Patrick nunca foi muito chegado em simplicidades.
Sua tag artística, Kicko, se inspirava nas comparações entre ele e o mimado personagem de Chaves, mas isso ficou no passado.
Há poucos meses você o ouviria largar discursos problemáticos sobre pobreza, crime e drogas. O tipo de cara meio esnobe e prepotente jurando ser imbatível, bom demais para cair em armadilhas desse tipo, afinal todo mundo pode se controlar, certo? Poderia parar quando bem entendesse, não? Baita equívoco!
Vício se mantinha como um tabu, uma ideia distante até acontecer entre os nossos conhecidos, na nossa família... Com a gente? Nunca!? Ainda mais quando se é bem afeiçoado e criado. Bonito, loiro, olhos claros e bom porte, o típico padrão. Artista, conhecia o mundo, as piores pessoas e sempre teve a cabeça, ó, forte! Ninguém olhava pra um cara como ele e o imaginava como dependente químico, nem mesmo ele.
No fundo do poço, Patrick enfim conheceu a humildade.
Carreira internacional, fama. Bons roles e amizades poderosas. Passou da fase de culpar as companhias pelo tombo, mas ainda remoía o arrependimento de fechar com as pessoas erradas. Através deles, foi apresentado à neve que soterrou seu auge, seus bens, sua fé, tudo. De sobre apenas a casinha simples de São Cristóvão, escriturada por sorte no nome da mãe, e de onde o pai o expulsou por não aguentar mais ter que repor os móveis levados pela cocaína quando Patrick já não possuía mais o Jeep Compass, nem o apartamento em Botafogo. De filho prodígio à vergonha da família, essa humilhação foi o gatilho derradeiro para conhecer nas ruas o limite da dignidade humana.
Na Cracolândia se desprendeu de todas suas noções alienadas sobre o mundo se um dia enxergou os viciados como conhecer entre eles muitos outros como ele próprio com o nome sobrenome e estrutura de vida boa até pararem sob as garras do vício. A ideia simplória de mantê-los como páreas sociais, alienados a sociedade de bem, enxergá-los todos como vadios fracos refém dos próprios prazeres como se alguém gostasse de perambular ao relento perder a noção de tempo higiene e da própria vida. Correr perigo entre os iguais sempre sedentos por uma confusão ou uma forma de conseguir uma nova dose, fugir da polícia repressora, do desdém dos moradores e comerciantes próximos tão cansados dessa baderna à porta e dos maldosos à espreita do sono dos miseráveis para aplacar neles sua maldade.
Incontáveis vezes escapou da morte só por optar dormir em uma calçada diferente. Outrora raivoso e problemático, chegou a ser barrado em muitos abrigos e albergues por conta das discussões acaloradas onde disputava o básico como lençóis ou itens de higiene. Com banhos contados naquele época, hoje sim valorizava um simples chuveiro pifado, um perfume miniatura de péssima fixação comprado a prazo por catálogo e uma escova de dentes pra usar quando bem entendesse.
Recuperado graças a insistência de um grupo de missionários. Ateu no Deus dos cristãos e no próprio poder de salvação, chegou a odiar os insistentes religiosos que aproveitava a entrega de marmitas para se não o resgatasse para os braços de Jesus, ao menos o convencer a vencer a luta contra o crack. Kicko continuava tão sem fé quanto antes, mas os esforços da Evangelista Mayara Guerra não foram todos em vão. Internado voluntariamente em uma instituição mantida pela igreja onde a célebre cantora gospel congregava, se viu liberto e confiante, celebrando cada segundo longe dos vícios e, mais recentemente, da fissura responsável por seus vários impulsos de recaída superados com bastante perseverança.
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A Teoria do Corre
RomanceKrystal largou tudo e todos no Morro do Cabo pra trilhar uma carreira brilhante como artista plástica no exterior. Retornando após 10 anos com o desejo de montar uma escola de artes na comunidade, ela precisa buscar a permissão da facção local, um p...