CAPÍTULO 39

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Tudo estava pronto para a caçada. Tinham as correntes, a jaula montada sobre uma carroça puxada por cavalos, soldados e montaria para todos. Rayan fora o único a ficar em Audilha, causando certa inveja em Elser e Chris. Calisto tinha consciência de que a reunião de informações era muito importante para que seus planos prosseguissem bem. Além disso, Rayan era carismático e falador. Misturava-se bem com o povo e podia espalhar boatos com facilidade.

As estradas que os caçadores de demônios seguiam eram ruins. Mas seguir a trilha de Therd Fermen não era nada difícil. Bastava perguntar aos fazendeiros e camponeses sobre assassinatos e incêndios. Além disso, Calisto era capaz de captar sinais da criatura através de suas faculdades mentais. Durante a jornada, o Lorde pode perceber, pouco a pouco, a ferocidade e poder da besta. Quando chegaram na pequena vila de Naimont, foram recebidos com festejos. Já circulavam na vila todo tipo de histórias sobre a besta de fogo. Notícias de que um grupo de caçadores de bestas, vindos de várias partes do reino, trouxeram esperança aos habitantes que estavam amedrontados e desesperados.

Naquela noite, ajudados pela população local, acenderam uma grande fogueira na esperança de atrair a criatura, maníaca por fogo. Como Calisto imaginava, a besta veio, emitindo urros ferozes e jatos de fogo que incendiavam barracos instantaneamente.

A criatura não esperava por uma emboscada e atacava a vila sem preocupações. O papel de Chris era muito importante, pois ele, em teoria deveria ser capaz de ferir a criatura e talvez dominá-la. O mago estava muito nervoso e sabia que sua ação não podia ter falhas. O povo da vila gritava e fugia em desespero e era perseguido pelo demônio que os incinerava com grande prazer. Neste momento, Derek, Edréon e Weimart surgiram cavalgando com armas em mãos, gritando e desafiando o demônio para a luta. – Demônio! – gritaram juntos. E Derek completou com seu vozeirão, – Venha sentir nossas lâminas!

Therd parou no ar, batendo as asas membranosas com vigor. As chamas que o rodeavam cresceram e gargalhou num tom ameaçador. Derek continuou firme erguendo seu grande machado acima da cabeça. Edréon hesitou e estremeceu, quase recuando e Weimart, deixou o queixo cair e junto com ele sua espada. Ficou imobilizado de horror.

Calisto apresentava suas cartas e Therd aceitou o blefe. Therd voou próximo ao solo, emitindo rajadas de fogo em direção dos cavaleiros. Derek desviou-se por pouco, controlando sua montaria com grande habilidade. Edréon foi ao chão para evitar as chamas de calor sobrenatural e Weimart não teve a mesma sorte. Seu cavalo foi engolfado pelas chamas e logo em seguida gritava em desespero rolando pelo chão.

Calisto enviou o sinal para Chris. “Agora mago, faça sua parte!”

Chris evocou uma coluna de vento gelado, repleto de pequenas farpas de gelo cortante. Therd foi atingido, seu fogo apagou-se e girou no ar perdendo o controle do vôo. Simultaneamente, Calisto arriscou seu primeiro ataque mental contra o demônio. O efeito foi longe do que esperava. Ao invés de desmaiá-lo, fora apenas capaz de atordoá-lo. – Maldito! – exclamou o jovem. – Sua mente é resistente!

Ainda assim, o efeito causado foi suficiente para fazer com que Therd não pudesse evitar a colisão com a lateral do celeiro de onde Derek e os outros haviam saído.

Derek seguiu veloz em direção a Therd pensando que não haveria outra oportunidade tão boa para atingi-lo. Calisto pensou enquanto observava o avanço do gigante, “Louco...”

Louco ou não, Derek acertou a lâmina de seu machado com grande violência contra o corpo do demônio, que procurava recompor-se. O impacto não causou o efeito esperado. O machado ficou enganchado e o cavaleiro perdeu o equilíbrio e caiu da montaria. Ajoelhando-se para ficar de pé, mal pode crer nos seus olhos. Sua melhor machadada, não tinha sido capaz de penetrar mais que dois dedos na grossa pele do demônio. Murmurou assustado. – Credo! Sua pele é mais dura que madeira de lei!

Therd urrou e pôs-se de pé. Segurou o cabo do machado retirando-o de seu peito com um gemido surdo. Avançou contra Derek que imaginou que aqueles eram seus últimos momentos. Escutou no entanto um galope veloz atrás de si. Executando uma manobra de ataque que seria suicida para um humano, o inumano barão Dagon voou em direção ao demônio. Deixando o lombo do cavalo que corria em velocidades impossíveis, fez de seu próprio corpo um grande projétil, cuja ponta era a grossa lâmina de sua espada montante. A pele grossa do abdome do demônio cedeu e trespassado, foi pregado contra a parede do celeiro. Dagon, chocou-se contra a parede e caiu no chão ao lado, tendo vários de seus ossos desarranjados. Therd gritou, emitindo golfadas de seu estranho e negro sangue demoníaco entre os dentes pontiagudos. Therd pregado, não viu alternativa senão incendiar todo seu derredor. Acendeu seu corpo como uma tocha. Sem paredes não estaria mais preso.

Calisto e Chris avançaram. Enquanto Calisto atacava a mente de Therd, Chris atirava lanças de gelo contra as asas do demônio, fazendo vários furos. Therd tinha um tipo de mente bizarra. Calisto nunca tentara penetrar numa coisa como aquelas. Sentia suas têmporas explodir e não conseguiu defender-se de um contra-ataque mental, instintivo da criatura. Ajoelhou-se no chão, sentindo muita dor e em sua boca sentiu gosto de seu sangue. Em seguida, o sangue do jovem lorde vazava pelas narinas e pelo ouvido.

Arqueiros fiéis a Edreón disparavam flechas contra a criatura, mas quase não faziam efeito algum. Era como se atirassem agulhas no monstro.

Derek avançou rolando para buscar seu machado aos pés da criatura. Girando-o com toda força atingiu o braço esquerdo, abrindo um talho. A reação desta veio na forma de um safanão arremessou o cavaleiro para a distância de duas vezes seu tamanho. A armadura estava amassada e rasgada e sob esta, havia queimaduras e um corte que arrancava sangue do abdome do cavaleiro.

Calisto precisava mudar de estratégia com urgência. Enviou alguns pensamentos para a mente da criatura. “Escute Therd, não queremos mandá-lo de volta. Nem mesmo trouxemos o nexo.”

Lutando para libertar-se, Therd respondeu em voz alta e gargarejante, – O que querem então, me matar?

“Não! Queremos sua colaboração. Entregue-se e lhe daremos o que deseja.”

Neste momento a parede que prendia o demônio cedeu. Com esforço ele retirou a espada do abdome, ajoelhando no chão por um momento, sentindo muita dor.

Calisto, gritou. – Parem de atacar! – e em seguida transmitiu pensamentos para seus aliados, “Ele vai se entregar!”

O instante seguinte seria decisivo. O demônio tinha a mente ativa, e apesar de ter um controle rude sobre seus poderes, tinha uma potência enorme. Isso possibilitava a comunicação veloz que havia entre telepatas.

“Escute o que tenho a dizer poderoso demônio. Ser meu aliado lhe trará apenas vantagens, inúmeras vantagens. O tempo é importante, pois me escute!”

No momento seguinte, o demônio colocava as mãos sobre o chão, submetendo-se à vontade de Calisto. O jovem ordenou que trouxessem as correntes e a jaula. Em pouco tempo, o temível Therd Fermem estava acorrentado e a deitado na jaula, dentro de uma enorme bacia de metal. Seu corpo em chamas, elevaria a temperatura para derreter o metal das correntes e da jaula. Logo os vários soldados fizeram um mutirão para encher a bacia com água. Baldes e mais baldes de água foram jogados até que a criatura era imersa em água fervente que exalava muito vapor. Com o tempo, as chamas cederam, a temperatura se estabilizou e esfriou um pouco. Estava imerso em água quente.

Calisto sorriu apesar da dor de cabeça. A captura tinha sido bem sucedida. Os feridos eram tratados, não houve nenhuma vítima fatal entre seus homens. Com algum esforço, o barão Dagon pode se recompor e antes de seguir seu caminho, levou consigo um camponês morto por Therd, para lhe servir de alimento. Derek reclamava muito de seu ferimento, mas por sorte, o corte era superficial. Elser saiu de sua posição, sem precisar cumprir sua parte. O plano de Calisto havia funcionado em sua segunda parte, dispensando suas ações. Weimart sofrera várias queimaduras, mas foi protegido por suas vestes grossas e armadura, certamente sobreviveria.

Maré VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora