CAPÍTULO 17: AMIGO

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10 de Janeiro de 2021 - 14:27

Eu não sabia quanto tempo havia se passado, mas eu queria não ter acordado. Era algo tão óbvio e eu nunca reparei, vô Antônio falando sobre Evoluídos, eu ser Daniel, me questiono o motivo de não ter notado nada disso antes, talvez eu tivesse conseguido salvar alguém se soubesse de alguma dessas coisas. Eu acordei por volta das duas da tarde e fiquei parado em estado catatônico, senti como se as coisas não fossem mesmo reais, como se realidade fosse apenas um jogo macabro de Deus.

Uma enfermeira veio e falou comigo enquanto eu permanecia olhando pro teto, ela disse que eu tive uma crise de abstinência de medicamentos e também uma grande crise de pânico generalizada causada pela exposição a situações extremas. Eu não sabia o que dizer ou como reagir, quando ela parou de falar eu sacudi a cabeça num gesto de que havia entendido e ela me recomendou ir a um psiquiatra para tratar mais casos de crise de pânico.

Após algum tempo a polícia veio, uma mulher com a mesma farda de um policial do estado Goiás usando um boné preto, sua pele era clara, ela era bem alta e esguia, o cabelo estava amarrado num coque e escrito na farda em seu peito estava: Clarissa Mendes. Ela me desejou boa tarde e começou a fazer uma série de perguntas clichês sobre o que havia acontecido e tudo que eu fiz foi contar a verdade, foda-se que era mais um crime inexplicável ou algo causado por alucinação, o filho da puta do Seis havia sumido de novo usando a merda de um poder sobrenatural, eu disse tudo isso e Clarissa claramente não acreditou em merda nenhuma, assim que ela saiu Bruno apareceu e entrou no quarto.

- Iai Victor - Ele vem na direção da cadeira ao lado da maca - Está se sentindo melhor?

- Já acordei, é um primeiro passo.

- Realmente, pra você é algo a se comemorar, já faz quanto tempo que não nos vemos?

- Um bom tempo - Eu olho enquanto ele se senta e noto que ele está usando uma blusa social azul escura, calça jeans e um sapato social preto bem engraxado - Tá bem vestido em, vai pra onde?

- Apenas a vestimenta de trabalho - Diz ele abrindo um sorriso, Bruno tem minha idade, é um pouco mais baixo que eu, tem o cabelo curto e liso, pele clara e olhos verdes - Tenho que parecer alguém sério quando estou trabalhando - Passam-se alguns segundos e quando o clima ia ficar pesado Bruno voltou a falar - Meu horário de almoço ainda está na metade e a enfermeira disse que você já pode ir, quer uma carona até seu carro?

- Eu aceito - Me sento na maca - Obrigado por ter aparecido na casa de Fausto essa manhã, acho que se não fosse por você eu ia parecer extremamente suspeito.

- Que nada, você é neto do grande Antônio Vicent, ninguém aqui te acusará de nada sem os devidos motivos.

Às vezes eu esqueço como meu avô era bem visto na cidade, e como as outras cidades não eram Aurora, às vezes as coisas funcionam como devem.

- Tem razão, mas mesmo assim eu devo te agradecer.

- Sinta-se agradecido - Eu me levanto e ele me acompanha - Além de tudo ainda tinha a filha de Fausto que serviu de testemunha pra tudo, então você está completamente limpo.

Completamente era uma palavra muito forte, junto a esse pensamento sinto uma pontada fina me afligir e eu me lembro de mais um morto por minha causa. Fausto, Jorge, Antônio; é estranho pensar como todos a minha volta estão caindo por conta desse desgraçado.

- O que vai acontecer com a filha do Fausto? - Digo enquanto acompanho Bruno para fora do quarto.

- Fausto tem uma família grande aqui em Poente, a filha dele ficará bem - Após passarmos por um longo corredor chegamos a um balcão com uma atendente e logo a direita uma sala de espera com a saída, seguimos na direção da porta e sinto o calor escaldante típico de Poente do Sul queimando meu rosto - Eu vi nas notícias que esse assassino foi o mesmo que matou seu avô e mais um amigo seu, qualé a desse arrombado?

