Capítulo 12
A Fuga
Tauã observou o cangaceiro dar-lhe uma última olhada antes de sair da cabana em que deixara ele e Benedito amarrados, novamente, a uma estaca central.
Já era noite quando os cangaceiros decidiram fazer outra parada para descansar após passarem três dias viajando, sem pausas longas. As viagens sem descansos já eram o suficiente para causar um cansaço enorme, mas junto as condições em que dormiam ficava pior. Poucas noites conseguiram ficar deitados no chão irregular. Benedito sentira até falta da carne salgada, dissera para Tauã naquela tarde quando comeram algo novamente, antes dos cangaceiros obrigarem a eles a armarem as barracas e apagar a fogueira.
Tauã, observando o trajeto que fazia, percebeu que haviam subido mais e mais colinas. Era o motivo do clima estar menos seco devido aos ventos mais fortes. E o motivo das dores nas pernas de Benedito. Ele também sentira, mas não era algo que não estivesse acostumado.
— Devo lhe parabenizar pelo desempenho de hoje. Está se saindo melhor. — disse Tauã quando Benedito fechou os olhos ao se encostar na madeira a sua frente, no outro lado da barraca.
— Se sairmos vivos, — começou Benedito, com um sorriso sereno. — irei fazer questão de dizer que sou o melhor montador de barracas da região.
— Pode se gabar com facilidade, Senhor. — disse Tauã e sorriu também. — És o melhor, pois, quase nenhum dos senhores montam suas próprias barracas.
— Eu tinha que aprender algo, não? — inclinou a cabeça com uma reverência gentil e divertida. — Você tem ideia de onde estamos?
— Gostaria de acreditar que as colinas que subimos estejam nos levando para o litoral. — disse e suspirou, olhando em volta. A barraca já estava na cor da areia, que tinha um tom menos avermelhado. As madeiras da estrutura da barraca eram pouco mais grossas, retiradas das árvores com mais folhagens que no interior seco. Era sinal de que, o que imaginava ser a direção, estava certo. — Eu lembro um pouco da geografia de alguns estados. Posso não estar certo, pois faz bastante tempo.
— Quem te ensinou? — indagou Benedito. — Você chegou a estudar quando morávamos na capital?
— Não exatamente, Senhor. — disse com um suspiro. — É uma história pouco favorável para este momento.
— E quando sabe que haverá um outro momento? — indagou e deu de ombros. — Temos bastante tempo.
Ambos sorriram e Benedito encarou o olhar de Tauã. A expressão calma e cansada, o sorriso se tornava distante com o olhar que agora se direcionava para os cantos altos da barraca, em pensamentos.
— Fazia um ano que eu servia na Guarda Nacional, na província do Rio de Janeiro, e era uma manhã do final do ano de 1863, quando um novato chegou para ser um de nós. — disse Tauã. — Ele foi designado ao meu grupo por ainda sermos considerados novatos, e não fomos mandados para as Guerras que se iniciaram no ano seguinte com a Guerra do Paraguai.
"Treinamos juntos por todo o ano de 1864. Passei a me identificar mais com ele, até perceber que não era apenas empatia."
"O ano seguinte, 1865, fora de descobertas. Em um único momento da minha vida, senti que ele gostava de mim como eu estava gostando dele. Até termos uma confirmação disso. Cheguei a ir em um bordel, perdi minha virgindade com uma moça que conseguiu fazer com que me entendesse melhor."
"Durante 1866, nos aproximamos mais e passamos a ter um caso, as escondidas, obviamente. Nos meses seguintes, vimos a criação de um grupo formados por homens da Guarda Nacional que, naquele ano, estava mais fraca com o poder do Exército Imperial. Embora o Exército Imperial tenha sido de suma importância naquele período de guerras, a Guarda Nacional se tornava relevante por causa da unidades de Cavalaria Ligeira, pois a maioria dos corpos de cavalaria, eram da Guarda. Foi por causa disso que os regimentos se separaram e os Cavaleiros da Guarda Nacional criaram uma vertente chamada de Regentes."
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A Primeira Imperatriz
Historical FictionVicthana é escrava em um fazenda no sul do Brasil imperial, em 1880. Sobrevivendo a fome ao lado de sua mãe, nas senzalas, ela organiza uma fuga para o nordeste. Mas quanto mais ao norte, o dobro sofriam com a seca e as estiagens no sertão nordestin...