Carta 4

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Querida Tessa,

As coisas não poderiam estar melhores para nós naquele ponto.

Meu pai acreditava que cada vez que saía de casa, ia ver uma senhorita diferente, buscando boas alianças, mas todos os dias em que conseguia sair eram para ir vê-la, apenas você, minha futura esposa.

Eu não podia negar que estava completamente apaixonado, a amava com cada fibra do meu ser e vi o sentimento ser correspondido aos poucos por você. Nós já falávamos em nosso casamento, nossos filhos e nosso futuro juntos, e eu estava ansioso por tudo aquilo.

Nossas perguntas estavam acabando, eu tinha prometido que a última delas seria um pedido de casamento, já tinha certeza da sua resposta positiva, mas ainda temia que pudesse recusar. Meu tempo estava acabando e meu pai achava que eu ainda concordava com os planos sobre ir para a universidade, estudar Direito para ter uma vida enfadonha na Corte. Aquilo, definitivamente, não aconteceria.

Você me mostrou, mesmo sem saber disso, que a vida podia ser muito mais do que aquilo que planejavam para mim, que eu podia construir meu próprio futuro. Você me deu forças e um motivo para lutar contra a dominação que meu pai exercia sobre mim desde que eu nascera. Eu podia ser um bom marquês e exercer minhas funções políticas, algo que eu realmente gostava, e ter um casamento feliz, não precisava me sujeitar a todos planos do meu pai.

E eu estava decidido que resolveria aquela questão naquela noite mesmo, no jantar. Minha família poderia se surpreender com a minha decisão, mas naquele ponto, meu pai já não via você como uma má opção, a minha atenção a você nos bailes e o meu cortejo deu a você a atenção de vários outros, e aquilo era bom, apesar do meu ciúme, pois mostrava que você tinha um bom traquejo social e que era adorada pela sociedade. Aquilo me preocupava um pouco, mas eu sabia que você só tinha olhos para mim, eu tinha feito um ótimo trabalho conquistando-a.

Quando entrei na sala de jantar, Maitê me lançou um olhar questionador e assenti discretamente enquanto caminhava para o meu lugar à mesa. Ela sabia o que aconteceria ali naquela noite, estava incumbida de me ajudar, todos que conheciam bem Maitê sabiam que ela era a melhor pessoa para contestar e argumentar sobre algo que ela julgava importante e, naquela noite, Tessa, ela advogaria por você.

Eu me sentei e me servi, deixando que os assuntos do meu pai, que eram sempre os mesmos, discorressem durante todo o jantar. Minha mãe estava calada, mas seus olhos de águia, como sempre, captaram a minha tensão.

- Qual é o problema, Henry? – Ela perguntou quando já estávamos esperando que a sobremesa fosse servida.

Por um segundo, eu quis correr quando meu pai fixou um olhar questionador em mim. Eu podia ser confiante e talvez inabalável para os outros, mas o olhar do meu pai sempre me desestabilizava.

- Eu... – hesitei, limpando a garganta antes de prosseguir. – Quero comunicar algo a todos vocês.

Depois de beber seu vinho, meu pai arqueou uma sobrancelha, pousando a taça sobre a mesa.

- Pois então diga. – Foram suas únicas palavras.

Troquei um rápido olhar com Maitê. Minha irmã me entendia, sempre entendera muito bem, nossa ligação era sempre muito forte, por mais que sempre trocássemos farpas e brigássemos as vezes.

- Decidi que não vou mais para a universidade. – Declarei de uma vez, o olhar focado no meu pai, o chefe da família, o único ali que tinha que concordar com aquilo. – Sei que o senhor tinha planos para que eu estudasse Direito e trabalhasse ao lado do rei no futuro, mas esse não é o meu desejo, eu odeio Direito e tenho outros planos para mim. Planos que vão beneficiar a família tanto quanto essa aliança com o rei.

Decidi interpretar o silêncio do meu pai como algo bom. Eliot Baker sempre foi um homem que ponderava tudo muito bem antes de dizer qualquer coisa, era por isso que o rei apreciava seus conselhos.

- Então me diga, quais são seus planos para você mesmo? – Sua pergunta era um pouco ácida, mas pelo menos ele ainda estava me ouvindo.

Eu sabia que precisava dar as cartas da maneira correra ali, com cuidado, e assim o fiz.

