Off the Wall

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Quando chegamos a Haveyhurst, nenhum dos dois queria ir dormir, e ir para um local fechado, na tensão em que estávamos, não era nada indicado. O tempo não estava quente: ventava e o fim do inverno ainda tinha seus efeitos. Porém, estávamos tão contentes por tudo ter dado certo, e tão elétricos pelo clima de provocação instalado, que isso mal nos afetava.
- Você ficou com medo da gente brigar? Achou que eu ia fazer o quê? Arrancar os cabelos dela? - eu brincava, me referindo a mim e Diana.
- Sei lá! Vocês estavam soltando flechas pelos olhos, e sorrindo, o que era mais assustador! - respondeu Michael, enquanto nos sentávamos na área de churrasco, nosso novo canto preferido.
- Meu amor... nós mulheres temos um dom incrível: ameaçar sem dizer uma palavra, mas transmitir toda uma mensagem pelos olhos. Tenho certeza que ela entendeu meu recado. - expliquei, deitando-me na espreguiçadeira ao lado da de Michael.

Ele levantou de sua cadeira e sentou-se junto comigo, de modo que eu pude jogar minhas pernas no colo dele e ele encostou a cabeça na minha barriga.
- Já disse que nisso, vocês me assustam. - respondeu.
- Quem te assusta? Eu e Diana?
- Não. Todas as mulheres. Vocês conseguem disfarçar sentimentos. A gente é muito óbvio para disfarçar qualquer coisa. - respondeu, e eu entendi do que ele estava falando.
- Já te disse que sobre isso, tem coisas que não dá para disfarçar e nem fingir. É só ficar atento aos sinais.

Meus olhos estavam fechados. Até que senti as mãos de Michael deslizando em minhas costelas. Abri os olhos e arfei.
- Isso é um sinal? - perguntou baixinho.
- Sim, - respondi, tentando relaxar e fechando os olhos novamente - esse é um dos sinais.

Michael seguia acariciando a lateral do meu tronco, com dedos tão leves que era preciso me concentrar para sentir a suavidade do toque.
- Essa é a beleza das mulheres... a sutileza de vocês. É preciso ter um olhar atento para perceber. - respondeu, ainda com a voz grave, falando baixo.
- E acho que é por isso que você é tão atraente para as mulheres: você tem este jeito suave. Dá para perceber que é capaz de fazer essa leitura. Essa cara de menino perdido da Terra do Nunca só engana quem quer ser enganado. - analisei.

Michael se mexeu sob minhas pernas, de modo que ficou à minha frente, pernas em volta de mim, posicionando minhas pernas em volta dele.
Posição perigosamente tentadora.
Eu, semi deitada na espreguiçadeira, com os braços atrás da cabeça, estava entregue. Michael, sentado na minha frente, com as mãos livres, dominava a situação.
Ainda que a vulnerabilidade pudesse me trazer sentimentos e lembranças ruins, os olhos de Michael me traziam para o presente, não dando nenhum espaço para que meu cérebro retornasse ao meu passado. Eu estava capturada pelo seu olhar.
- Engraçado você falar de Peter Pan: é minha história favorita. - respondeu.
- A minha também, mas meu olhar para essa história sempre foi meio ambíguo.
- Como assim? - ele quis saber.

Eu nunca tinha falado disso com ninguém. Me sentia uma imoral por pensar daquele modo, mas ali, com Michael, não me sentia julgada.
- Eu sempre nutri um desejo pelo personagem do Peter Pan... um garoto que seria garoto para sempre, ousado, inconsequente... e a relação dele com a Sininho e a Wendy, a Terra do Nunca como um lugar cheio de aventuras e possibilidades... é pervertido, mas sempre me instigou. - revelei.
- Mas a relação dele com a Sininho é um paradoxo: eles são incompatíveis. - argumentou.
- Sim. E ela quer mantê-lo só para ela, mesmo sendo impossível ficarem juntos.
- E não permite que Peter fique com a Wendy, pois acha que ele iria acabar deixando a Terra do Nunca.
- Ou seja: para experimentar o amor, Peter precisaria deixar a infância, e a Wendy é a porta para isso. É a história de um garoto dividido entre o desejo e a possibilidade de uma vida, e um sonho do qual ele pode nunca acordar. - filosofei.

Ficamos em silêncio por alguns segundos, Michael ainda com as mãos sobre minha barriga, mas subindo e descendo-as pelos meus quadris, até que ele deu a solução que Peter Pan daria se JM Barrie permitisse:
- Ele devia ter convencido Wendy a morar na Terra do Nunca com ele. Viver uma vida de verdade no meio do sonho.
- Wendy deveria ter se arriscado mais e se entregado ao sonho de viver com Peter. - respondi.
- Talvez Diana tenha sido a minha Sininho. - disse ele, lendo meus pensamentos.
- E eu sou a sua Wendy, com a vantagem de não ter nenhuma família para onde voltar. Posso viver na Terra do Nunca com você pra sempre. - completei.

Michael Jackson - E se... - lado AOnde histórias criam vida. Descubra agora