18. Pode sair se quiser. Se quiser...

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Já faz um tempo que o braço de Nathan só se move da borda da SPA para alcançar a garrafa de uísque. Também já faz um tempo que uma espécie de tremor vem e vai em suas sobrancelhas retas, toldando a inexpressão profunda de seus olhos, fincados no tronco do coqueiro, do outro lado do pátio, o polegar resvalando lenta e insistentemente no próprio queixo.

Seu peito move-se num ritmo lento, quase morto. Mas de repente, algo se sacode dentro dele. A boca ameaça um riso, que pode ser explicado pela piada declamada pelo rapaz à sua frente, no centro, o rapaz que está claramente intencionado a chamar a atenção de uma garota, a de pele marrom, cuja beleza é paralisante, inebriante.

Minutos depois, os dois homens e as cinco mulheres cantam "Cheia de Manias" com suas vozes carregadas de álcool, enquanto a água massageia suas costas na SPA de dez assentos.

O rapaz sardento ao lado oferece um cigarro a Nathan, que leva um tempo para negar. E o faz silenciosamente. O Volgone aproveita a mão que levantou para guiar a garrafa de volta à boca.

Meia hora depois, o sol se põe e as luzes ao redor se acendem automaticamente. Nathan protege os olhos com a mão, como tivesse acabado de sair de um quarto escuro. E logo uma moça de olhos orientais, possivelmente a mais jovem de todos, propõe-se  desligar alguns refletores. Nathan aponta o caminho para ela, meio na dúvida, como se não conhecesse suficientemente a própria casa. E ela vai deixando um rastro de água no chão, até o painel, ao lado da pia de mármore.

Quando ela volta, senta-se ao lado de Nathan. O rapaz de bigode agora imita a voz e a expressão de alguns cantores sertanejos, espalhando mais algum risos que, dessa vez, não fazem nem cócegas no humor do Volgone.

_ Você está mal, né? _ A moça pergunta a ele, alcançando a garrafa de uísque por cima dele. Bebe um pouco. _ É por causa do acidente horrível na rua da sua casa, na noite passada?

Ele a ignora. Alisa, reticente, o próprio lábio inferior com o polegar. Seus olhos de repente se deslocam para a moça de cabelos pretos e olhos salientes, no outro lado da SPA. Os dentes pequenos e achatados dela se exibem numa gargalhada despretensiosa, reagindo às gracinhas do rapaz de bigodes.

Às vezes as mãos finas e amareladas dela espalham os cabelos quase secos sobre a cabeça. Poderia ser considerada bonita se não fosse o nariz grande com um calo no meio. E certamente por isso, a moça de olhos orientais parece desafiada a desvendar os mistérios por trás do súbito fascínio do Volgone.

_ Você a conhece bem? _ Ele pergunta, os olhos regelados na moça do outro lado, que ainda não notou o fato de estar sendo incisivamente observada.

_ Se eu conheço quem? _ Pergunta, mesmo sabendo a resposta.

_ A de cabelo curto no pescoço.

A moça ao lado de Nathan age como se não pudesse acreditar,  estreitando os olhos para o rosto sólido dele, que começa a concentrar uma quantia medonha de sangue.

_ É óbvio que sim _ Ela responde. _ Ela estuda comigo na faculdade. Você sabe. Vocês até conversaram um pouco hoje.

_ Hummm...

Nathan vira mais um gole, enquanto volta a mirá-la. 

_ Sabe se ela poderia ter algum interesse em mim? 

A boca da moça se abri num riso confuso. 

_ Hã... É, eu acho que sim _ Ela responde. _ Vocês já se pegaram uma vez, numa das suas vindas ao Brasil. 

O riso nasal de Nathan é um declaração bem clara de que absolutamente não se lembra, ou... talvez... simplesmente ache graça da própria pergunta, como se só então entendesse o quanto é irrelevante, já que, com certeza ele é o tipo que adora o desafio da conquista. 

_ Aliás, você não está... _ A moça começa a falar, certamente para perguntar sobre o relacionamento dele com Gabriela. Mas é esperta suficiente para notar que o fato não  importa a ele agora.

