Zilá abriu os olhos. Estevão estava a seu lado, dormindo numa poltrona. Ela tocou a barriga, agora vazia como um molde descartado. O movimento causou uma dor no pulso esquerdo, onde a agulha do soro estava fixada com esparadrapo. A mulher gemeu.
"Zilá?" Estevão levantou-se em um movimento rápido.
"Como estão as meninas?" A voz saiu rouca por ter sido silenciada por muito tempo.
"A Chloé está bem." Ele pegou a mão da esposa e acariciou-a gentilmente com o polegar.
"E a Célia?" O coração apertou em seu peito.
Estevão olhou para baixo e balançou a cabeça lentamente. Lágrimas não derramadas nublaram seu espírito.
Zilá sentiu o manto frio da dor envolvê-la. A partir daquele breve instante, o mundo perdeu toda a cor. Ela sentiu os olhos arderem e um rio de agonia escorreu por seu rosto.
Estevão manteve-se em silêncio, os lábios apertados, aprisionando a mágoa, engolindo-a, enterrando-a no fundo do coração. "Homens não choram."
As mãos permaneceram entrelaçadas, o polegar dele sobre o dela, acariciando levemente a pele da mulher.
O quarto escurecia lentamente à medida que os minutos se transformavam em horas. Ambos pareciam ter mais do que os trinta e poucos anos registrados nas carteiras de identidade. Eram tão jovens poucos dias antes, quando foram admitidos no hospital e a esperança ainda vivia em seus corações.
"Ela é linda."
Zilá o encarou com seus olhos inchados.
"Chloé." Ele se atreveu a encará-la de volta. "Você quer vê-la?"
Zilá assentiu. Sua garganta estava apertada demais para falar.
Estevão ajudou-a a sentar na cama e calçar um par de chinelos antes que os pés dela tocassem o chão. Zilá equilibrou-se, apoiando-se no suporte de soro que o marido trouxe para mais perto. Saíram para o corredor, de mãos dadas como costumavam fazer, bem lentamente, passo após passo, até pararem em frente à janela do berçário.
"Lá está ela!" Ele apontou para o meio da segunda fileira, onde havia um bebê enrolado em um cobertor rosa, a cabecinha coberta por um gorro minúsculo com a palavra "Chloé" bordada em branco.
Zilá olhou para onde ele apontava e sorriu entre lágrimas. "Ela é linda mesmo." Zilá inclinou levemente a cabeça para a direita e apoiou-a no ombro do marido. Então ela notou um bercinho vazio ao lado da filha. "Onde está a Célia?", ela murmurou. "Também quero vê-la".
Estevão balançou a cabeça devagar, olhando para o bebê sobrevivente. "Eles a levaram. O médico disse que era melhor você não a ver daquele jeito."
Zilá sentiu uma nova onda de tristeza apoderar-se dela e perdeu o equilíbrio, tomada por soluços incontroláveis.
Estevão aninhou-a em seus braços, reprimindo toda a dor. "Homens não choram".
⁂
O teatro estava repleto de pais e parentes orgulhosos. Zilá esticou o pescoço para olhar por cima da cabeça de um homem sentado à sua frente.
Um por um, os alunos ocupavam seus lugares no palco.
"Lá está ela." Estevão apontou para o meio da segunda fileira.
Chloé ajeitava a beca daqui, arrumava o chapéu de formatura dali.
Estevão levantou-se e acenou lentamente, repetidas vezes, destacando-se na multidão. O movimento somado à sua constituição física de homem alto e braços longos lembravam um antigo moinho.
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Amor Áspero
القصة القصيرة1. Queda livre Às vezes uma simples escolha pode ter nos levar longe demais... 2. Carolaine Ela tinha uma alma de menina, mas só quem tinha olhos sensíveis podia ver... 3. O Homem Perfeito A busca pelo homem ideal pode levar uma vida inteira... 4. I...