- Eu sinceramente tenho a mesma dúvida - Seguimos em direção ao carro de Bruno e entramos, o calor é ainda mais intenso dentro do veículo - Na realidade eu não faço ideia do que se trata.

Eu num ato desrespeitoso, que faria eu tomar um tabefe de vô Antônio, ligo o rádio do carro de Bruno. Eu estava me afogando tanto em meus pensamentos que não conseguiria ficar mais um segundo sequer no silêncio

- Pode ficar à vontade - Bruno coloca as duas mãos em frente ao peito fazendo bico debochando de mim.

- Desculpa, é o hábito - Dou um sorriso de canto de boca - Pera aí, parando pra pensar, como você foi parar na casa de Fausto justo naquela hora?

- Minha tia mora na casa ao lado - Ele diz com um tom de voz calmo como sempre - Ela disse que você tava fazendo balbúrdia pra minha mãe por telefone e essa mandou mensagem pra mim, fiquei preocupado e fui verificar.

Eu fico em silêncio, já havia agradecido meu amigo por isso, por alguns instantes eu não me sinto mais tão sozinho.

Bruno ligou e acelerou o carro enquanto a rádio padrão de Poente do Sul tocava uma música um tanto quanto questionável, eu troco de estação até parar numa grande rádio AM que geralmente toca quando estou em casa, no exato momento em que parei nessa rádio a seguinte notícia toca:

"Os incidentes contra a família da garota nomeada Aíssa eram reais, após difíceis investigações da polícia foi descoberto que os pais de Aíssa foram assassinados por pessoas muito mais importantes do que imaginamos. A garota ainda diz que isso está ligado a algo muito maior, algo que ela chamou de Evoluídos".

Bruno aumenta o som no fim da notícia e diz:

- Seu avô costumava dizer coisas sobre isso, né?

Era tão marcante que até Bruno ficou com isso na cabeça.

- Sim, ele costumava dizer que pessoas sábias eram Evoluídos.

- Tem saído cada vez mais notícias sobre crimes inexplicáveis, e agora essa garota dizendo que tem uma instituição que matou seus pais - Posso sentir que Bruno falava sério de verdade - Ainda mais agora com o que aconteceu com você e Melissa, o cara encapuzado simplesmente desaparece, você acredita nessas histórias?

Eu sabia que eram coisas reais, sabia que tudo aquilo era de fato ligado a pessoas especiais e até pensei em mentir para Bruno, mas eu sabia que se pedisse com firmeza ele ficaria longe de tudo isso.

- Olha Bruno, você tem que me prometer que vai ficar longe de tudo isso e que esse assunto vai morrer aqui - Bruno assente com a cabeça - Bem, então...

Eu contei tudo a ele sobre Evoluídos, tudo que eu sabia, sem me aprofundar de mais e também não deixando nada muito raso e então Bruno respondeu:

- Entendi, e pra não me colocar em risco você vai me contar apenas isso?

- Exatamente.

- Está claro pra mim, prometo não me meter mais nesse assunto, mas tenho mais uma dúvida.

- Diga.

- Tem a chance das histórias de ter visto lobisomem do seu avô serem reais?

Ele dá um riso abafado e eu o acompanho dizendo:

- Não sei, mas provavelmente essa parte da história era mentira.

Bruno me deixou próximo a casa de Fausto, eu me despedi dele e antes de ir embora fiz uma transferência de uma quantia considerável de grana pra sua conta e disse:

- Assim que a poeira abaixar dá essa grana pra Melissa e sua nova família.

- Você continua extremamente bonzinho por debaixo dessa cara de mal

Eu sorrio e digo:

- É sério arrombado, fala que foi doação sua, não quero mérito

Ele assente, eu desço do carro, ele avança pela avenida e eu vou na direção do carro que aluguei na frente da casa de Fausto, falo com alguns policiais que ainda estão pelo local, vejo que tem muitos do lado de dentro da casa. Pego o carro e vou na direção da chácara.

Compro a passagem para ir embora de Poente do Sul no caminho para a chácara, ao chegar arrumo minhas coisas e desligo meu cérebro para não pensar em mais nada do que havia acontecido, assim que eu chegasse em casa eu iria entender o que seria essa pausa para as pinturas que Seis disse e entenderia a razão pela qual o Condutor queria falar comigo.

A Sexta PeçaOnde histórias criam vida. Descubra agora