No minuto seguinte, sem o mínimo êxito na atração da atenção dela, Nathan pensa numa forma de resolver o problema, o que se pode deduzir pelo jeito que contrai as pálpebras, as narinas mais largas que o normal... Seu pescoço verga para o lado por um instante. Recorta discretamente um pequeno pedaço do lábio com o dente.

_ Por favor, peça que todos saiam, menos ela  _ Ele sopra de repente para a moça ao lado, que parece precisar de um tempo para interpretar a situação. 

Ela analisa a feição dele voltando ao estado plano de minutos atrás.

Em seguida, ela inclina o corpo para o lado. Cochicha no ouvido do rapaz à sua esquerda. Aos poucos, a mensagem vai se espelhando, levantando consigo uma densa poeira de estupefação.

_ Onde vocês estão indo? _ A moça de cabelos curtos pergunta, ainda risonha.

_ Bilhar _ O rapaz de bigode responde, o último a sair da SPA.

Ela parece surpresa e ao mesmo tempo assustada quando finalmente nota os olhos de Nathan pousados em si. Não há entrelinhas. Ele não pisca. Não há espaços para interpretação. O jeito que ele respira é como se estivesse lutando pela última molécula de oxigênio do universo.

Ela ri com a mão sobre a boca, de um jeito que diz: Eu? Jura?

Mas a mente de Nathan está bloqueada para o mundo exterior, como minutos atrás. Seu rosto é uma parede fosca.

Move-se para próximo dela, em absoluto silêncio.

_ A que devo a honra? _ Ela pergunta, quando as pernas dele ficam a centímetros de distância da sua.

Nathan não responde. Ajoelha-se na frente dela. Encara-a em silêncio. Estende o braço e leva um tufo do cabelo dela para trás da orelha.

_ Posso lhe perguntar uma coisa? _ Ele finalmente se manifesta.

Ela dá ombros. 

As parcas e agora também rosadas bochechas da moça desenham um riso constrangido, adorável, e ao mesmo tempo ligeiramente questionador. O silêncio junto com o repentino interesse do homem que  (há segundos), abrigava-se num universo paralelo, obriga-a a se encolher um pouco sobre o assento.

_ Quer ir com eles? _ Ele pergunta.

Ela pensa, desviando os olhos para as laterais da SPA, guardando mais uns fios de cabelo atrás da orelha.

_ Ir com eles? Tipo... deixar você aqui, sozinho?

Ele faz que sim.

_ Você pode sair, se quiser.

_ E se eu ficar? _ Ela pergunta, frisando a testa, escorrendo os olhos no discreto caminho de pelos no peito dele.

 Os braços dourados esculpidos cercam o corpo magro da moça. A respiração cavada e o brilho nos olhos dela indicam que está acatando a aproximação, possivelmente convencida pelo rigor com que ele penetra bem no fundo deles.

O pescoço dele tomba um pouco de lado. Suas sobrancelhas se aproximam por um breve instante, numa avaliação que mais parece um julgamento. Volta a deslizar os dedos nos cabelos dela.

Nathan respira calmamente, concentrado nos movimentos dos fios caindo dos dedos. Em seguida, encaixa as mãos nos joelhos dela, separando-os meticulosamente. Inclina-se um pouco, aproximando a boca do rosto dela.

_ Se ficar, talvez se arrependa de ter escolhido esse corte de cabelo _ Ele avisa, os lábios roçando as bochechas dela, derretendo suas pálpebras. _ Então eu insisto...  se quiser sair, faça isso agora.

Ela faz que não imediatamente. Não quer sair. É enfática. E quase em seguida, as garras sólidas do rapaz se fecham nas finas coxas dela, por baixo da água. Desliza a moça calmamente pelo assento, em direção aos seus quadris. Em seguida, suas mãos se abrem na nuca dela, subindo a ponto de encapsular a cabeça, os dedos penetrando a raiz dos cabelos.

_ Tempo esgotado _ Ele declara, pinçando com os lábios ó lóbulo da orelha dela.

Certo como Murphy (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora