não precisava de uma solução, e sim de um marido. Era isso. Não precisava ser um de verdade, não é? Se eu conseguisse convencer alguém a se casar comigo, apenas por seis meses, eu poderia ter o que queria.

Levantei em um pulo, sentando-me na cama e encarando Erica ao meu lado.

— É isso, preciso de um marido.

— Isso eu já sabia. Kat. Você levanta desse jeito, até parece que descobriu a combinação da megassena.

— Ainda não. Mas olha, pensa comigo — comecei a falar elétrica — eu não preciso ficar casada para sempre com a pessoa, só por seis meses, e depois cada um segue seu rumo.

— Certo, estou acompanhando. Mas quem se casaria com você? Não pode chamar um amigo qualquer assim, do nada, até porque a maioria já é casada.

— Eu não sei.

Voltei a cair de costas na cama, sendo acompanhada desta vez por minha amiga, que também começou a encarar o teto comigo.

— E se eu convencer o advogado a me liberar dessa? Poxa, a Joana já esta morta, o que custaria?

— Um testamento é um documento pós-morte, Katrina — minha amiga comentou, como se ensinasse uma coisa muito óbvia a uma criança — é aberto após a morte mesmo. E você acha que um advogado pularia a condição aplicada pela cliente? Seria falta de ética.

— Mas eu não contaria para ninguém, nem pra Joana. Só pra você. — Olhei para ela imitando uma carinha de criança pidona.

— Vamos pensar em alguma coisa.

— Eu estou tentando desde ontem à noite, quando comecei a cogitar essa ideia idiota — resmunguei, voltando os olhos para o teto.

O tanto que o encarávamos, parecia que ele era revestido em uma das artes mais belas do milênio. Mas era um simples teto branco, sem nada chamativo ou decorativo. Porém parecia que encontraríamos a resposta para o que procurávamos ali.

— E por que você resolveu que quer essa herança? Sabe que não precisa de nada do que ela possa te dar.

— Eu tive uma conversa com meu pai ontem, quando cheguei, e ele falou assim: "Se você não teve o amor dela, por toda a sua vida, não custa aceitar o que ela esteja querendo te oferecer agora" — repeti as exatas palavras dele, que ficaram martelando na minha cabeça. — Ele falou para não descartar nada antes de pensar muito bem. E eu quero, do fundo do meu coração, saber o que ela teria para me dar depois de morta.

Silêncio foi tudo o que preencheu o quarto, até o momento que o celular de uma de nós duas apitou de algum lugar do cômodo, indicando a chegada de mensagem. Mas ninguém fez menção de se levantar.

— Já sei — Erica falou, pulando na cama e sentando-se, imitando meu gesto de minutos trás. — Vamos fazer um anúncio.

Levantei também, olhando-a com as sobrancelhas franzidas, tentando entender o que ela dizia.

— Você precisa de um marido — ela começou a se explicar — e onde melhor hoje em dia para conseguir as coisas? — ela perguntou, mas não me deu tempo para responder, emendando logo em seguida a sua pergunta à própria resposta: — a internet.

— Você quer que eu coloque um anúncio na internet que estou à procura de um marido?

Ponderei a ideia. Ela na minha cabeça, parecia ruim, mas em voz alta soava ainda pior.

— Exatamente. Claro que não vamos aceitar qualquer um, podemos ter um questionário para ser respondido antes. E você pode ter alguns encontros antes de marcar o casamento, claro. Até mesmo para conhecer a pessoa, e não parecer tão falso, assim o tio não desconfiaria.

A ideia era péssima, isso eu tinha que concordar. Mas era a melhor que tínhamos durante toda aquela manhã juntas.

— Certo. Pode dar em alguma coisa. Mas... — deixei a frase no ar. Eu não tinha como me opor aquilo, afinal.

— Mas...? Não custa tentarmos. O máximo que poderia acontecer, é rirmos do questionário respondido. Pega o computador e vamos começar logo isso.

Estiquei a mão, peguei o notebook sobre a mesinha de cabeceira e entreguei a Erica. Logo ela iniciou os planejamentos e criação de todo o seu plano.

Fiquei do seu lado lendo o anuncio que ela criava. Ter uma amiga com conhecimentos nesta área, tinha suas vantagens. Não que eu gostasse de explorar esse seu lado.

Não consegui segurar a risada quando vi o título que ela usara para descrever o site.

PROCURA-SE UM MARIDO DE MENTIRINHA.

Ela até mesmo acrescentou uma linha embaixo, em caixa menor, que haveria recompensa a combinar.

Assim que escreveu essa linha, virou-se para mim com uma cara canastrona.

— Passar seis meses ao seu lado, sendo seu marido, já é uma recompensa e tanto, não é? — Nós duas rimos.

E no formulário, em letras grandes: MARIDO DE MENTIRINHA.

Era como se fosse uma brincadeira. Coisas de adolescentes. Era assim que eu estava levando até aquele momento.

Mas será que isso daria algum resultado?

Um Marido de MentirinhaOnde histórias criam vida. Descubra agora