10 de Janeiro de 2021 - 22:20
Logo após o Condutor ir embora eu voltei pra casa e esperei Fred, ele disse que queria me levar numa festa. Como sempre ele não perguntou muito sobre minha vida e eu também estava tentando afastar tudo isso da minha cabeça, então não falei muito. Ele marcou de passar na minha casa às dez horas, enquanto ele se atrasava eu estava com o rádio de vô Antônio ligado e terminando de preparar meu macarrão instantâneo. Eu sentia dentro do meu ser que ia beber muito hoje, então resolvi comer bastante pra não ter nenhum problema com meu estômago. Minha cabeça estava com tanta necessidade de relaxar que até pensei em fumar, coisa que eu não era muito fã, mas me podei, vi que estava emocionado demais, quase me senti com quinze anos quando bebi pela primeira vez, lembro que vô Antônio riu demais quando me viu chegando na chácara todo cambaleando na bicicleta, logo após me deu uns tapas e me banhou pois viu que eu não tinha condições nem de andar.
Eu sentia saudades de ser amado novamente, eu sei que esse pensamento foi realmente aleatório, mas eu sentia muita falta de ter alguém se importando comigo, eu só tive essa oportunidade com vô Antônio e talvez com Luiza, era uma baita carência minha. Ao pensar nisso me lembro que meu pai se sacrificou para que minha mãe "quebrasse o tempo" e me salvasse, enquanto ao mesmo tempo ela cuidava de outra criança que hoje quer um poder que eu possuo e nem sei usar.
Poder, rio sozinho, pensando nisso, essa porra funcionava exatamente como os desenhos, o primeiro que veio a minha mente foi os X-Men, o professor Charles Xavier em busca da inclusão pacífica dos mutantes na sociedade e o Magneto querendo impor a força dos mutantes sob os humanos normais, fiz um paralelo com o que Nalanda e Camila me disseram sobre o objetivo da Instituição do Condutor de "incluir" os Evoluídos na sociedade.
Esse momento pareceu uma eternidade, tomei um copo d'água e assim que terminei de comer o macarrão meu celular tocou com o nome de Fred. Eu nem atendo, desligo a ligação, o rádio e vou na direção da saída do meu apartamento. Chequei mais de uma vez se a porta estava realmente trancada, minha privacidade havia sido violada vezes demais pra eu deixar a porta aberta. Ao passar pela portaria vejo o porteiro magricela bigodudo, ele parece mais alegre agora, está digitando algo no computador e diz à mim sem tirar os olhos da tela:
- Boa noite Victor.
- Boa noite... - Me forço um pouco pra olhar o nome dele numa tarja presa ao peito da blusa - Tadeu.
Por nunca terem falado comigo, eu não sei o nome de nenhum dos dois porteiros.
- Tem uma encomenda pra você - Ele tira uma caixa dos pés dele - Foi uma moça que deixou aqui.
Eu pego a encomenda que é uma caixa retangular embalada em papel presente, eu rasgo na expectativa de ser uma bomba, não no sentido literal, mas com o que tem acontecido nos últimos tempos eu realmente esperava mais uma revelação bombástica na vida de Victor Vicent, ou Daniel Vicent, chame como quiser.
Eu me surpreendi positivamente porque não era nada do que eu esperava. Era uma caixa de chocolate amarela, lacrada e no topo dela havia um papel rosa escrito: Com amor Luiza Gomes. Meu coração se aqueceu, eu quase abracei a caixa e fiquei saltitando de um lado pro outro, mas tinha que manter a pose:
- Valeu Tadeu
Eu estendo a mão pra um soquinho, ele retribui e diz:
- De nada, tenho certeza que é uma moça de sorte.
Ele diz claramente bisbilhotando com os olhos o presente e o papel rosa, eu me sinto envergonhado, mas consigo internalizar o sentimento e estender um sorriso a ele.
- É, pode-se dizer que eu também sou alguém de sorte.
Após isso eu saí do prédio e fui na direção do Golf de Fred que estava estacionado do outro lado da rua com ele dentro acendendo um cigarro, eu estava perplexo pelo presente que havia recebido e estava com ele em meus braços como se estivesse segurando um bebê.
