Vida desordeira

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Querer viver bem é tão difícil assim? O problema é que eles sabiam de como o mundo era há milênios atrás, mas não possuíam mais que dezesseis anos. E esse era o preço da imortalidade.
Esse mundo começou a piorar quando as antigas histórias começaram a desaparecer. Pouco a pouco, as pessoas deixaram que seus corações se esquecessem de quem eram.
Mas não tinha problema nenhum dos seres humanos comuns se esquecessem, o que jamais poderia ter acontecido era deles esquecerem quem eram...
Seu nome era Maya e era uma dos quinze pilares que sobraram no mundo. Como a maioria, parou de crescer aos dezesseis anos de idade. Era forte, mas esse não era seu verdadeiro dom. Era a inocência. Um dom perigoso para quem o possui.
Na ocasião, Maya estava no campos do internato. Sentada na grama, lia um livro qualquer quando sentiu algo que há muito não sentia. Alguém a observava. Temia ter a razão de quem pensava ser.
Maya olhou ao redor. Nada. De repente, a sensação passou. A garota sabia que algo de errado estava acontecendo. Talvez os pilares da escuridão? Levantou e correu para dentro da república, em busca de um de seus amigos, mas assim que passou pelo primeiro quarto, uma sensação de morte a pegou.
A garota chegou mais perto da porta. Abriu-a devagar até que o cheiro de sangue penetrasse em seus narizes apurados. O medo foi substituído pela curiosidade. O que viu a fez sentir vontade de vomitar: o corpo de uma garota nua pendurado no teto com a cabeça para baixo. E o sangue... Escorrendo dos pés, iam até o chão. Um espinho com mais de cinquenta centímetros perfurava sua barriga. Porém, o mais assustador era a mensagem que, Maya tinha certeza, se destinava à ela e aos outros pilares da luz:
Não adianta a andorinha querer voar, o falcão sempre consegue pegá-la.
Maya sentiu algo em sua garganta e saiu correndo dali. Desistiu de procurá-los e foi para seu quarto. Lá, deitou na cama e se pôs a chorar.
- Por quê?- Maya murmurava.
Por mais que tentassem, ela e seus amigos eram perseguidos e encontrados. Depois, se fossem pegos, eram mortos. O choro atraiu Arón, um de seus amigos.

Arón é um pilar da luz e seu dom era a força, mas também, como todos os outros, tinha seu lado ''sensível''. Arón não era o líder deles (e nem pretendia um dia se tornar), mas isso não o impedia de agir bem com os outros.
Ao ver que Maya chorava, chegou perto de seu quarto e se escorou na porta.
- Algum problema?- Arón perguntou.
Maya se sentou e assentiu. O rapaz entrou.
- O que houve?
A garota o olhou. Quer que tenha acontecido, havia deixado ela em estado de choque. Arón a abraçou.
- Eu... Eu vi algo assustador- ela respondeu.
Maya lhe contou o que viu. Quando terminou, Arón estava pensativo. Não era a primeira vez que isso acontecia e, ele sabia, não seria a última. Se os pilares da escuridão estavam mesmo no internato, a melhor decisão seria sair dali o quanto antes, mas Abner, o líder, temia pelos humanos e, por isso, decidiria ficar ali.
O problema não era ter de lutar pelos humanos, mas serem em menor número. Há sete pilares da luz e oito da escuridão. Antigamente, era tudo mais equilibrado, porém, com as perseguições, os pilares foram morrendo.
- A única coisa que nos pode matar é a perda em um combate- ele comentou.
Maya assentiu.
- Devemos sair daqui?- Ela perguntou.
- Seria a solução- Arón respondeu.- Mas Abner não vai abrir mão tão fácil dos humanos.
Maya o olhou. Naquele instante, ambos sentiram uma presença de algo horrível. Arón fechou os olhos e tentou imaginar a planta da escola. Em sua mente, passava pelos corredores, pelo ginásio, pelas salas de aula... Mas não achou nada, sinal de que algo ruim estava prestes a acontecer.
- Encontrou algo?- Maya perguntou.
- Nada- ele respondeu.- Mas isso não significa que estamos livres. Eles sabem como se esconder muito bem.
De repente, ouviram um grito do corredor. Saíram do quarto e foram até onde o som vinha.
Ao descerem as escadas, deram de cara com os outros cinco. Abner os veio ver.
Se tratava de um adolescente de pele escura, olhar inteligente e músculos bem definidos.
- Também ouviram?- Sua voz era um pouco mais grossa que a dos outros.
- Sim- Arón respondeu.- Já sabem o que é?
- Ainda não.
No mesmo instante, uma menina com os olhos molhados seguia o corredor em direção às escadas. Abner a parou.
- O que aconteceu?- Ele perguntou.
A menina o olhou.
- Bia...- ela começou a responder.- Ela... Ela está... Morta!
E saiu correndo, chorando. Porém, assim que chegou no primeiro degrau, um espinho atingiu suas costas.
Eles olharam para trás. Uma mensagem tinha aparecido do nada:
Correr será em vão. Entregem-se e nos pouparão energia.
Maya tampou a boca com a mão e permitiu que algumas lágrimas caíssem. Astrid, uma outra pilar, encostou as mãos em seus cabelos negros.
Abner cerrou os punhos. Como líder, deveria tomar uma decisão, mas não podia simplesmente deixar os humanos nas mãos daqueles seres cruéis.
O sinal tocou.

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