INVINCIBLE

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    -Sarah, você tem certeza que não vai tomar a dose inteira? E se você tiver dor no meio da noite? - disse Mary, a enfermeira que me acompanhava enquanto fazia o novo curativo em meu braço.
Eu gemia de dor.
   - Não Mary... se eu tomar a dose toda vou ficar sonolenta e nem vou conseguir me arrumar. A gente vai sair às 18h, então a Karen vai chegar aqui às 14h para fazer a maquiagem e cabelo.
Já eram 11h da manhã e pensar que, em oito horas eu estaria em meu primeiro evento como namorada de Michael, me dava um frio na barriga... ele - e toda a família - já tinham passado a semana toda me preparando para a avalanche de críticas e especulações que se seguiriam. Minha própria reputação me preocupava? Sinceramente não. Ainda que eu nunca mais conseguisse nenhum trabalho artístico, já tinha conhecimento para trabalhar como assistente no showbussines e tinha feito bons investimentos imobiliários, conseguido participações em empresas do setor do entretenimento que estavam me trazendo uma renda bastante satisfatória. Sem contar os rendimentos pela minha participação em Thriller.
Mas era com Michael - sempre ele - que eu me preocupava.
Eu ia precisar estar impecável, visualmente e emocionalmente para aparecer nas fotos e filmagens, além de interagir com pessoas que eram apenas personagens para mim até pouco tempo. Mesmo como assistente de Michael, eu não saia muito dos bastidores, então até conhecia alguns, mas apenas por telefone.
Agora seria pra valer.
O retorno da imprensa após a minha declaração na saída do hospital foi relativamente boa. Digo relativamente pois as notícias era que os fãs tinham me adorado, e isso a gente conseguia ver nas cartas e flores que eu recebia. Eles me chamavam de "Anjo do Michael".
As revistas e tabloides, porém, disseram que eu "ofuscava" Michael com meu humor e desenvoltura, não combinando com um rapaz sério e tímido como ele.
Alguns programas de tv chegaram a dizer que eu poderia ajudá-lo a ficar mais à vontade diante da imprensa, enquanto outros diziam que eu não tinha o "pedigree"  ou a elegância de Brokie Shields e Tatun O'Neal.
Não havia uma pressão específica sobre isso. Frank e Jhon estavam "respeitando" minha recuperação, então eu pouco ouvia sobre eles. Michael sempre trazia apenas boas notícias, além das cartas e cartazes mais lindos que os fãs enviavam. Janet e Katherine diziam que eu deveria ficar tranquila, pois já tinha provado meu valor. Lá Toya dizia que eu nem deveria me preocupar.
O único que me trouxe alguma palavra mais contundente e sólida foi Joseph.
Desde minha chegada a Haveyhurst eu o tinha visto poucas vezes. Ele saia muito, cuidando de negócios, algumas coisas relacionadas à turnê dos meninos, ou algum tipo de influência no cenário musical, não sei bem, mas um dia em que Michael não estava, após almoçarmos, eu fui olhar os animais para esticar as pernas. Minutos depois ele chegou para dar comida às aves. Aparentemente a paixão de Michael pelos animais tinha sido herdada dele.
Joseph apenas parou do meu lado e perguntou:
    - E então Sarah? Preparada para ser julgada em praça pública?
Não era uma ameaça. Havia um certo sarcasmo e humor na pergunta.
    - Estou me preparando. Alguma sugestão especial?
Ele riu. Talvez não esperasse que eu fosse perguntar.
    - Os jornais certamente vão te comparar às ex-namoradas do Michael. Vão comparar sua aparência, idade, formação... esteja pronta para ver sua foto ao lado das fotos delas.
Era estranho como ele não queria se mostrar preocupado. Mas havia alguma razão para este tipo de conversa se ele fosse realmente neutro a isso?
    - Senhor Jackson, não pretendo interpretar um personagem para a imprensa, apesar de saber que não devo me expor totalmente. Mas, o que sugere? Imagino que tenha algum conselho.
Sim, ele tinha.
   - Meu filho é um gênio Sarah. Nunca gostei de dizer isso a ele pois acho que elogios demais deixam as pessoas acomodadas, mas o fato é que ele é tão incrível no que faz, que não sobra tempo para prestar atenção em mais nada. Ele se fecha para a imprensa, e isso deixa estes abutres livres para inventar histórias. Michael não consegue dosar sua exposição... mas acho que você pode ajudar. Seja esperta sobre isso. Ele precisa de alguém que faça essa dosagem para ele agora que...
     - Agora que o senhor não é mais o empresário dele?
Eu e minha boca enorme e minha sinceridade irritante. Acho que os analgésicos me deixavam com mais dificuldade para filtrar o que eu devia ou não falar.
Joseph me olhou quase com raiva, por alguns segundos, para em seguida dar um suspiro e voltar a falar, olhando as aves que se amontoavam aos seus pés.
     - É. Ele nunca entendeu. Principalmente ele. Sempre achou que eu os explorava. Sim, eu fui duro. E ele aprendeu a ser quem é por isso também. O talento, sem organização, sem foco, não resolve de nada.
Eu sabia que Michael tinha questões não resolvidas com seu pai. Sabia que Joseph era um ponto sensível em toda a família e por isso não me sentia à vontade para tocar nesta ferida. Porém, era preciso reconhecer a genialidade do homem por trás dos meninos.
Achei melhor não entrar neste assunto, e retornar à conversa original.
    - E o que o senhor me sugere?
Você tem um vínculo emocional com Michael, será bom se você ajudá-lo a olhar as questões mais práticas da vida. E pelo que percebo, você é uma moça esperta. Use esta esperteza para equilibrar a ingenuidade do meu filho.
As palavras "esperteza" e "ingenuidade" me deixaram confusas e eu não consegui não perguntar:
     - O que quer dizer com esperta?
Fiz o máximo pra manter meu tom o mais calmo possível.
    - Não me interprete mal. Você é uma sobrevivente não é? Criada em orfanato, se virou sozinha... tenho certeza que, se não soubesse se cuidar, estaria trabalhando atrás de um balcão qualquer. Tem muita gente inteligente de talento desperdiçado por aí. Meus meninos tiveram a mim para ver o talento deles e mantê-los na linha. Você se manteve na linha sozinha.
    - Talvez seja por isso que Michael seja ingênuo: sempre cuidaram de tudo para ele. - devolvi.
    - Sim, talvez. Mas não sei se há remédio para isso. Talvez faça parte da alma de artista dele, sei lá. Enfim, se quer um conselho, é este: tenha olhos de águia. Nem todos que sorriem pro meu filho, querem bem a ele.
Me virei, começando a retornar para casa e encerrando a conversa.
    - Sim senhor Jackson, sorrisos significam muito pouco em Hollywood.

Michael Jackson - E se... - lado AOnde histórias criam vida. Descubra agora