REVELAÇÕES

181 9 16
                                    

Depois daquela noite inesperada no flat fiquei alguns dias sem vê-la, sem ter notícias dela, por dentro eu pirava por saber sobre seu paradeiro, por fora... eu fazia de conta que estava tudo bem, tudo normal. Por meus pensamentos passavam as ideias mais maculadas possíveis. Desde ela reatar com Israel, ela ter sofrido outra amnésia, bater com a cabeça no chão e sangrar até morrer. Meus pensamentos eram tão traiçoeiros comigo e eu sabia que eu tinha que afastar todo e qualquer pensamento ruim porque eu acredito fielmente que essas coisas atraem.

Eu estava distraída com uma planilha de resultados quando Eva interfonou para mim – Ellie, Sr.Scott na linha... – Naquele momento eu franzi a testa, não era muito comum ele ligar, era habitual conversarmos pessoalmente mas pelo telefone era possível contar com uma mão – Tudo bem, pode passar.. – Enquanto tocava para a transferência da ligação cogitei alguns assuntos dos quais ele poderia estar me ligando – Ellie!.. – Ouvi sua voz do outro da linha e minhas ideias dispersaram – Olá Sr.Scott! – Iniciamos aquela conversa cordialmente como é de se esperar mas sem muitas delongas ele já foi ao ponto – Preciso que você tome frente a outro projeto da EMG! – Tudo bem! - Foi o que eu disse brevemente e ele se estendeu – Eu tinha designado à Aster mas infelizmente não contávamos com seu desligamento e estamos remodelando a equipe do projeto – Desligamento? – Parecia que eu só tinha escutado aquilo, meu coração entrou em um descompasso e um silêncio impregnou entre nós – Sim... – Foi o que ouvi, era ousadia demais da minha parte perguntar o motivo e então aquela linha permaneceu em um breve silêncio – Hm... – Foi o que eu disse meio constrangida - ... Bom, sinto muito... – Eu soltei, sem pensar muito - ...Ela é uma excelente profissional... – Tentei consertar a minha ousada intromissão – Sim.. mas o jogo não pára, Ellie.. Então, espero contar com você... – Ele disse, detalhou mais algumas coisas sobre o projeto e disse que me mandaria mais informações por e-mail, encerramos aquela ligação e eu subitamente levantei-me e fui até Eva – Você já sabia do desligamento? – Ela se encolheu em sua cadeira – Eva!! – Eu a adverti – Desculpa, Ellie! – O que aconteceu? – Eu disse em um tom mais desesperador, eu realmente estava alterada e pude perceber como aquilo a chocava e me recompus – Desculpa, Eva... Eu não esperava por isso, não mesmo. – Ela...Ligou há uns dias, informando que não faria mais parte da empresa... – Ela foi suscinta – Só disse isso? – E ela me olhou de forma que questionava o que mais ela poderia esperar da ligação de Aster e eu voltei para minha sala em passos largos, peguei o celular e liguei para ela, não precisou chamar duas vezes para que eu pudesse escutá-la do outro lado – Oi Ellie! – Ela disse animadamente – Por que você fez isso? – Pude escutar um suspiro pesado do outro lado – Eu estou bem, obrigada e você? – Ela disse em tom de deboche mas ainda permanecia uma serenidade em sua voz – Aster! – Eu disse entredentes – Ellie.. – Ela disse e uma pausa silenciosa permaneceu entre a gente - ...Por que não almoçamos juntas hoje? – Ela sugeriu ainda amigavelmente e aquilo estava me dilacerando e eu suspirei, tentando me recompor – Tudo bem... – Eu disse ainda me recompondo, marcamos lugar e horário. Não consegui me concentrar o resto da manhã ansiando por encontra-la e entender o que tinha acontecido para que ela se desligasse da empresa, acabei saindo mais cedo para o horário de almoço, antes de encontrá-la, dei uma volta pelas redondezas, tentando colocar as ideias no lugar e supondo o que poderia ter feito ela sair da EMG, uma proposta melhor? Uma oportunidade de crescimento? Ela decidiu empreender? Mas por que ela deixaria de trabalhar comigo para trabalhar com outra pessoa? Era egoísmo demais isso? Ela não suportava mais estar comigo? Ela realmente achava que tinha sido um erro tudo o que aconteceu entre nós? Ela não queria saber de mim!? Por que ela sumiu!?

