Capítulo Doze

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“Maya, tentei te ligar mas você não atendeu. Por favor, me ligue assim que ler essa mensagem. Zacharias e eu conseguimos.”

Quase caio da cama quando leio essa mensagem. Hanna se move ao meu lado, se espreguiçando, enquanto eu leio a mensagem pela terceira vez.

— Ei, bom dia. — ela se enrosta em mim assim que eu solto o celular.

— Bom dia, bom dia. — respondo-lhe com empolgação.

Hanna afasta o rosto do meu pescoço apenas para me olhar com mais cuidado.

— Desculpe, eu perdi alguma coisa?

— De forma resumida, sim.

— Nada de forma resumida, quero a parte longa... seja lá do que se trate.

— Podemos fazer isso enquanto comemos? Acabei de me lembrar que não como tem mais de quinze horas.

Hanna me estapeia de repente. Arregalo meus olhos para ela, mas quando seu olhar duro se fixa em mim, não ouso reclamar, ou ao menos falar algo em minha defesa.

Me enrolo no lençol e saio pegando minhas roupas pelo chão enquanto escuto o som da água da torneira caindo. Visto-me perante o tempo que ela gasta escovando os dentes. Quando termina, vem diretamente até mim e me beija sem presa.

— Me prometa que não ficará mais de três horas sem comer.

— Ou o quê?

— Ou eu soco a sua cara.

— Isso é um pedido? Parece uma ameaça. — dou um breve riso, achando graça de sua expressão ameaçadora-barra-preocupada.

Hanna, pelo contrário, não acha muita graça.

— Maya, me prometa.

— Ok. Eu, Maya Collins, filha legítima de Charlotte e Daniel Collins, prometo a Hanna Morris, filha única de Cláudia e Richard Morris, jamais ficar mais de três horas sem comer, a partir de hoje. — entrelaço meus braços em seu pescoço e vejo seu sorriso se abrir. — Feliz?

— Não precisava levar tão a sério. Mas sim, estou feliz.

Eu sei, e é por isso que beijo o canto de seu sorriso para só então sentir um medo de ter esse momento interrompido. Não quero que nada dê errado. Quero que todas as coisas que dizem respeito a nós, tenha pressa em dar certo. Preciso que dê certo, não posso ficar nem mais um dia longe disso, dessa paz que Hanna me proporciona.

Esperei dez anos para ser feliz, agora que experimentei o gosto dessa felicidade, não abro mais mão dela.

— Meu amor por você vai acabar me matando, sabia? — digo pra ela.

— Se não me matou até agora, não matará mais. — Hanna de repente franze o cenho. — Acabei de me dar conta que você traiu seu marido, legalmente falando.

— Acredite em mim, Zack não se importará. Tenho mais chifres na minha cabeça do que você imagina.

— Zack trai você?

— Trair é uma palavra muito forte. E, além do mais, eu não me importo, legalmente falando e não-legalmente falando também. Pelo ao contrário, gosto que ele e Henrique se deem tão bem.

Hanna pisca.

— Henrique?

— Sim? — quê? — Vai me dizer que você nunca percebeu?

— Henrique e Zacharias?

— Sim, amor. Está tão óbvio.

— Nunca imaginaria, na verdade nunca passou pela minha cabeça que Zacharias poderia não ser hétero.

Reviro os olhos de brincadeira.

— Só não culpo sua lerdeza porque agora você me tem ao seu lado para te dizer o óbvio. — beijo o ponto entre suas sobrancelhas.

— Ainda bem mesmo. — me dá uma piscadela antes de se afastar, me puxando em direção a cozinha. — Podemos voltar ao que estamos conversando?

Estou pronta para lhe perguntar do que ela está falando, mas então lembro-me da parte não-resumida que prometi lhe falar. Portanto, de forma não-resumida eu lhe conto sobre a nossa nova estratégia para nos livrarmos de Caio e Álvaro. Hanna escuta tudo com atenção aos mínimos detalhes, como uma criança conhecendo o alfabeto pela primeira vez. E eu a conto tudo, desde o plano ao que eu passei em Bariloche desde que cheguei, há cinco anos atrás.

— É assustador pensar que eu ficava imaginando onde você estava mas nunca me perguntei se você estava bem.

Dou de ombros enquanto termino de mastigar.

— Eu te deixei de forma superficial, então é compreensível.

— O que é compreensível? — questiona um Thomas de calça moletom cinza, camisa branca, cabelo bagunçado e cara amassada.

Hanna e eu murmuramos um “nada demais” ao mesmo tempo, nos olhamos brevemente para só então voltarmos a atenção a ele.

— Estou péssimo. Passei a noite inteira ouvindo Holland falando sobre as letras do alfabeto.

Repasso mentalmente o nome de “Holland” até lembrar que pertence a um de seus filhos.

— O que tem demais? É saudável. — diz Hanna e eu concordo.

— Não quando ele acha que o “a” e o “b” eram casados e se divorciaram porque “b” se apaixonou por “c”. — ele faz uma pausa. — Que tipo de criança pensa isso?

— Eu achava que português e matemática eram casados. — digo, terminando de beber meu café. — É normal, não se preocupe.

