6 - Vai ficar tudo bem

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Sheng HuiYing

 . Eu estava confusa, perdida, filha? Morta? Sequestrada? As frases antes ditas rodopiavam em minha mente de forma desconexa, eu gritei para que parassem, acho que é a primeira vez que grito com alguém, estou tremula, o ar não alcança meus pulmões corretamente, sinto meu nariz e meus olhos arderem, mas não vou chorar agora, vou escuta-los, depois eu coloco meus pensamentos em ordem.

 . Todos nos sentamos na mesa, me sinto aliviada por finalmente me apoiar em algo, sinto que se eu tivesse continuado em pé minhas pernas iriam ceder, respiro fundo tentando controlar minha respiração, olho para todos ali, Líder Jiang estava na ponta oposta a madame Rou, HuanGuang-Jun e mestre Wei estavam na minha frente, mestre Wei parecia apreensivo, Líder Jiang tinha uma face severa e seus olhos ardiam em raiva encarando madame Rou, que repetia o ato.

- Por favor, me contem - peço ainda regulando minha respiração - com calma - completo.

- Eu começo - se propôs o Líder Jiang, com sua potente voz carregada de rancor - Você, HuiYing, foi sequestrada assim que nasceu por madame Rou - ele diz.

 . Foi como se eu tivesse sido atingida por um soco, engulo em seco, madame Rou me sequestrou? A mulher que eu sempre vi como uma mãe, me tirou da minha família biológica, porque? A olho com os olhos, ainda que um pouco perdidos, questionadores, ela desvia o olhar de meu rosto.

- Eu...Eu sou estéril - ela conta - eu sempre quis ter filhos, madame Jin teve logo dois, os Jin só precisavam de um garoto para herdar a seita, provavelmente arranjariam um casamento qualquer para se livrar de você - ela tenta justificar, vejo um brilho roxo vindo da mão do Líder Jiang - eu não a sequestrei! Eu a salvei de uma vida infernal! - ela diz - te poupei de muito sofrimento - ela fala.

- Sua maldita! - rosna o líder Jiang - Faz ideia do quanto minha irmã sofreu?! Ela deu a luz a duas crianças e recebeu a falsa notícia de que uma delas nasceu morta! Você poderia ter adotado algum órfão, ajudado alguma criança que vivia nas ruas, estaria fazendo a diferença na vida de alguém que realmente precisava! Além de tira-la da família você causou dor e sofrimento a uma mãe e a uma criança que sempre acreditou estar sozinha! - ele acusa se levantando, madame também se levanta, pronta para retrucar, mas eu a impeço.

- Parem! - peço - sentem-se, vamos conversar sem brigas - eu digo, me viro para o líder Jiang que havia se sentado novamente, mas continuava fervilhando de raiva - como podem ter certeza de que sou...essa criança? - pergunto, uma parte da minha mente pedia aos deuses para que tudo não passasse de um mal entendido, que tudo voltasse a ser como antes, sem cultivadores e ataques, sem descobertas chocantes, mas uma outra parte minha gritava para que fosse verdade, isso significaria que meus pais não me abandonaram, que eles não simplesmente me descartaram, que eu não era inútil, significaria que minha mãe realmente sofreu pela minha perda, que ela me amava sem nem ao menos ter me visto, meu pai me amaria também? o jovem Jin seria meu irmão? Sem que eu percebesse uma faísca de esperança se ascendeu em meu interior.

- Wei Wuxian contou que viu sua marca de nascença no ombro esquerdo - ele conta afastando suas vestes de seu ombro esquerdo, mostrando uma marca como a minha, algo como uma flecha apontando para o coração, arregalo meus olhos - é uma marca de nascença Jiang, nos dias atuais, somente eu e Jin Ling a temos, os outros Jiang de linhagem principal foram caçados e mortos pelos Wen durante a guerra - ele arruma as roupas - e é impossível não ver Yanli quando olhamos para você - ele termina.

 . Fico calada durante algum tempo, pondo meus pensamentos no lugar, sinto as lágrimas que tanto insisti em segurar rolarem por meus olhos, coloco a mão na frente da boca, me viro para o Mestre Wei.

- Foi por isso que me chamou de 'Shijie'? - ele confirma com a cabeça, olho para madame Rou, que estava apreensiva, analiso sua expressão, seus lábios estavam comprimidos e seu olhar era temeroso, madame Rou desde sempre me contou que havia sido abandonada, ela me criou como sua filha, por mais que não fosse extremamente carinhosa, ela era cuidadosa e preocupada, ela foi realmente uma mãe para mim, me deu um lugar para morar e comida, pensar que ela na verdade me tirou da minha verdadeira mãe... dói - madame Rou...sou e sempre serei extremamente grata por ter me criado, você e as outras são como uma família para mim - sorrio pequeno ainda com lágrimas escorrendo por meu rosto, mas meu sorriso vai diminuindo até desaparecer, respiro fundo antes de terminar - ... mas não posso...não consigo perdoa-la por me tirar da minha família, você... você disse que me livrou de um enorme sofrimento, mas em qualquer lugar que nós formos, ele vai estar lá, nos esperando para ensinar algo...por mais que eu sorria, em minha mente eu já chorei muito - conto, seus olhos marejam - passei minha vida me chamando de inútil e insuficiente, pelo fato de ter sido 'abandonada', por mais querida e amada que eu fosse - confesso - eu...eu vou tomar um ar lá fora - digo e me levanto, sinto meu coração pesado, passo pela porta rapidamente e saio para o jardim dos fundos, assim que saio lá fora eu consigo respirar melhor, as poucas flores aqui me trazem algum conforto, olho para a lua brilhante, fico parada no meio do jardim apreciando a bela noite, tentando calar meus pensamentos, fecho os olhos com força e solto o ar.

- Senhorita Sheng? - ouço uma voz me chamar, viro me deparando com Lan Shizui, forço um sorriso tentando limpar as lágrimas.

- Jovens mestres Lan, jovem mestre Jin, o que fazem aqui fora? Vão acabar se resfriando, por que não entram, farei uma sopa para-

 . Sou interrompida por braços me rodeando, o cheiro de amêndoas misturado com lótus inunda minhas narinas, agarro-me nas vestes amarelas e me permito chorar como nunca chorei antes, sinto Jin Ling me apertar em uma tentativa de me trazer conforto, eu soluço, minhas pernas tremem, afundo minha cabeça na curva de seu pescoço.

- Vai ficar tudo bem... - ele diz com a voz um tanto tremula - vai ficar tudo bem...

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1093 palavras   

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