Eu havia me distraído tanto andando por ali e imaginando "n" coisas que ao chegar no restaurante a vi sentada esperando por mim, provavelmente eu estava muito atrasada, entrei rapidamente naquele recinto e sentei-me diante dela – Desculpa! – Eu disse um pouco ofegante e ela me lançou o seu largo sorriso que eu amo – Oi! – Ela disse animadamente – Oi! – Eu disse rapidamente, pegando o cardápio para ver as opções, permanecemos em silêncio enquanto eu escaneava todas aquelas refeições, eu não conseguia raciocinar nas receitas, eu queria fita-la e eu sabia que seus olhos pesavam sobre mim, eu estava em um estado de choque, eu queria conversar com ela mas ao mesmo tempo não, eu tinha medo do que viria, tive medo de saber do porque do desligamento dela, eu passava os olhos naquele menu, via as letras miúdas, fotos de alguns pratos decorados mas eu nem fazia ideia da especialidade que se tratava aquele restaurante, que loucura! – Vi seus dedos puxando o cardápio para baixo, a vi confusa e eu franzi o cenho – O que foi? – Argumentei – Estou aqui há um tempo dizendo coisas e parece que estou falando sozinha – Ela disse absurdamente irritada e eu me enrijeci ali – Desculpa! – Eu disse com a voz falha – O que foi? – Ela perguntou delicadamente – Eu que pergunto... o que foi? O que aconteceu para você pedir demissão? – Eu disse com um tom mais alterado e a vi se recostando em sua cadeira, a vi lançar um sorriso leve para mim – Você...vai sentir minha falta? – Ela me fitou firmemente – Como assim? Isso é alguma brincadeira? Achei que fossemos "parceiras de crime" – Eu disse entre aspas e ela gargalhou – "Parceiras de crime"? – Ela perguntou fazendo as aspas e eu ri daquilo também – Ellie!... – Ela disse pondo sua mão sobre a minha na mesa e eu me estremeci, só consegui fitar sua mão ali sobre a minha, um zumbido invadiu minha cabeça com aquele gesto, eu queria mais... – Ellie! – Ela me chamou quebrando aquela distração – Hm??? – Eu emiti e ela sorriu ternamente para mim – Senti sua falta! – Ela disse manhosamente e eu tive vontade de pular aquela mesa e agarra-la ali – Não mais do que eu de você! – Eu também disse manhosa e a vi soltar um sorriso derretido e senti seus dedos acarinhando o céu de minha mão, e foi como virar a chave numa fechadura, eu fui da irritação total para a mais pura calmaria possível – Aster... – Eu disse em um suspiro e a vi desviar seu olhar de nossas mãos para meus olhos - ...Eu decidi recomeçar. – Ela disse numa ternura me cortando e eu fiquei confusa, permaneci assim por algum tempo e ela soltou uma gargalhada, a vi se levantar e dar uma volta até ao meu lado, a vi puxar a cadeira para mais perto, eu poderia sentir os pelos de seu braço encostando nos meus e eu me sentia quente com aquela aproximação – Decidi que preciso fazer o que me deixa feliz... – E aquilo me deixou novamente confusa - ... Assim como eu preciso estar com quem me sinto feliz. – Dessa vez ela entrelaçou sua mão na minha – Ellie... – Ela disse quase em um sussurro e minha boca já estava seca, eu poderia jurar que via seus olhos marejados – Eu estou perdidamente apaixonada por você! – Ela disse com um misto de emoções que lembranças da nossa adolescência saltaram por minha cabeça e eu engoli em seco, eu sentia em meu estômago fogos de artifícios iluminando meu corpo, fazendo barulho, dançando por cada músculo do meu corpo, eu esperava pelo pior nesse almoço e eu não poderia ter recebido a melhor coisa a ser ouvida na vida, ela conectada de novo comigo, da mesma forma, como em nossa adolescência, é ela, é minha Aster Flores. Sempre foi ela, eu sabia, as forças maiores, as forças divinas e qualquer coisa que você possa acreditar, nos aproximou de novo, a trouxe de volta para mim. Desmemoriada e ali, diante de mim... sentindo as mesmas coisas novamente, como se fosse algo totalmente novo. Não me contive e a tomei em minhas mãos, peguei seu rosto com uma mão e selei nossos lábios, eu senti o gosto salgado das suas lágrimas em meus lábios e meu coração já estava fora de ritmo, apartei nosso beijo porque era muita emoção para mim, meus olhos estavam marejados também, eu só tinha vontade de gritar, gritar para todo mundo ouvir o quanto eu era a pessoa mais feliz do mundo, queria gritar para o mundo o quanto eu desejava tê-la comigo, o quanto eu amo aquela garota-mulher diante de mim e o quanto estive guardando todos esses sentimentos para ela, sentimentos esses que sempre foram dela, desde sempre para sempre. Não consigo descrever este amor.

The Half Of It - A História ContinuaOnde histórias criam vida. Descubra agora