THRILLER

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Outono de 83. O cenário musical era incrível: quando pensávamos não ser possível alguém fazer uma música mais bacana, vinha outro artista incrível e superava o primeiro. Marvin Gaye, Madonna, Supertramp... eu amava a música Total Eclipse of the Heart da Bonnie Tyler, Michael curtia Ervery Breath you Take do The Police. Ele também estava nas paradas, claro: Billie Jean e Beat it estavam sempre perto ou no topo das paradas, mas para o meu chefe isso não era o bastante. Era nítido que ele se sentia grato pelo disco estar indo bem nas vendas, mas ao mesmo tempo culpado por não estar satisfeito. Ele queria mais. Ele queria o máximo. E isso o corroía.

Eu atuava como personal trainer, nutricionista, secretária, terapeuta, amiga, e... e mais alguma coisa ainda sem definição. Não podíamos namorar, o que seria o normal. Primeiro havia a pressão do empresário Frank e dos demais "conselheiros" que diziam que as fãs precisavam da ilusão de um ídolo que elas pudessem sonhar em conquistar. De outro lado tinham os nossos próprios princípios e impulsos. Sabíamos que não queríamos avançar para um relacionamento sexual, pois além das questões morais que tanto ele quanto eu tínhamos e acreditávamos, havia as minhas neuras e dores físicas/psicológicas. Não era algo que pudesse ser feito de qualquer maneira. Eu sabia que jamais conseguiria relaxar o necessário se nossa relação não fosse como eu e ele achávamos que deveria ser. Era um paradoxo: não conseguíamos ficar longe um do outro - eu sempre acabava dormindo na casa da piscina pelo menos duas a três vezes na semana - mas também era impossível estar muito perto pois as nossas reações não tinham acabado, apenas aprendemos a controlá-las.

Era neste contexto que a preparação criativa para a Victory Tour se seguia... Michael ensaiava quase todos os dias, intercalando com os ensaios do vídeo, e os irmãos se juntavam a ele alguns dias, no início da noite para que tudo saísse perfeito. Era realmente incrível vê-los criando e perceber a sincronia que tinham.

Nos finais de semana tínhamos um combinado: no sábado à noite eu ia para casa e então nos víamos apenas no domingo à tarde, quando eu ia pra Haveyhurst para amanhecer lá na segunda e organizar as rotinas da semana. Essa foi uma ideia de Katherine, para que nem eu e nem Michael perdêssemos as programações das comunidades a que pertencíamos: ele no salão do reino e eu na igreja Batista.

Foi em uma destas manhãs que quase toda a história da indústria musical de 83 em diante poderia ter sido totalmente diferente. Muitas coisas estavam acontecendo por baixo da calmaria aparente e Katherine que, assim como seu filho, escondia muito dos problemas, não por maldade, mas sim por querer poupá-lo e achar que as coisas poderiam se resolver. Michael não sabia, mas sua mãe estava sendo constantemente questionada pelos líderes dos Testemunhas por conta da canção Thriller e do vídeo que Michael estava para lançar, com a temática de terror. Ela justificava o filho, dizendo que ele era um artista e que aquilo era apenas fantasia, mas chegou a um ponto insustentável e Michael percebeu que havia algo errado. Quando questionou Katherine, ele ficou desolado. Talvez desolado não seja a melhor palavra para definir... Michael ficou fora de si. Foi assim que Janet e Lá Toya me descreveram quando foram me buscar no culto.

−       Sarah, por favor, você precisa vir com a gente agora - suplicava Janet - ele está fora de si. Está dizendo que vai cancelar tudo e que vai se livrar das fitas, estava querendo ir para o estúdio agora de manhã...

−       Mamãe está tentando convencê-lo a esperar, mas você sabe como ele é... - disse La Toya, visualmente nervosa.

Quando entrei no carro e elas me contaram o ocorrido, custei a acreditar. Como poderiam desconfiar que Michael, a pessoa mais correta e comprometida com sua religião que eu conhecia, poderia estar "adorando o maligno" por conta de um clipe de lobisomem e zumbis... As meninas falavam sem parar, indignadas com as testemunhas e com Michael, mas eu seguia em silêncio. No meu coração eu orava para ter os melhores argumentos e ser usada para trazer Michael à razão. Afinal, se eu havia aprendido algo lendo as escrituras é que a religiosidade era um mal que até Jesus havia combatido.

Michael Jackson - E se... - lado AOnde histórias criam vida. Descubra agora