Capítulo 34

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HARRY

—Você vai ficar bem, sr. Harry.

Tenho quase certeza de que Lindy diz isso mais pra si mesma do que pra mim. Mesmo assim, me agarro um pouco às suas palavras.

—É, eu vou ficar bem - digo, forçando um sorriso. É algo que eu tenho feito bastante ultimamente. Forçar sorrisos. Pelo menos me dou ao trabalho de tentar.

Ela apoia as mãos no topo de uma grande pilha de papéis.

—Separei todas as minhas receitas mais fáceis. Coisas que você pode fazer no domingo e deixar as sobras para a semana, jantares rápidos com ingredientes da despensa. E, claro, não deixe de tomar café. Seus ovos são bons.

Ponho as mãos em cima das dela e aperto. Ela me encara surpresa. Em todos os anos trabalhando para minha família, não sei se alguma vez a toquei, mas no momento parece a coisa certa a fazer.

—Obrigado - digo, baixo. —Por tudo.

Ah, meu Deus. A mulher vai começar a chorar, posso ver pelo queixo tremendo e pela maneira como olha para um canto do teto da cozinha e depois para outro.

—Talvez não seja a decisão certa - ela diz, com a voz falha. —Talvez...

—Não - digo, me inclinando e me forçando a soar simpático, ainda que minhas palavras sejam resolutas. —Você merece se aposentar, Lindy. E Mick também.

E é verdade, mas o timing não é dos melhores. Quase duas semanas depois que Louis me deixou, Lindy e Mick pediram demissão. Eles disseram que queriam me contar pessoalmente, ainda que fosse meu pai quem pagava o salário deles e com quem de fato precisavam falar.

Mas sei o real motivo pelo qual me encurralaram no escritório aquele dia. Não era mera formalidade. Queriam marcar sua posição. Era a maneira deles de dizer que, se eu tinha deixado Louis ir, deveria deixar que também fossem embora.

Em outras palavras: se queria viver sozinho, então viveria sozinho mesmo.

O lance é que não consigo nem ver os dois como traidores. É claro que ficaram do meu lado antes que Louis tivesse aparecido. E se mantiveram comigo enquanto assustava todos os cuidadores que meu pai mandava. Na superfície, nada precisaria mudar. Na teoria, deveríamos ser capazes de voltar a ser só nós três, eles fora do meu caminho e eu os tratando com mais educação do que reservava ao resto do mundo.

Mas isso já não é o bastante para eles, e fico contente. Sempre mereceram mais do que ficar com uma fera ranzinza que, em seus piores dias, mal conseguia reunir forças para dizer "obrigado".

—Não vamos estar longe - Lindy disse, se recompondo. —E pode passar o Natal com a gente se quiser. São só quarenta e cinco minutos. E você é sempre bem-vindo.

—Vou ficar bem, Lindy. Não se preocupe.

Mas não estou bem. Ontem mesmo refleti se queria mesmo continuar vivendo. As noites acabam comigo, não pelos pesadelos —Já estou acostumado com eles —Mas porque estou sem Louis. Há dois dias atrás cheguei próximo demais de desistir e eu tentei. 

Fui até a cômoda do meu quarto onde guardo um revólver, eu carreguei a arma, caminhei até a biblioteca, sentei em minha poltrona e coloquei o cano da arma em minha boca e então...eu vi Alex. Ele usou que restava de suas forças para me salvar e era assim que eu o agradeceria? 

Eu sou patético.

 Acabei bebendo até desmaiar na poltrona. Lindy que me encontrou pela manhã jogado na biblioteca com a arma na mão. Ela não disse nada a respeito da arma, talvez tenha ficado assustada demais pra questionar.

Em Pedaços ( Larry Stylinson)Onde histórias criam vida. Descubra agora