Ao me ver atravessando a rua e me aproximando Fred disse:
- Que porra é essa que cê tá segurando Roku?
Eu percebo a maneira que estou segurando a caixa e a pego com apenas uma mão ao lado do corpo enquanto passo por Fred pra poder entrar no carro; ao entrar eu digo:
- A Luiza me deu de presente.
- Luiza? Luiza? A mesma de sempre? HAHAHAHA já entendi - Ele ri pausadamente como um vilão de desenho animado - Hoje é uma despedida de solteiro? Ou você tá mole demais pra isso?
- Cala a boca Frederico Azinawa - Falei com tom sério pouco antes de soltar um risinho, vejo que ele ficou meio puto pois falei o nome dele completo - HAHAHAHA - Faço a mesma risada que ele e após uma pausa ele liga o carro - Ela tá grávida de um filho meu.
Fred cospe o cigarro deixando-o cair em seu colo, ele dá uns pulinhos até pegá-lo de novo, após isso ele fala:
- Que? Assim do nada?
- Foi como eu recebi a notícia.
- Entendi, por que não me falou antes?
- Tem acontecido muitas coisas nos últimos dias, prefiro não falar muito.
- É, eu prefiro não ouvir também.
- Que arrombado você é - Dou uma risada silenciosa.
Após um tempo andando pela cidade chegamos a balada, pude sentir o vento frio e úmido da cidade de Aurora batendo em meu rosto quando desci do carro, o clima estava parecido com o do dia que vô Antônio foi assassinado, era incrível como tudo se ligava a Seis em minha mente, eu tinha jurado a mim mesmo que seria mais egoísta e pensaria mais em mim mesmo.
Pare de pensar nisso Victor. Penso comigo mesmo.
Ao chegarmos na balada Fred entrou numa roda de amigos e eu fui junto como era de costume, comecei a ver um monte de mulheres bonitas vindo falar com ele. Eu normalmente daria em cima das mulheres, modéstia a parte eu era bom nisso, mas eu simplesmente não sentia vontade, eu passei a festa inteira pensando na Luiza e em como a gente poderia ter uma vida. As coisas começaram a pender em meus pensamentos para um lado em que ela era a única coisa que havia sobrado na minha vida.
Era realmente algo fofo e me impedia de pensar em qualquer outra mulher, mas esse fato não me impediu de beber, eu enchi a cara igual o Opala de vô Antônio e minha memória logo começou a se esvair, as coisas começaram a ficar confusas. Eu e Fred curtimos umas músicas eletrônicas, logo após um sertanejo de sofrência que fez Fred chorar, uma música meio romântica tocou e eu comecei a pensar ainda mais em Luiza.
Até que peguei meu celular e vi que ela havia me mandado mensagem, eu mandei uma resposta pra ela, não lembro o que exatamente, mas me lembro de ter mandado a localização e a mensagem dizendo: "cola aê"
Nem sei como consegui escrever, nem a razão de ter feito isso e como a minha noção de tempo estava estragada Luiza chegou em minutos na minha percepção de tempo. Vi ela brigando com Fred e vindo na minha direção, eu não resisti, fui pra cima dela dei um abraço ela falou algumas coisas no meu ouvido, eu olhei ela nos olhos e a beijei e foi o melhor beijo de toda a minha vida, pra mim nós nos casaríamos aqui e agora. A última memória que eu tenho foi dela arrastando eu e Fred pro carro dela e aí eu acordei em casa na minha cama com ela deitada do meu lado. Eu olho pra ela e toda aquela vontade de me autodestruir, tomar remédios pra ficar chapado ou usar qualquer tipo de droga se esvai e eu fico com vontade de estar ali até o tempo não permitir mais.
Eu estava apaixonado e até sobre isso eu menti pra mim mesmo durante todo o tempo, e meu filho que estava ali serviu para estabelecer e me fazer ver que ela era quem eu queria pra minha vida.
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A Sexta Peça
Mistério / SuspenseUm assassinato faz com que Victor Vicent comece a investigar um misterioso assassino em série nomeado como Seis, ele acha que com isso desvendará a morte de seu ente querido e encontrará paz, mas o que ele não sabe é que os assassinatos em série est...