A Teoria dos Derrubados

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Tampou forte os ouvidos porque o simples acelerar da moto de Marola passando por ali todo amostrado pra chamar a atenção dela fez latejar a cabeça de Krystiellen.

Enjoada e incapaz de levantar pra fechar a janela, escondeu a cara numa das máscaras de dormir que trouxe de fora e achou na mesma cômoda onde dona Dita pôs um copo de vitamina de banana antes de sair pra missa, um santo remédio pra ressaca.

Foi vencida pela necessidade de abafar os sons externos pra ficar apenas com o eco de seus pensamentos remoendo a noite maravilhosa que poderia ter com Marcílio se não se guiasse pela razão de repudiar a ideia de ainda se atrair pela maldade em forma de homem.  Triste por não ter dado pra traficante, Krystal? Caô!

Tentou dormir e esse total escuro ajudou sua mente a reviver com assustadora precisão o que passou no colo dele. Sentiu ódio de ter gostado mais de umas poucas dedadas dele que da transa meia boca com o tal gringo em quem esbarrou novamente pouco depois de deixar o almoxarife. Puta que pariu! Era só o que faltava ter Marola na mente sempre que ficasse com alguém que não fosse no mínimo perigoso.

Filipe Ret tava certo de explanar a hipocrisia de quem diz querer caras calmos que nem sequer chamavam sua atenção.

Desistiu de dormir e pra calar a fome matou a vitamina. Quis vomitar, mas nem isso conseguiria com a cabeça explodindo. Bendita fosse sua avó que deixou paracetamol perto da bíblia aberta no famoso salmo 91 e nem os riscos da automedicação superavam o de sentir saudade de estar nos braços endiabrados dele.

Mil poderão cair ao seu lado; dez mil, à sua direita. Krystiellen seguiria atingida pela onda dessa Marola.

Frustrada, tirou e jogou a máscara bem longe. Ponta dos dedos de baixo pra cima em esfregando do queixo ao nariz de onde saiu um suspiro irritadiço. Droga de fogo no rabo, aliás, tomara que não passasse disso pois já era problemático por si só fantasiar com a pegada dele em pleno banho, quem dirá sentir coisas mais complexas. Será que sair de casa e ver gente diminuiria esse peso? Assim que o remédio fez efeito, meteu o pé pra rua.

Passou na padaria pra comprar biscoito, salgadinho e refrigerante pra afogar as mágoas com as amigas, envergonhada pela sensação de que todos sabiam de seu envolvimento clandestino com o patrão dos caras que nem se atrevíam a olhar para ela por medo de irritar Marola. Melhor assim porque de traficante na cola já bastava o chefe. Somente acenou para Gracinha e perguntou se ela viu as gêmeas de quem se perdeu no baile.

— Mimi tava dormindo quando eu fui deixar Tória, mas Celly tá acordada já. Até perguntou se eu tinha te visto, pelos motivos que a gente já sabe.

— Aí, Gracinha. Assim eu fico sem jeito... Ele tá muito puto comigo?

— Um pouco, mas nada que leve pro coração não. No fundo, até ele sabe que tu tá certa em ter medo. Agora vai lá que né hora de mulher direita, capa da Vogue, tá trocando lero com traficante em plena luz do dia. Deixa pra próxima oportunidade e com outro trafica.

— Gracinha! – Krystal censurou sob os estalos implicantes de Maria.

Catou o pedido, agradeceu as informações. Desceu em tempo de ver Marcelly se despedindo da última cliente, contando os ganhos da progressiva.

— Volte sempre, meu anjo. – acenou pra moça, depois pra amiga. – Qual foi, Ellinha? Entra aí.

— Fala só um pouco mais baixo, por favor? Eu tô morrendo de dor de cabeça. Cadê a Mimi?

— Gracinha devolveu Victória hoje cedo e desde então as duas estão brincando de soneca. Ganha quem dormir mais tempo, é mole? – Krystal riria não fosse a enxaqueca.

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