- Eu já venho administrando o baronato da família sozinho há algum tempo e o senhor sabe que gosto disso, faço isso muito bem também. – Apontei, recebendo um assentir como resposta. – O que eu quero fazer agora é melhorar essa administração e trabalhar mais ativamente com o senhor em Dempster enquanto se dedica às questões do reino com o rei e a Corte. Também tomei a decisão de que me casarei, trazendo uma boa e promissora aliança para nós e muito dinheiro aos cofres do baronato.

A verdade, Tessa, é que aquilo não me importava em nada. Eu não ligava para o baronato, para o condado ou para o marquesado naquele momento, e você sabe disso, tudo que eu queria era que meu pai visse a nossa união com bons olhos. Depois que já estivéssemos casados, nada poderia ser feito.

- Certo. – Meu pai ponderou. – E quem é a senhorita que pretende ter como esposa?

Aquele era o momento em que duas cartas importantes seriam dadas.

- Estive cortejando algumas senhoritas nas últimas semanas e cheguei a uma decisão. – Eu disse calmamente. – A Srta. Anne Cock é uma boa moça e seu pai é um barão com alguma notoriedade, mas não tão adequada para ser uma marquesa. Por outro lado, a Srta. Tessa Hildegart parece ser o tipo de dama criada para algo assim, grande e importante.

Os olhos do meu pai brilharam. A Srta. Cock era filha de um conhecido dele da Corte, poucos meses mais nova que eu, mas nunca tinha sido uma opção de verdade.

- E qual é a sua decisão entre as duas? – Ele sondou, e eu sabia que ainda não tinha aprovado nada, mas que esperava pela minha resposta para poder julgar minha decisão.

- Se eu puder opinar, papai... – Maitê aproveitou a deixa e atraiu a atenção de todos à mesa. – Acho que, entre as opções de Henry, a Srta. Hildegart é mesmo a melhor. Nós nos tornamos íntimas nas últimas semanas e eu reconheço nela o tipo de dama que a mamãe me treinou para ser, apesar de ela ser muito mais adequada para algo assim do que eu. Tessa é encantadora com os homens e exemplar para as mulheres, se porta com perfeição...

Quando um sorriso curvou os lábios do meu pai, eu soube que tinha vencido, mas não demonstrei isso.

Maitê e eu podíamos ter nossas diferenças, mas quando nos juntávamos para aprontar uma juntos, ninguém podia nos vencer. Éramos dois manipuladores. E eu estava feliz com isso.

- Se até a sua irmã a acha uma boa opção, um exemplo, então talvez a moça seja mesmo a melhor escolha a se fazer.

Quis sorrir orgulhoso e comemorar. Foi difícil não o fazer. Não podia parecer tão feliz com aquilo tudo.

- Isso quer dizer que o senhor concorda com meus planos? – Perguntei, tentando não parecer ansioso pela confirmação.

Ele suspirou, meneando a cabeça em negativa como se nem ele mesmo acreditasse naquilo.

- Não é como se eu estivesse totalmente contente com isso. – Justificou ele. – Queria que fosse estudar e seguir meus passos ao lado do rei, mas não posso dizer que seus planos são ruins. Eu estou ficando velho e preciso de ajuda com Dempster enquanto me dedico à política e, apesar de ser novo para se casar, será uma boa escolha.

Foi impossível conter o sorriso dessa vez.

- Então nós teremos mesmo um casamento para planejar... – até a minha mãe parecia feliz com aquilo.

Meu pai quis discutir cada uma das condições para aquele casamento, dizendo sobre tudo que eu teria que conversar com seu pai antes de tomar qualquer decisão e que o acordo pré-nupcial devia ser feito logo. Deixei que ele falasse, em minha mente somente a constatação de que aquilo iria mesmo acontecer se passava. Nós iriamos nos casar.

E no dia seguinte, no parque, as perguntas chegaram ao fim e eu te fiz aquela pergunta mais importante de todas. Você me disse sim, e foi como se meu peito explodisse, porque a mulher mais incrível do mundo todo seria minha esposa. Era surreal demais para que eu acreditasse facilmente, mas ali estava você, sorrindo e me dizendo sim.

Eu sabia que nós seriamos felizes juntos. Nós já tínhamos conseguido convencer meu pai de que aquele casamento seria algo bom, o que poderia ser mais difícil que aquilo? 

As cartas do marquêsOnde histórias criam vida. Descubra agora