6. Dizem as más-línguas

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_ Excelência,  esse homem... _ Mile aponta para Gordon, vociferando, aos prantos, numa sala de audiências. _ esse homem é um assassino. Olhe para ele, excelência, é um assassino!  

Acorda com o próprio som.

Levanta a cabeça de cima da mesa, uma linha de baba descendo  no canto da boca.

_ Meus Deus, o que foi isso? _ Sandy pergunta, abrindo a porta da sala de Mile, segurando a pasta rosa por cima da beca florida, que cobre a barriga de oito meses.

Mile consulta o relógio no pulso imediatamente. O coração disparado.

_ Meu Deus!

Levanta-se num pulo quando percebe que o horário de almoço acaba em cinco minutos. Ajeita a saia jeans no quadril.

_ Acho que eu dormi. _ Ela ri de si mesma. _ Obriga por me acordar, Sandy. E... desculpa pelo susto.

_ Imagine. O horário de almoço é a melhor hora para dormir.  

 A mulher diz, num sorriso cuidadoso, empedrado, o tipo que Mile anda lidando bastante nos últimos dias.

Sua mãe está presa. O país inteiro já sabe, possivelmente. Isso por causa da ligação da prisão  com o célebre caso de Jorge Zanella. A mídia anda falando bastante do assunto, ultimamente.

_ Bem... Agora eu vou nessa! Ah! E se você precisar de alguma coisa...

_ Eu sei. Corro para você. Obrigada de novo, Sandy! 

Mile lhe faz uma continência. Em seguida, reboca-se ao banheiro. Lava o rosto com a água morna, uma parte da mente ainda presa ao pesadelo.

Não é a primeira vez que algum fragmento do julgamento de Jorge se manifesta através de um sonho, mas é a primeira vez que invade um cochilo de dez minutos, e durante seu horário de trabalho.

***

Mile consegue dar uma fugida do trabalho para visitar Elza no fim da tarde.

Enquanto a mãe lhe conta alegremente sobre o fato de ser tratada como um celebridade lá dentro, Mile absorve seu riso forçado para o fundo da garganta. E tem muita coisa acumulando-se ali. Muita coisa... Talvez por isso esteja trocando a saliva de minuto a minuto.

Mile não suporta. Simplesmente não suporta mais. Tem vontade gritar, quebrar a cara do policial que fiscaliza Elza como se fosse uma criminosa, como se ela pudesse pular as pequenas janelas na parede, ou peitá-lo para correr feito louca pelo corredor.

Não suporta. Não suporta mais. Mesmo assim, sorri para Elza. Um sorriso que equivale a um pedido de desculpas. 

Em seguida, simplesmente sai, sem dizer uma palavra.

***

São quase oito da noite.  Mile está a alguns metros de chegar a casa quando o celular vibra no porta-copos do carro. É um número estranho. Nada obstante, atende, desacelerando, segurando o volante com uma mão.

_ Senhorita Milena. Milena Zanella?

Sempre que ouve seu sobrenome na voz de um estranho, tem a desesperadora sensação de que algo ruim vai acontecer, a exemplo da própria prisão. Sim, certamente é a próxima Zanella a descobrir que tem uma quantia milionária guardada numa conta secreta: o próximo passo para o compartimento secreto mais abaixo do fundo poço.

_ Senhorita Milena Zanella? 

É uma voz masculina amigável, de um homem entre 40 e 50 anos.

_ Pois não? 

Certo como Murphy (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora