15 | manipulação

3.9K 182 51
                                    

- Madalena?

Pelos seus olhos apenas passeia confusão, principalmente quando a sua atenção desce até à mala que tenho junto dos meus pés de um lado do corpo e o Leo seguro pela mão no lado oposto.

- Podemos entrar?

- Claro.

Abre um pouco mais a porta, ainda confusa, e dá-nos passagem. O Leo é o primeiro a entrar assim que se desfaz da minha mão, e a Núria passa a sua mão pelos seus cabelos avelãs de maneira carinhosa, e logo a seguir entro eu.

Com a mala bege presa entre os dedos, deixo-lhe um beijo no rosto ao mesmo tempo que pouso a minha mão na sua barriga grande e redonda.

- Como é que estás?

- Bem, um pou...

- Shiu - murmuro - Estou a falar com a minha sobrinha.

Eleva ambas as mãos em forma de rendição enquanto reprime um sorriso.

Levanto o meu rosto ao nível do seu e os nossos olhares envolvem-se numa espécie de nuvem sentimental, um tanto hormonal, estou segura.

Os meus pequenos braços envolvem-na um pouco a custo pelo a distância entre os nossos corpos criada pela sua barriga, e sem dizer uma única palavra, não tenho dúvidas que a Núria já está a criar as palavras certas para me dar os melhores conselhos possíveis.

- O meu irmão está em casa?

As gargalhas e os gritos do Leo vindos da cozinha servem-me de resposta e, sem perder mais tempo, aproximo-me deles deixando a mala pelo caminho junto do sofá na sala.

Dou a volta à bancada para conseguir deixar um beijo no rosto do Mateus e, mesmo que ele e a Núria disfarcem, percebo que trocam sinais pelo olhar.

Uma das vantagens de conhecer bem uma pessoa.

Nem sempre precisas de palavras para comunicar, às vezes apenas um olhar é o suficiente.

E eles sabem falar melhor com os olhos do que, seguramente, eu e o Francisco sabemos usar as palavras.

A mão do Mateus desliza pelo meu braço e instintivamente sinto necessidade de me encolher pela dor que o seu simples gesto deixou.

Ao que parece, ele não se apercebe da minha ação já que volta a fazer o que estava a fazer antes de eu entrar na cozinha, e isso deixa-me um pouco mais aliviada.

- Porque é que vocês não vão um pouco para o jardim? - a sua voz masculina ecoa pelas quatro paredes - Assim que a tarte estiver terminada, eu e o Leo vamos lá levar-vos uma fatia.

O braço da Núria apoiado nos meus ombros impedem-me de responder, conduzindo-me pela grande porta deslizante da cozinha até aos sofás cinzentos do exterior.

Por minutos permito-me sentir o sopro de ar delicado e fresco do vento, o alaranjado do céu e o sol que começa a esconder-se por entre as árvores a uns bons quilômetros de distância.

Respira-se serenidade.

É como se a natureza, especialmente na troca do dia pela noite, tivesse o poder de fazer desaparecer tudo de negativo que nos rodeia, e algo tão simples como acompanhar esse ciclo é o suficiente para eliminar grande parte do peso acumulado durante o dia nos ombros.

- O Francisco ligou-me esta manhã - flexiono os joelhos e abraço as minhas pernas - Disse-me que não tinhas dormido em casa e que já te tinha ligado e não tinhas atendido... e agora apareces aqui. Com uma mala.

- Não é o que parece.

- Eu sei que não, por isso é que estou à espera que me digas, primeiro: onde passaste a noite, sim porque essa história de teres adormecido no escritório não cola comigo, e segundo: o que está a acontecer.

𝑑𝑖𝑧-𝑚𝑒 𝑞𝑢𝑒 𝑚𝑒 𝑎𝑚𝑎𝑠Onde histórias criam vida. Descubra agora