Capítulo 2

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Helena

Estaciono o carro na ala dos médicos. Baixo o espelho retrovisor, e refaço rapidamente meu coque. Meu segundo plantão do dia. Hoje o dia está particularmente frio, mas não me importo. Gosto de sentir o vento gelado batendo no meu rosto. Saio do carro, e puxo o gorro para cobrir minhas orelhas. Fecho o casaco e entro no Hospital Sírio-libanês. Olho para o céu de onde cai uma chuva fina, e vejo que, apesar de já ser noite, ainda está claro. Apresso-me, pois estou atrasada para a reunião que Benito solicitou.

— Olá, Susana — saúdo a recepcionista que está falando com alguém ao telefone e apenas acena para mim.

Vou até a sala que utilizamos para descanso e abro o meu armário. Retiro de lá meu uniforme e vou até o pequeno banheiro me trocar.

Alguns minutos depois, entro novamente na sala e vejo que não estou mais só. O Dr. Irwing, neurocirurgião, está encostado displicentemente na máquina de café, mas sei que sua postura relaxada é uma farsa. Contenho um suspiro de frustração e tento ser o mais sociável possível.

— Boa noite, Irwing.

— Ah, olá, Helena.

— O Benito já está na sala de reunião?

Ele me olha e eu vejo ali todo o ressentimento que ele guarda por eu não ter correspondido as suas intensas investidas.

— Provavelmente. Ele está aqui há mais de quarenta e oito horas acompanhando o caso do atleta que caiu na pista de esqui. Agora que ele já viu com os próprios olhos que ele está bem, deve querer ir para casa.

Sorrio brevemente. Este é o Benito. A pessoa mais gentil e humanitária que conheci desde que cheguei aqui. Trabalhamos juntos há mais de um ano e nunca o vi reclamar de nada. Sua paciência e cuidado com os seus pacientes é algo que me inspira todos os dias. Apesar de ser bem jovem, ele é um dos grandes nomes da ortopedia do Sírio-Libanês.

— Este é o Benito! — falo em voz alta. — Você vai participar da reunião também?

Ele assente e cruza os braços na frente do peito largo e malhado.

— Vou.

— Ok, estou indo para lá — aviso e me preparo para sair.

— Helena?

Me viro, e sinto vontade de suspirar antes de olhá-lo nos olhos.

— Você não respondeu minha mensagem.

Mordo o lábio. Detesto ser colocada contra a parede. Não gosto de pressões e ele sabe disso. Já disse mais de uma vez, que não estou interessada em conhecê-lo melhor, como ele tem sugerido constantemente, mas ele não sabe receber um não como resposta.

Quando abro a boca para responder, o Benito abre a porta e diz com a sobrancelha erguida:

— Podemos começar? Estou louco para chegar em casa e desmaiar por dezoito horas.

Sorrio e vou andando até onde ele está.

— Duvido. Basta alguém te ligar que você sai correndo. A Hosana não para de reclamar que se casou com um verdadeiro e absoluto workaholic.

— É só charme. Ela é igualzinha — diz e se afasta para me dar passagem.

— Você não vem, Irwing?

Ele retira o celular do bolso do jaleco, e diz sem nos olhar:

— Vão indo. Vou apenas responder uma mensagem.

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