Pausei o filme na Netflix. Ainda faltava uma hora e meia, e eu já estava perdendo a batalha para manter os olhos abertos.
"Desculpe, Oliver, eu não gosto muito de filmes de máfia."
Levantei-me, desalojando o gato do meu colo.
Oliver miou uma reclamação e usou as unhas para afofar a almofada mais próxima.
"A Estela me garantiu que "O Irlandês" era um bom filme..." Acariciei as costas do Oliver, "só se for bom pra dormir." Espreguicei-me e bocejei a caminho da cozinha.
Oliver me seguiu.
"Foi mal, amigão! Você já comeu". Peguei meu celular da bancada.
"Aconteceu!" Uma mensagem apareceu na tela quando eu toquei no botão "home".
Liguei para a Estela na mesma hora.
Ninguém atendeu.
Dois minutos depois, eu estava dirigindo para a casa dela. Nem cogitei em trocar o conjunto de moletom rosa pink com capuz e estampa de unicórnios. A adrenalina fez meu coração disparar e meu corpo todo tremer enquanto eu atravessava a cidade a toda velocidade. Meus dedos batucavam no volante a cada parada forçada, como se pudessem, de alguma forma, fazer os semáforos ficarem verdes mais rápido.
Senti um frio na espinha quando me deparei com as luzes vermelhas piscando em frente à casa da Estela. Minha visão ficou embaçada. Um som de alto metal rasgando anunciou que eu estacionei perto demais do meio-fio. Eu não me importei com os arranhões extras na calota, nem me dei ao trabalho de trancar o carro, apenas corri para as portas traseiras da ambulância, que permaneciam abertas.
Dois paramédicos estavam sentados dentro do veículo.
"O que aconteceu?" Aproximei-me deles ofegante.
"Acidente doméstico". O primeiro homem pulou da ambulância.
"Parece que alguém caiu da escada." O outro rapaz seguiu o colega, abrindo espaço para a maca, que vinha trazida por outras três pessoas, emergindo da casa de Estela. O grupo avançou apressado.
Mesmo à distância, reconheci o cara robusto entre os socorristas.
"Derico!" Encarei o seu rosto por meio segundo.
Ele arregalou os olhos. "Diana!" A culpa estava estampada em seu rosto.
Atrás dele, avistei uma mulher pálida deitada na maca. "Estela! Me deixem passar; ela é minha irmã!" Eu gritei, espremendo-me por uma brecha enquanto agarrava uma das alças da maca.
Estela abriu os olhos ao ouvir minha voz. Sua boca se mexeu, mas nenhum som saiu. Havia uma imensidão de tristezas entaladas ali. Duas marcas vermelhas contornavam seus pulsos finos e alguns tons de roxo e azul adornavam seu rosto e braços.
Virei-me e encarei meu cunhado. "Você a empurrou, não foi?" Meus olhos ardiam de raiva e fúria.
Derico não respondeu. Seus punhos estavam cerrados.
Aproximei-me dele e levantei a voz em algumas oitavas. "Você a empurrou, Derico?" Meu dedo indicador afundou em seu peito, pressionando contra seus músculos peitorais.
Em um movimento rápido, como se repentinamente um espírito maligno o possuísse, Derico me agarrou pelos ombros e me sacudiu com força.
"Nãaaaao! Você não entende! É tudo culpa dela! A Estela me obrigou a fazer isso! Sempre se exibindo, provocando outros homens, sempre usando essas roupas provocantes... muito curtas... muito apertadas... tão sexy... tão sedutora! Ela me forçou ao limite!" Ele soltou-me e segurou a cabeça entre mãos.
"Certo, e por isso você a empurrou escada abaixo?" Eu despejei de uma vez.
Ele me deu um tapa na cara com tanta força que eu caí no chão.
"Senhor, por favor, tente se controlar!" Ouvi alguém dizer enquanto os socorristas continham aquela versão enfurecida de Derico que eu tanto desprezava.
"Você está bem, senhora?" Senti uma mão em meu ombro e olhei para a mulher de uniforme azul marinho cortado por uma faixa prateada brilhante.
Ela ofereceu-me uma mão e um sorriso.
"Estou sim. Obrigada." Segurei a mão estendida e tentei retomar o equilíbrio. "Minha irmã..." Apontei para a maca agora acomodada dentro da ambulância. Ela ajudou-me a subir as escadas e entrar no veículo.
Enquanto isso, Derico se livrava dos socorristas e tentou me seguir para dentro da ambulância.
A mulher que me ajudou deu um passo à frente, colocando-se entre Derico e as portas do veículo. "Apenas membros da família podem acompanhá-la, senhor", ela mostrou-lhe a palma da mão esquerda.
"Eu sou o ma..." Derico tentou argumentar.
"Não me importa quem você seja!" Ela o cortou. "Eu vi o que fez. É o bastante! Fechem as portas!" Ela levantou a voz, e um barulho metálico abafou o som externo.
"Eita mulher porreta essa nossa motorista!" O mais alto dos socorristas ergueu o punho acima da cabeça em comemoração. "Ela é rápida e furiosa!" Ele piscou para mim
Eu retribuí com um sorriso amarelo enquanto tentava me acomodar no espaço apertado.
Estela fez um sinal para que eu me aproximasse. "Você estava certa..." ela disse com uma voz rouca, "ele... está... fora... de si..." lágrimas corriam pelo seu rosto.
Peguei sua mão, cuidadosamente aninhando-a na minha.
"Sempre... desconfiado... de mim... em relação... a homens... qualquer homem... ele... não... me ouviu..." Estela fez um esforço para respirar. "Ele gritou... me bateu... eu fiquei tão... tão assustada!" Ela soluçou. "Aconteceu... exatamente como você previu... primeiro... palavras indelicadas... injustas... Depois que... eu escrevi... para você, ele... jogou meu celular... escada abaixo... então... então, ele me empurrou!" Ela olhou para si mesma. "Ele poderia... ter... me matado!"
Eu Suspirei. "Eu não queria nada disso para você, Estelinha, mas depois do que testemunhei no meu aniversário no ano passado, eu fiquei com muito medo. Por você." Balancei a cabeça. "Só porque o garçom lhe ofereceu uma bebida, o Derico quebrou duas costelas do homem! Ele precisa de ajuda profissional!"
"Por favor, me perdoe... por não... levar você a sério... antes. Eu achei que... que fosse exagero... excesso de zelo... sei lá." Seu rosto foi lavado com um novo fluxo de lágrimas. "Ele está cego... de ciúmes. Eu... não o reconheço... mais."
"Shhhh..." Enxuguei seu rosto com a ponta dos dedos. "Você está segura agora. Derico não vai chegar nem perto de você. Eu prometo. Ter uma irmã advogada tem algumas vantagens." Dei-lhe um sorriso de conforto.
Estela tentou sorrir de volta, mas fez um beicinho em vez disso. "Tudo começou porque... eu disse que... que o Oliver... era fofo!"
"O quê?" Meus olhos se arregalaram. "Oliver?" Eu fiz uma careta. "Meu gato?"
"Sim!"
E nós duas rimos em meio às lágrimas.
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Amor Áspero
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