5. Roselin

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Como de costume, a rainha passava calor dentro das paredes do castelo real.

Em seu lar natal, no castelo Casa da Geada, o clima era totalmente diferente. Eles não tinham as águas fervidas para irrigar suas camas e chão para mantê-las aquecidas. Era o oposto daquilo, na verdade, porque as terras mais ao sul do reino eram banhadas pelas frias correntes do indesejado irmão Rio de Gelo.

A vida longe da cidade real era menos luxuosa do que a que tinha ali. Ainda assim, Roselin sentia falta da sua casa. Da simplicidade com que viviam lá, mesmo entre os nobres, na busca por sobreviver ao inverno. O que os aquecia no Casa da Geada era o calor da união humana, não o Rio de Fogo que banhava o sempre mofado castelo Quedaquente. A umidade a incomodou por estações a fio, desde seu casamento, e mesmo depois aquilo continuava a importuná-la todos os dias. Ela detestava a sensação, mas viveu em paz como pôde, como uma farpa doída no dedo que o tempo fez se aceitar.

Com outras coisas, entretanto, nunca seria capaz de se acostumar. Casada com o terceiro e último filho do falecido Rei, nunca tinha pensado em ser um dia a rainha da Terra Baixa. Havia sido antes uma lady qualquer de terras escondidas na neve, despreocupada com aparências e cortes. Quando a garota sonhava em ter uma família, como qualquer outra que cresce amando a mãe que lhe cuidou, não imaginava que teria uma que precisasse colocar os deveres acima do amor.

Foi a família que ela construiu a medicina que manteve-a saudável tão longe de casa. Por isso, enquanto trançava os longos e dourados cabelos da filha para arrumá-la no dia de conhecer seu futuro homem e partir para segui-lo como esposa, a mulher se sentia mais próxima de perder a sanidade.

Ao marido. agora chamado Rei Eddiemund ela aprendeu a ter amor, mesmo nada sabendo dele antes de casar-se, mas pelos filhos ela era incondicionalmente apaixonada antes de tê-los nascidos do ventre. Seria doloroso entregar qualquer um deles mesmo antes, apesar da rainha conhecer bem os deveres de uma mulher, mas depois da profecia aquela ideia se tornou ainda pior. Quase insuportável. A ameaça pairava no ar, embora camuflada em discursos pomposos, e a cabeça da mulher era diariamente consumida por aquela escuridão.

Todas as noites a rainha sonhava com a bruxa amaldiçoando-a. Suas palavras ainda se perpetuavam na cabeça da mulher como um mantra prestes a se fazer verdade diante dos olhos dela. Tão logo entregue em matrimônio, sua filha haveria de partir para longe da família, rumo ao norte para terras desconhecidas de outro reino. Tal como havia sido proferido no fatídico dia, aquele seria o grande estopim. Roselin parecia ser a única que ainda temia aquele destino. O reino comemorava com alegria as festividades que viriam junto ao casamento.

Celes, a filha mais velha, não se cabia em alegria enquanto esperava pacientemente a mãe cuidar-lhe dos cabelos. A princesa estava radiante com o que a vida ainda tinha para lhe dar, inocente em suas encantadas expectativas, e a mulher não a repreendeu pelos seus próprios temores.

Eram diferentes fisicamente, a filha com o loiro do pai, enquanto a rainha tinha cabelos castanhos escuros igual madeira molhada que eram modestamente presos em um coque. Embora fosse assim, a mãe via o quão eram parecidas quando tinham a mesma idade. No desejo jovial de conhecer o amor, por exemplo, ou na crença de que viveria melhor depois dele. Não cabia à ela questionar o casamento para a filha, tendo sido assim definido pelo conselho, então deixou que os sonhos falassem mais alto que a realidade.

Na avoada cabeça da jovem prometida não haviam profecias ou perigos. A princesa só se preocupava em estar bem apresentável para o seu futuro marido. Quando a rainha terminou com a trança, Celes mal esperou a mãe dizer algo para se levantar de sua cadeira e se contemplar no espelho do seu quarto. Ela usava um longo vestido acinzentado com a ursa coroada bordada em linha branca no colo. Era justo e se alargava no fim, estendendo seu fim em uma cauda quase cerimonial. A mãe trajava-se semelhante, com as mesmas cores e símbolo, embora fosse mais discreta em seu decote.

O Rei dos ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora