Capítulo 4
Histórias de Liberdade
No fim do dia, todas as tarefas haviam sido concluídas. As águas armazenadas, suficientemente enchendo mais da metade da cisterna que caberia mais de cinco mil litros de água. A menor das plantações de algodão tinha sido totalmente colhida e mais metade da maior delas. Os animais frescos e alimentados. Era hora de todos receberem suas refeições e descansarem.
Joaquim percebeu a luz de lamparina oscilar quando ele se direcionou ao espelho, logo que saiu de seu banho. Percebeu que logo aquela luz precisaria de óleo e desejou mentalmente que ainda tivessem óleo na fazenda, ou poderiam ficar no escuro.
Após vestir-se com uma calça, suas botas favoritas, camisa e colete, ambos de cores escuras, exceto pela camisa, arrumou seu cabelo levemente molhado para trás e saiu em direção a porta. Mas antes de sair do quarto, pela primeira vez, se preocupou com a lamparina e a falta de sua luz na noite seguinte. Sem hesitar, desligou-a e assim saiu.
Passou pelos corredores do casarão, desceu as escadas e foi em direção a cozinha, seguindo o cheiro de peixe sendo preparado ao fogo. Quando chegou no espaço bem iluminado viu várias mulheres, algumas distribuíam os pratos, outras já separavam as quantidades de comida. Havia outras que cuidavam da bebida e deduziu ser o suco das últimas frutas da estação passada. Embora não tivessem mais que o inverno e verão, as estiagens os deixavam sempre à espera das chuvas para cultivar as árvores frutíferas. No meio delas, haviam as cozinheiras e quando uma delas se virou, identificou facilmente a mulher que estava com Victhana, sua mãe. Os cabelos amarrados, os traços redondos e magros, vestindo um longo avental de cor clara, além do vestido.
Ele se direcionou para o enorme balcão ao centro da cozinha e sorriu para algumas das mulheres novatas, que logo pararam o que estavam fazendo para lhe dar uma leve reverência silenciosa.
— Não. Não precisam. — disse, rapidamente, acenando com a mão. — Continuem o que estavam fazendo.
Ele viu algumas das veteranas só perceberem sua presença depois do que falara e outras ficarem levemente surpresas, ou assustadas. Deu uma tapinha na pedra do balcão e caminhou até as mulheres no fogão, colocou as mãos para trás e observou a mãe de Victhana, agora mais de perto.
— O que está preparando além do peixe? — perguntou, a observando.
— São folhas refolgadas, senhor. — disse ela, sem o olhar.
— Usou todas nossas reservas de comida? — indagou, sentindo o cheiro da fritura do peixe.
— O suficiente para a refeição de todos, senhor. — respondeu hesitando.
— Está fazendo um ótimo trabalho. — disse e olhou as outras. — Todas vocês.
As mulheres ainda pareciam estranhar a presença deles ali. Quatro ou cinco delas, ele identificou, já eram desta fazenda. Suspirou e se voltou para a mãe de Victhana novamente.
— Como é seu nome?
— Luene. — disse, desligando o fogo e olhou brevemente para o homem.
— É um nome bonito.
— Obrigado, senhor.
— Luene. — repetiu, pensando. — Me lembra um continente diferente.
— É angolano, senhor.
— Isso. Angolano. — repetiu e colocou as mãos nos bolsos. — Vejo que sua mãe escolheu bem seu nome. E você também fez uma boa escolha. Sua filha tem um nome lindo.
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A Primeira Imperatriz
Historical FictionVicthana é escrava em um fazenda no sul do Brasil imperial, em 1880. Sobrevivendo a fome ao lado de sua mãe, nas senzalas, ela organiza uma fuga para o nordeste. Mas quanto mais ao norte, o dobro sofriam com a seca e as estiagens no sertão nordestin...