— Normal? Quer dizer que meu filho vai ser igual a você? — finge indignação enquanto me olha de cima a baixo. — Não, obrigada.

Jogo um pedaço de pão em sua cara enquanto ele tenta não ri. Reviro os olhos para ele, mas no fundo, estou adorando. Thomas está mais leve, e isso é o que importa.

— Isaac e Jackson onde estão?

— Dividindo o quarto ao lado.

Assinto e, internamente, até prefiro que Isaac e Hanna não dividam uma acomodação. De forma boba, é claro. Ainda não me encontrei com ele desde que descobri, e não sei se ele sabe que eu sei. Não sei como vou reagir.

— Acabei de me lembrar que preciso falar com meu primo sobre uma coisa. Volto já.

Hanna me observa saindo da mesa com o cenho franzido. Imagino que esteja pensando que me incomodei com a menção de Isaac, mas não.

Deixo-os na cozinha e sigo até o quarto. Meu celular está com pouca carga, portanto o conecto ao carregador e mando uma mensagem.

“Não posso te ligar, mas, por favor, me diga que tem boas notícias.”

Me sento no chão. Onze minutos se passam até que ele me responde.

“Relaxa, tudo certo. As imagens são nítidas e acabei pegando o momento exato que ele te bateu!”

Suspiro em alívio, mas ainda não acabou. Ele me manda outra mensagem:

“Henry e eu estamos indo agora na empresa, já que é nesse horário que eles ficam fazendo planejamentos e avaliando projetos.”

“Acha que vai ser fácil chantageá-los?”

“Óbvio que não! Mas conseguiremos. Tem grandes chances de deserdarem Henry e eu, mas poderemos, pelo ao menos, viver em paz.”

Leio aquelas mensagens novamente e fico feliz por Caio não ter poder para me deserdar, pois já tenho vinte e dois anos e meus pais deixaram a minha herança em suas mãos até que eu fizesse dezoito.

“Me mande notícias quando terminar.”

“Certo, pode deixar comigo”

“Zack? Tomara que tudo dê certo e que possamos nos divorciar e dar o fora daqui logo.”

“Maya? Sua vontade de se separar de mim é admirável.”

“Vá a merda.”

Sorrindo, deixo meu celular de lado e sigo até a sala. Quando ergo meu olhar, vejo Isaac e Hanna conversando.

Pigarreio para que eles me notem ali e não achei que seria tão constrangedor o ver. Mas está sendo.

— Posso conversar com você lá fora? — não espero sua resposta, apenas sigo para a porta, a abro e deixo que ele passe primeiro.

No corredor, cruzo os braços assim que fico cara a cara com ele. E, convenhamos, a minha cara não está muito boa quando fito seus olhos.

— Em qual parte do seu corpo eu devo te dar um murro? — o pergunto.

Isaac pisca.

— Tecnicamente — ele começa a barba por fazer enquanto finge pensar. —, de nós três, sou eu o agressivo.

Seu cinismo me faz fechar os olhos com força, me segurando de todas as formas para não estrangulá-lo.

— Isaac. — rosno. — Agora não.

— Ei, por que tá tão brava? Porque eu dormi com a Hanna, obviamente. Não significou nada.

— Significou pra mim, porra!

— Você nem tava no ato.

Atravesso o corredor e coloco minhas mãos em sua nuca, os dedos entrelaçados. Isaac arfa e se curva quando sente meu joelho colidindo com seu pênis.

— Consegue continuar sendo o engraçadinho agora?

Com o rosto vermelho, ele responde:

— Você ficaria impressionada.

Cruzo meus braços e me encosto na parede, esperando que ele se recupere. Isso não demora muito a acontecer, e cinco minutos depois Isaac já está me encarando de novo, mesmo com as mãos nos joelhos, pegando apoio.

— Eu tava chapado, ok? Não estava pensando direito. — abro a boca para rebater mas ele me interrompe: — Mas não importa. Não há justificativa que corrija o que aconteceu.

— Pelo ao menos entende isso.

— Posso ao menos pedir o teu perdão?

— Não, você não pode.

— O quê? Então por que perdoou Hanna? Ela também estava lá, sabia? Isso não é nada feminista da sua parte.

Coloco minhas mãos em meus joelhos e inclino meu corpo para a frente, ficando cara a cara com ele.

— Hanna não era nada minha, poderia transar com quem quisesse e eu não ficaria chateada. — faço uma pausa, sentindo meus olhos começarem a embaçar. — Mas você, Isaac? Você era meu melhor amigo.

Seus lábios se separam um pouco quando as palavras saem da minha boca. Recupero minha posição anterior com os braços cruzados.

— Tem alguma resposta engraçadinha agora?

Isaac endireita o corpo e encosta sua cabeça na parede. Em seus olhos eu vejo tanto arrependimento que quase me atinge. Quase.

— Eu sinto muito, Maya. Sinto mesmo.

— É, eu esperava que você sentisse mesmo. — dito isso, eu lhe dou as costas e o deixo ali com deu arrependimento.

Te Esperar Valeu A Pena [Clichê sáfico✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora