(🎵 Bodysnatchers - Radiohead)
Não vi o meu pai. Isso era óbvio. Sai da casa do meu tio, com um sentimento estranho na boca do estômago. Era antes das quatro então se fosse para a pracinha com certeza Ceci e Nalu não estariam lá e apesar de me dar muito bem com a maioria dos rapazes, tinha sempre um que era babaca demais quando não estávamos juntes.
Era aquele lance de achar que podiam fazer graça por nos verem sozinhes. Isso era ridículo, mas não estava com cabeça para bater boca com excesso de testosterona.
— Nicole!
Parei antes da escada nos fundos do quintal e voltei o olhar para os olhos castanhos da minha avó parada no primeiro degrau da porta lateral da cozinha. Dona Clarice me olhou por trás das lentes redondas do óculos e sorriu toda amável com os cabelos grisalhos puxados para trás.
— Fiz aquele bolo de coco que você gosta. Vem! — apoiou a mão no batente da porta, entrando na casa meio devagarinho.
— Posso ou tenho que me preocupar com a Dandara?
Toquei no nome da minha prima por parte de mãe, recebendo um olhar sem afetos da minha avó.
— Ela não está em casa. — retrucou e adiantei os passos no degrau da cozinha.
Os azulejos antigos com flores em tons pastéis, me saudaram, junto com os armários em madeira branca e a mesa de quatro lugares em tom escuro. Minha avó arrastou os sapatinhos de tecido pelo piso em tom avermelhado, indo atrás do tabuleiro redondo na geladeira.
Toda acanhada, ocupei uma das cadeiras na mesa, deixando o skate encostado na parede.
— Eu queria ter te dado mais cedo, mas não vi você chegando. — insinuou, mas não retruquei. — Estava na escola? — perguntou e fiz um estalo interno com a língua enquanto Dona Clarice guardava o tabuleiro de volta na geladeira.
Tomou posse do prato com uma fatia do bolo gelado e se aproximou da mesa, deixando a porcelana branca com um garfo sobre o tampo à minha frente.
Poderia ter mentido para ela, mas a minha avó era a minha avó e naquela bagunça familiar, ela era tipo um bálsamo.
Observei as linhas de expressão sobre sua pele negra clara, vendo em todas as rugas, a sua história e os traços de uma geração de mulheres repletas de sentires.
Como a minha mãe, sendo sua filha, poderia ser assim tão diferente dela?
— E então?
Acomodou o corpo na cadeira, apoiando os cotovelos sobre o tampo de madeira, bem atenta ao meu rosto.
— Eu fui ver o meu pai. — Larguei a mochila no chão e tirei um pedaço da sobremesa deliciosa.
— Ah! — soou vago demais. — E viu ele?
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⚢| Eternas Canções dos Anos 90
Novela JuvenilNicole tem uma paixão e ela se chama Mabel Fernandez. A guitarrista da banda mais falada da cidade, despertou sentimentos no coração fatigado da skatista e agora, cheia de passado conturbado, Nicole criará coragem para se permitir amar quem te ama d...