Capítulo 5

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Alex

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Alex

Tento pensar em outra coisa, mas fracasso. Caralho, como algo assim pode estar acontecendo comigo? Mais uma vez sinto o costumeiro nó travar minha garganta. Olho para as minhas pernas inúteis, e me pergunto o que será de mim se jamais voltar a ficar de pé sobre elas.

Tenho evitado conversar com minha mãe. Ela está mais inconsolável do que eu, mesmo que tente desesperadamente disfarçar. Ela sente-se culpada por me apresentar o amor pelos esportes radicais. Foi com ela que experimentei quase todos. Já saltei de paraquedas, pulei de bungee jumping, esquiei, participei de escaladas em montanhas íngremes, corridas automobilísticas, fiz todo tipo de esporte considerado radical. Porque ela é assim, apaixonada por adrenalina como eu.

Às vezes, acho estranho que ela não seja minha mãe biológica. Porque, sério, somos praticamente iguais. Os mesmos gostos, o mesmo espírito aventureiro, o mesmo desejo de liberdade. Foi por isso que, quando a solidão começou a fazer morada nos seus dias, ela foi até aquele orfanato e me escolheu entre tantos e tantos rostos. Eu era apenas um menino magricelo e desconfiado, quando ela se aproximou e sentou-se ao meu lado. Não falou nada. Ficou apenas ali, olhando para as árvores que estavam à nossa frente. E depois de muitos minutos em silêncio ela me perguntou o meu nome.

— Alexandre — respondi de má vontade. Eu era patético.

Ela, no entanto, sorriu e me fez uma pergunta mais estranha que alguém pode fazer a uma criança:

— Se você pudesse escolher, o que escolheria, Alexandre: viajar de carro ou de balão?

Fiquei olhando-a, sem entender o sentido daquela pergunta. Ela me deu um empurrão com o ombro e repetiu:

— Vamos, é simples: terra ou ar? O que faria se pudesse escolher? Voaria ou correria?

— Voaria.

Ela assentiu e um sorriso suave se espalhou no seu rosto quando afirmou:

— É, eu também prefiro o ar a terra firme.

E essas foram as primeiras palavras que trocamos. Depois daquele dia, ela passou a me visitar com frequência. Sempre trazia fotos de lugares incríveis para me mostrar. E passado alguns meses em nossa relação quase silenciosa, um dia estávamos comendo um sanduíche que ela nos trouxe quando interrompeu uma mordida e me olhou intensamente.

— Quero ser sua mãe, Alexandre. O que acha da ideia?

Fiquei olhando para ela. Não, aquilo não poderia estar acontecendo. Qual a chance de uma criança da minha idade ser adotado? Praticamente nenhuma. Nós, órfãos ou rejeitados, só tínhamos chances se estivéssemos dentro do padrão: branco, bebê e saudável. Eu era branco e saudável, mas não era mais um bebê. Estava próximo de completar onze anos, e já tinha me conformado em não ter uma família. Em ser só. Então, aquela mulher lindíssima, que podia conversar sobre tudo, mas principalmente adorava ficar em silêncio ao meu lado, queria ser minha mãe? Não, algo não estava certo naquela história. Então, engoli a mordida do sanduíche e forcei o meu coração a bater em ritmo normal. Só depois de alguns minutos que criei coragem para olhar para ela. Ela continuava a comer e me olhou de lado com um pequeno sorriso, quando indagou:

— Então, o que acha da ideia?

Eu fiquei lá. Sem conseguir falar absolutamente nada. E quando o horário dela ir embora chegou, eu apenas assenti. Ela estendeu a mão e tocou a lateral do meu rosto dizendo:

— Te prometo que viveremos grandes aventuras, Alexandre.

E ela cumpriu. Minha vida passou de uma tela em branco, para uma tão colorida que doía os olhos. Fui tão amado desde o primeiro dia que entrei pela porta da nossa casa, que nunca mais pensei no meu passado. Era como se eu tivesse nascido ali, naquele momento.

Uma batida suave na porta me desperta da melancolia que me engole como um monstro faminto.

A porta se abre e Benito entra. Desvio meus olhos dos dele. Foi constrangedor ter desmoronado na frente do meu médico. Quando percebi que estava despejando nele, além da insegurança com a minha situação, o medo que estava sentindo por ser abandonado pela Helena, não consegui parar. E foi mais surpreendente ainda que ele tivesse me ouvido como um cara que entende exatamente o que estou sentindo. O magnetismo daquela mulher é algo quase inexplicável. Não é só sua beleza. É muito mais. É a força que ela demonstra e a fragilidade que tenta esconder quando está concentrada e não se sente observada. Ela é uma miríade de sensações. E está fodendo com minha cabeça. Porque eu anseio desesperadamente pelo toque das suas mãos. E é pelos motivos errados.

— E aí, Alexandre? Como estamos hoje? — indaga Benito se aproximando da cama.

— Tudo exatamente igual. Continuo tão inválido quanto ontem.

Ele sorri condescendente.

— Amanhã faremos uma bateria de exames. Precisamos checar se houve alguma mudança nessas últimas duas semanas.

— Não era para sentir se tivesse ocorrido alguma alteração?

Ele cruza os braços diante do peito.

— Nem sempre. Às vezes, a luxação diminui, mas a cabeça impede que o paciente sinta as pequenas mudanças.

Olho para o outro lado. Não quero dizer a ele que senti um formigamento na ponta dos pés, porque foi uma única vez, e sei lá, pode ser coisa da minha cabeça.

— Alex?

Olho para ele e sei que ele vai falar sobre a Helena antes mesmo que abra a boca.

— Falei com a Helena. Ela vai continuar te acompanhando, se não for problema para você.

Meu coração acelera a simples menção do nome dela, mas tento disfarçar.

— Foi ela que disse que não desejava mais continuar no meu caso. — Encarando-o, tento mostrar a ele, que não ficarei fazendo confidências como ocorreu da última vez. Aquilo foi um deslize que não pretendo repetir. — Por mim, tanto faz quem seja o fisioterapeuta, doutor.

Ele coça a nuca, e vejo que tenta disfarçar um sorriso.

— Ok, então. Bom saber.

Ele me faz mais algumas perguntas, e se despede me deixando com uma sensação de euforia que não sei bem de onde vem.

A quem eu quero enganar?

Durante o resto do dia, me esforço para controlar a ansiedade para o dia seguinte. Nossa sessão sempre é no início da manhã e preciso não parecer tão absurdamente ansioso.


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